Dezesseis delas já foram tombadas pela Unesco como joias do patrimônio cultural da humanidade.

Durante os quatro séculos anteriores à abertura do Canal do Panamá (1914), o Arquipélago de Chiloé, no sul do Chile, foi escala obrigatória das rotas marítimas de mercadorias globais. Todos os navios que iam da Europa à Ásia pela América do Sul singravam pelo Estreito de Magalhães e pelas ilhas do litoral meridional chileno, a fim de evitar os mares bravios ao sul do Cabo Horn, e só voltavam ao mar aberto após cruzar o Canal de Chacao, entre Chiloé e o continente. A navegação pelos estreitos oferecia quase 2 mil quilômetros de mares protegidos.

Para cobrar pedágio desse intenso tráfego marítimo, em 1767 a Espanha construiu o Forte de San Carlos, em Ancud, no norte da Ilha Grande de Chiloé. A forte guarnição militar e a próspera população espanhola de Chiloé resistiram à independência do Chile durante dez anos, até os realistas espanhóis serem vencidos, em 1826. Uma rebelião fracassada chegou a tentar criar um país independente na ilha. Desse aguerrido arquipélago partiram as expedições que colonizaram a Patagônia e a Terra do Fogo e muitas missões que catequizaram os povos indígenas da região.

Maior centro irradiador de cultura do sul da América do Sul, Chiloé adaptou-se ao frio, à distância da metrópole espanhola e do Vice-Reinado do Peru, ao clima e às madeiras disponíveis, como o cipreste e o alerce (o pinheiro-larício dos europeus). No século 18 os jesuítas estabeleceram o sistema da “missão circular” para atender às 80 comunidades insuladas, percorrendo 4 mil quilômetros de barco, a pé ou de burro, durante 8 meses (evitando o inverno). A estada durava um par de dias e, no resto do ano, a vida religiosa era conduzida por um “fiscal”.

Nos anos iniciais da evangelização, as primeiras igrejas eram cabanas rústicas com teto de palha e amarras feitas com raízes, construídas com ajuda de mão de obra indígena. Aos poucos, e em especial após a vinda de padres franciscanos para o arquipélago, a arquitetura foi sendo aprimorada, adotando os elementos tradicionais europeus, como torres, arcos, cornijas, frisos e colunas, ao mesmo tempo que incorporava a decoração barroca e neo­clássica – tudo de madeira.

As capelas eram o marco fundador das comunidades e o centro da vida social. Em torno delas se desenvolveram os povoados e as comunidades pesqueiras e agrícolas. As igrejas ocupavam o lugar central, o mais visível pela comunidade, em geral com uma esplanada à frente, onde se realizavam cerimônias, reuniões e procissões. Com o tempo, foram incorporados cemitérios europeus, evitando os enterros à moda indígena.

Das 400 igrejas existentes hoje em Chiloé, cerca de 100 são edifícios de madeira. As comunidades fizeram sucessivas reformas para mantê-las em pé, e hoje elas constituem algumas das construções de madeira em atividade mais antigas do mundo. O esforço de preservação também induziu à criação da ativa Fundación Cultural Amigos de las Iglesias de Chiloé e ao tombamento das 18 capelas mais antigas como Patrimônio da Humanidade, pela Unesco, em 2000 e 2002. Atual­mente, o governo chileno sustenta um programa amplo de recuperação e defesa dos templos históricos que, surpreendentemente, continuam a resistir ao tempo, à maresia e aos cupins.