Quando o terror ataca, a mídia é fundamental para garantir que as pessoas afetadas tenham acesso a informações equilibradas. Mas a cobertura do terrorismo pode às vezes ser desproporcional e sensacionalista, persuadindo populações inteiras de que estão em perigo iminente quando o nível de risco pode ser relativamente baixo. Em linha com a publicação da Unesco “Terrorismo e Meios de Comunicação: Um Manual para Jornalistas”, exploramos a seguir alguns dos mitos mais comuns sobre esse tema.

MITO: Países “ocidentais” são os mais afetados pelo terrorismo
Ao discutir o terrorismo, é importante manter uma perspectiva global. A cobertura da imprensa tende a favorecer tragédias que ocorrem em locais geográfica ou culturalmente próximos; portanto, ataques na Europa ou na América do Norte tendem a estar super-representados nos meios de comunicação internacionais, europeus e norte-americanos. Na verdade, os ataques terroristas ocorrem sobretudo em regiões do Oriente Médio, Norte da África, Sul da Ásia e África Subsaariana: juntos, eles representaram, em 2015, 84% dos ataques e 95% das mortes.

MITO: A Europa Ocidental nunca foi mais afetada pelo terrorismo do que atualmente
Na verdade, o período entre 1970 e o início dos anos 1990 registrou um número maior de mortes e ataques muito mais frequentes na Europa Ocidental, em especial de grupos separatistas ou revolucionários. Hoje, porém, os avanços na mídia – tecnologia móvel, mídias sociais e canais de notícias 24 horas por dia, 7 dias por semana – significam que as pessoas enfrentam continuamente coberturas profusas, o que aumenta o sentimento de insegurança. Esses eventos parecem então mais comuns do que de fato são.

MITO: O medo do terrorismo é racional – o terrorismo provavelmente o matará
O medo pode ser uma resposta poderosa e involuntária ao terrorismo, mas é preciso entender o nível objetivo de risco envolvido. Embora o terrorismo seja único em sua capacidade de chocar e assustar, o risco real para um cidadão é relativamente pequeno, especialmente em comparação com vários outros fatores. A taxa de mortalidade global por terrorismo em 2015 foi de 0,39 por 100 mil. Os acidentes rodoviários, em comparação, foram responsáveis por 18,2 mortes por 100 mil pes­soas, segundo a Organização Mundial da Saúde.

MITO: Refugiados e migrantes recentes trazem terrorismo
A maioria dos ataques terroristas nos últimos anos tem a autoria de pessoas nascidas nos países onde esses casos ocorreram. Antonio Guterres, ex-alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados, disse: “Não são os fluxos de refugiados que causam o terrorismo; o terrorismo, a tirania e a guerra criam refugiados”. Um relatório de 2016 do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos informa que “há pouca evidência (…) de que os terroristas aproveitam os fluxos de refugiados para realizar atos de terrorismo. Tais percepções são analítica e estatisticamente infundadas e devem mudar”. Temer e demonizar os refugiados, culpando-os por atos terroristas, pode piorar sua situação já altamente vulnerável.

MITO: Pessoas em muitas cidades “ocidentais” vivem em zonas de guerra permanentes
A escolha das palavras ao debater um tópico tão tenso pode ser muito importante, e “guerra” é um exemplo disso. É crucial manter um sentido da perspectiva a respeito de com o que a guerra se parece. Para Dominique Faget, da Agência France-Presse (AFP), que cobriu vários conflitos pelo mundo, “a guerra é viver­ o medo diário da morte, viver com os dias con­tados, não ter segurança em lugar algum, em hora alguma. É ver as pessoas caindo ao seu redor todos os dias, por causa de balas ou bombas que chovem sobre cidades inteiras”.

“Terrorismo” também é uma palavra a considerar: quando um ataque deveria ser descrito como terrorismo e quando não deveria? É crucial compreender o que está por trás da cobertura de questões como o terrorismo – as motivações da mídia, os objetivos dos grupos terroristas. O grande risco é que o medo e a suspeita conduzam a uma nova onda de nacionalismo e populismo, e que as liberdades pelas quais todos nós temos trabalhado tão duramente para alcançar sejam sacrificadas. É por isso que a cobertura da mídia deve evitar fomentar a divisão, o ódio e a radicalização nos diferentes espectros da sociedade, fornecendo informações e fatos verificáveis.