O 1% mais rico da população mundial agora possui tanto quanto o resto do mundo, reforçando a afirmação da Oxfam (confederação de 17 or­ganizações e mais de 3 mil parceiros que atua em mais de 100 países na busca de soluções para a pobreza e a injustiça) de que a extrema desigualdade econômica está saindo de controle. Esse fenômeno é injusto e desprovido de moral, e suas consequências são corrosivas para todos.

A extrema desigualdade corrompe a política, impede o crescimento econômico e abafa a mobilidade social. Ela alimenta o crime e os conflitos violentos. Toca um nervo moral ao ameaçar a própria saúde de nossas democracias quando o poder político e econômico é capturado pelas elites. O rápido aumento da extrema desigualdade econômica está no caminho da eliminação da pobreza global.

Se a Índia reduzisse a desigualdade em 36%, poderia praticamente eliminar a pobreza extrema até 2019 (Oxfam, 2014). Nossa pesquisa indicou que a desigualdade é o elo perdido que explica como a mesma taxa de crescimento em diferentes países pode levar a diferentes taxas de redução da pobreza. De acordo com o Overseas Development Institute, 200 milhões do 1,1 bilhão de pessoas que viviam na extrema pobreza em 2010 poderiam ter escapado dessa situação se os pobres tivessem se beneficiado igualmente do produto do crescimento durante o período dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), entre 2000 e 2015 (Hoy e Samman, 2015).

As projeções dos economistas do Banco Mundial revelaram que, para eliminar a pobreza extrema até 2030, os mais pobres deverão se beneficiar de um crescimento superior em 2 pontos percentuais ao resto da população (Lakner e outros, 2014). Uma participação igual no crescimento não é suficiente e deixaria quase 200 milhões de pessoas adicionais presas na pobreza extrema (Oxfam, 2015).

Um alto nível de desigualdade constitui uma barreira para o crescimento econômico futuro porque obstrui o investimento produtivo, limita a capacidade produtiva e consumidora da economia e mina as instituições necessárias para uma sociedade justa. Pesquisadores do Fundo Monetário Internacional (FMI) descobriram que um aumento na participação dos pobres e da classe média aumenta de fato o crescimento, enquanto fazer o mesmo para os 20% mais ricos resulta em menor crescimento (Dabla-Norris e outros, 2015).

Os extremos da desigualdade são, nas palavras do economista Ha-Joon Chang, da Universidade de Cambridge, “uma fonte de desperdício humano e econômico desnecessário” (citado em Oxfam, 2014, p. iii). A extrema desigualdade é uma preocupação imediata para todos nós e deve ser resolvida sem demora. Os organismos internacionais e os governos devem prestar mais atenção à distância entre os mais ricos e os mais pobres e monitorar a riqueza e as transferências de renda no topo e no fundo dos extremos da desigualdade. O acesso a dados de boa qualidade é imperativo para produzir uma investigação mais aprofundada sobre os fatores de extrema riqueza e desigualdade de rendimento, além de seu impacto na pobreza.

A desigualdade não é inevitável. Os governos podem reduzir os extremos econômicos adotando um pacote de medidas redistributivas, implantando sistemas fiscais mais progressivos que redistribuem equitativamente os rendimentos e aumentando o investimento em programas públicos de serviços públicos e de proteção social universais, de boa qualidade e gratuitos. Aumentar o número de empregos decentes que paguem salários decentes também é essencial. Os empregos de boa qualidade são inerentemente aqueles que pagam um salário digno, proporcionam segurança no cargo e respeito aos direitos dos trabalhadores, e asseguram a igualdade de remuneração para as mulheres.

Há, no entanto, uma dinâmica de poder para resolver, e a sociedade civil deve responsabilizar os tomadores de decisão. Os governos e as instituições públicas devem perceber que são, em primeiro lugar, servos dos seus cidadãos, e não de grupos de interesses. Os governos são obrigados a proteger os direitos humanos, o que envolve prevenir interesses comerciais de emascular esses direitos. Somente então poderemos enfrentar com êxito o flagelo da extrema desigualdade econômica.

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* Este artigo foi escrito por Winnie Byanyima, diretora executiva da Oxfam, no âmbito do Relatório Mundial de Ciências Sociais 2016, produzido pelo Conselho Internacional de Ciências Sociais (ISSC, na sigla em inglês) e coeditado com a Unesco