Escritórios moderninhos do datacenter da Pionen, dentro de uma antiga fortaleza nuclear enterrada numa montanha da Suécia

Já parou para pensar onde está armazenado o zilhão de informações que você vê na internet? As fotos dos seus amigos nas redes sociais? Os vídeos do YouTube? Tudo isso pode estar guardado a milhares de quilômetros de distância, fechado a sete chaves dentro de um bunker gelado de alta segurança na Suíça. Dentro dele, torres de servidores trabalham sem parar, queimando a energia equivalente ao consumo elétrico de pequenas cidades. Eles são a parte física da “nuvem” (a tão falada “cloud”), onde tudo fica guardado. Sem esse hardware, não haveria comércio eletrônico, redes sociais e e-mail, pelo menos não como os conhecemos.

Nem todos os datacenters estão em locais escondidos. Em muitas cidades, há servidores instalados em prédios tradicionais. Mas o que une todas as instalações é a necessidade de segurança e a infraestrutura de energia que o seu funcionamento demanda. Gigantes da internet como Google, Facebook, Twitter ou Amazon precisam garantir serviços 24 horas por dia, durante todos os dias do ano. Qualquer pane pode acarretar um prejuízo enorme. Outras empresas menores usam o serviço de datacenters especializados que vendem espaço nos seus servidores para hospedar a informação desejada.

A antiga fortaleza nuclear de White Mountain, em Estocolmo (Suécia), hospeda o datacenter de Pionen, que teve como cliente um dos sites mais polêmicos do mundo: o Wikileaks. A Bahnhof, empresa responsável pelo centro, adaptou o bunker inspirando-se nos cenários de filmes de James Bond. O resultado é impressionante. Logo na entrada, dois motores de submarino garantem a energia em caso de pane elétrica. As paredes de rocha bruta fornecem uma sensação claustrofóbica só amenizada pelas plantas naturais que enfeitam as salas da empresa.

Acima, o portão de entrada do bunker da Pionen e os motores de submarino usados como geradores

 

Adeus, WikiLeaks

“O bunker foi construído durante a Guerra Fria, para servir de abrigo nuclear. Passamos dois anos adaptando o edifício para o datacenter, que está protegido por grossas paredes de granito e tem portas de aço de 50 centímetros de espessura”, explica Jon Karlung, presidente da Bahnhof. Mas a proteção física é apenas parte da segurança. “Temos uma rede protegida e rígidas rotinas de segurança”, garante.

Sobre os arquivos WikiLeaks que deixaram a Pionen há alguns meses, Jon é sincero: “Foi uma decisão estratégica. Fazemos o possível para proteger os nossos clientes de decisões políticas que visem aos nossos datacenters. Além disso, a Suécia tem uma longa tradição de liberdade”, explica o responsável. Hoje, a rede de Julian Assange opera com vários servidores espalhados pelo mundo. “Desejo muito sucesso ao WikiLeaks. Acho que fizeram um bom trabalho para a democracia”, afirma Jon Karlung.

O cenário do datacenter sueco é mais um de uma realidade cada vez mais frequente: a necessidade de proteger dados e objetos importantes de uma ameaça digital ou física. Os clientes são tratados com todo o sigilo, já que no mundo dos datacenters, assim como nos bancos suíços, o silêncio é a alma do negócio.

É na Suíça, entre as montanhas dos Alpes, debaixo de camadas geladas de rocha e neve, que funciona o datacenter Mount 10, que se proclama imune a terremotos e desastres naturais. “A segurança física das nossas instalações, assim como a estabilidade política de um país como a Suíça, torna nossa oferta muito interessante, principalmente para empresas estrangeiras”, explica o presidente da Mount 10, Christoph Oschwald.

A fortaleza dos Alpes é formada por duas estruturas, separadas por dez quilômetros de distância, totalmente protegidas contra pulsos eletromagnéticos que poderiam danificar o datacenter (como detonações nucleares), e conta com um sistema de resfriamento naturalmente frio e alimentado por um lago subterrâneo. O acesso às instalações pode ser feito por avião particular, já que o datacenter conta com uma pista de pouso exclusiva para os seus clientes.

“Fazemos o possível para proteger os nossos clientes” – Jon Karlung, presidente da Pionen

O aquecimento dos processadores e o consumo de eletricidade são os principais desafios dos datacenters. De acordo com o Greenpeace, atualmente os centros de informática são responsáveis por 1,5% do consumo de eletricidade mundial. E a tendência para os próximos anos é de crescimento de consumo, uma vez que os chips atuais já atingiram o limite de miniaturização e o consumo de energia continua igual. Dessa forma, para ter mais capacidade de processamento, precisaremos de mais servidores.

Acima, os túneis subterrâneos da Mount 10, nos Alpes suíços, sob camadas de rocha, neve e muita segurança.

Subterrâneo ecológico

Para resolver o problema de refrigeração, alguns datacenters maiores resolveram adotar um conceito “ecológico”, instalando os servidores em ambiente polar ou em cavernas subterrâneas, utilizando água ou ar frio para arrefecer a sala de computadores.

O Green Datacenter, da empresa americana Verne Global, tira partido das baixas temperaturas da Islândia para resfriar os seus servidores. Além do mais, é um dos primeiros datacenters a empregar duas fontes de energia renováveis (geotérmica e hidrelétrica) para sua operação, além de usar materiais feitos de aço reciclado. No final da sua vida útil, 90% das instalações poderão ser recicladas. Assim como o seu congênere sueco, o Green Datacenter foi instalado em um antigo bunker da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), o que facilitou a sua adaptação. “A escolha da base foi ideal, não apenas por razões de segurança, mas também porque a estrutura de eletricidade e de fibras óticas do antigo bunker militar foi aproveitada”, explica Lisa Rhodes, vice-presidente de marketing da Verne Global.

