Os moderníssimos telescópios instalados no deserto de Atacama (Chile) continuam surpreendendo os cientistas. Uma das mais recentes proezas surgiu de imagens obtidas pelo instrumento de infravermelho Hawk-I, instalado no Very Large Telescope, do Observatório Europeu do Sul (ESO, na sigla em inglês): uma foto como nunca se vira da nebulosa de Órion, a cerca de 1.500 anos-luz do Sistema Solar. Nebulosas são nuvens de poeira e gás onde ser formam estrelas e planetas, e a de Órion, uma das mais próximas da Terra, é também uma das mais estudadas. A foto do Hawk-I mostra de forma inédita as entranhas da nebulosa – uma profusão de estrelas e objetos de massa planetária muito maior do que o que se imaginava.

Chamou atenção especial o número de aparentes planetas com dimensões semelhantes às da Terra. O tema é sensível, porque entre os cerca de 3.400 exoplanetas conhecidos nenhum merece o título de “gêmeo” da Terra. Mas já se sabe que nenhum dos novos planetas é habitável: eles flutuam livremente no espaço, sem orbitar uma estrela. Esses planetas podem ter sido expelidos de seus sistemas solares pelas intensas forças gravitacionais atuantes em Órion ou ter sido formados isoladamente, enquanto a nebulosa colapsava e produzia estrelas. A imagem mostrou ainda um número expressivo de objetos maiores do que planetas, mas menores do que estrelas, também flutuando livremente no espaço. Essas estrelas fracassadas (que não conseguiram iniciar a fusão de hidrogênio no seu núcleo) são chamadas de anãs marrons pelos astrônomos.

O fato de (ainda) não haver nenhum gêmeo da Terra na região coberta pela foto não reduz a importância do seu conteúdo. “Compreender como muitos objetos de pequena massa são encontrados na nebulosa de Órion é muito importante para restringir as teorias atuais de formação de estrelas”, diz Amelia Bayo, da Universidade de Valparaíso (Chile), integrante da equipe de pesquisa e coautora do estudo sobre a imagem, divulgado em julho. “Agora percebemos que a maneira como esses objetos de massa muito baixa se formam depende do seu ambiente.” O astrônomo Holger Drass, do Instituto de Astronomia da Universidade de Bochum (Alemanha), cientista-chefe da equipe, reforça o peso da descoberta. “Nosso resultado parece-me um vislumbre de uma nova era da ciência da formação de estrelas e planetas”, avalia.