Alguns datacenters surpreende pela excentricidade. No Mar do Norte, a 10 quilômetros da costa inglesa, existe uma estrutura estranha: dois pilares de concreto unidos por uma base. A plataforma, chamada Sealand, foi construída pelo Reino Unido em 1943, para defender o país das tropas alemãs durante a Segunda Guerra Mundial. Depois de 1967, quando foi abandonada pelo governo inglês, foi ocupada pelo britânico Roy Bates, que chegou a instalar uma emissora de rádio pirata na plataforma.

Acima, servidores do Barcelona Supercomputing Center, instalado em uma antiga igreja. Ao lado, a Caverna Global das Sementes, no gelado arquipélago de Svalbard, perto do Polo Norte

Em 2007, o site Pirate Bay realizou uma coleta de fundos para comprar a antiga base e instalar o seu datacenter, proposta recusada pela família Bates. Hoje em dia, o filho de Roy, Michael Bates – autointitulado “Príncipe de Sealand” – deixa futuras parcerias em aberto. “Só podemos dizer que ainda temos um datacenter”, esclarece à PLANETA.

“Atraímos cientistas de vanguarda do mundo todo” – Mateo Valero, diretor do BSC

Mateo Valero: pesquisas de ponta em informática e biologia

Se as barreiras físicas não chegam para proteger os dados, alguns apelam para os deuses. Em Helsinque, na Finlândia, uma catedral ortodoxa do século 19 abriga no seu subsolo um datacenter onde a água usada para resfriar os servidores é re-enviada através de canalizações para aquecer 500 residências nas redondezas. Em seguida, ela retorna à central de servidores para esfriar os computadores novamente. O país, que sofre com o alto custo da energia, aposta nos datacenters ecológicos para diminuir a conta de eletricidade. Um segundo edifício, pertencente ao Google, adaptou uma antiga fábrica de papel na cidade finlandesa de Hamina para abrigar suas instalações e usa água do Mar Báltico para resfriar os servidores.

Outra igreja, em Barcelona, hospeda o supercomputador MareNostrum, do Barcelona Supercomputing Center (BSC). As sóbrias instalações da capela Torre Girona contrastam com a modernidade dos equipamentos do BSC. “Trabalhamos com empresas como IBM, Microsoft, Intel, Sun e Airbus, e fazemos pesquisas próprias em informática e biologia. Atraímos cientistas de vanguarda do mundo todo”, diz o diretor Mateo Valero. A capela, que pertenceu a uma tradicional família de banqueiros de Barcelona, já foi ocupada por freiras, que depois cederam o ponto a uma universidade local. Não houve conflitos com a Igreja para a instalação do supercomputador porque o edifício foi desconsagrado em meados dos anos 1980.

Datacenters e bunkers andam quase sempre juntos, mas nem sempre os antigos abrigos nucleares são usados para armazenar dados. No arquipélago de Svalbard, pertencente à Noruega, a Global Crop Diversity Trust construiu um cofre-forte de sementes globais para, em caso de desaparecimento de alguma espécie, poder recuperá-la por meio de clonagem de uma “cópia de segurança”. Mais de 500 mil espécies de sementes já foram armazenadas na Global Seed Vault (Caverna Global das Sementes), enterrada numa montanha gelada a mil quilômetros do Polo Norte, escolhida pelas condições de temperatura e pela estabilidade geológica e política. Se algum dia houver uma catástrofe mundial, o bunker poderá ser a “arca de Noé” das espécies vegetais.

ANATOMIA DE UM BUNKER

A estrutura do datacenter da Mountain 10, dentro de uma montanha dos Alpes suíços, oferece proteção integral, autonomia operacional e acesso fácil para clientes globais.

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Um dos bunkers mais fascinantes, pela localização e pelo material que hospeda, é a Iron Mountain, localizada na Pensilvânia, no nordeste dos Estados Unidos. O nome talvez não diga nada à primeira vista, mas a instalação guarda, além de dados, o arquivo fotográfico da Corbis, a proprietária dos negativos da agência United Press International, responsável por algumas das fotos mais importantes do século 20. O datacenter, que se encontra no interior de uma antiga mina de calcário, desativada desde 1952, tem três mil funcionários e conta com seu próprio sistema de bombeiros, restaurante e tratamento de água.

Entrada do Norad, na montanha Cheyenne, no Colorado, EUA

Outro bunker notório é a sede do Norad, o Comando de Defesa Aeroespacial Norte- Americano, cérebro do sistema de detecção e dissuasão de ameaças nucleares, estabelecido pelos Estados Unidos e Canadá em 1961. Localizado dentro da Cheyenne Mountain, no Colorado, o centro tem portas de aço de 25 toneladas, foi construído para resistir ao impacto de mísseis e bombardeios atômicos e armazena milhões de dados militares e informações estratégicas secretas. Felizmente, as ameaças de extermínio da Guerra Fria estão ficando para trás, no passado.

Hoje, numa época em que informação é poder, os bunkers – digitais ou não – têm uma só função: manter a memória humana viva e apaziguar o medo de perda permanente de dados. Os datacenters têm um longo caminho a percorrer em matéria de sustentabilidade ecológica, mas por meio da circulação rápida e da proteção severa da informação garantem uma segurança a mais para a humanidade.