Não dá para negar uma ponta de satisfação ao ver cinco empresas brasileiras entre a elite das 100 companhias que se destacam pela sustentabilidade nos negócios no ranking Global 100. Na última edição de 2013, a Natura, fabricante de cosméticos em São Paulo, conquistou o segundo lugar, logo atrás da metalúrgica belga Umicore, a campeã mundial. Entre as 100 empresas mais “verdes” ainda figuram as brasileiras: Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), em 43o lugar; a mineradora Vale, em 49o; o Grupo Pão de Açúcar, em 74o, e o Banco do Brasil, fechando a lista, em 100o lugar.

Criado em 2005 pela consultoria canadense Corporate Knights, o ranking Global 100 é apresentado anualmente no Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça. Em 2010, três empresas nacionais conquistaram posições na lista pela primeira vez: o Bradesco pegou a 94a colocação, a Petrobras a 96a e a Natura a 99a. As três companhias repetiram a performance nos anos seguintes, mas a Natura deu um show: subiu de 66o, em 2011, para o segundo lugar, em 2012 e novamente conquistou o segundo lugar em 2013.

O executivo-chefe da Corporate Knights, Toby Heaps, credita o bom desempenho brasileiro a dois fatores: à expansão da lista inicial de 2 mil para 4 mil empresas, e à melhoria nas informações publicadas pelas empresas sobre a performance financeira e as ações socioambientais. “O Brasil é um dos BRICS dinâmicos, um país economicamente emergente que vem despontando como líder na área de sustentabilidade, provavelmente pelo seu desenvolvimento econômico estar muito atrelado à bioeconomia e aos recursos naturais”, comenta Heaps.

O ranking Global 100 elenca grandes empresas que faturam mais de US$ 2 bilhões por ano. Os quesitos analisados inicialmente são quatro: uso de energia, emissões de gás carbônico, inovação e segurança. Depois, as finalistas são reclassificadas por 12 indicadores: produção de energia, emissão de carbono, emissão de resíduos, uso da água, capacidade de inovação (pesquisa e desenvolvimento), rotatividade de funcionários, remuneração dos executivos e média das remunerações gerais, planos de pensão, impostos pagos, performance em segurança, promoção da diversidade de gênero na liderança e metas de sustentabilidade associadas aos bônus dos executivos. Sem dúvida, trata-se de uma grade exigente.

 

Boas intenções

Com bom desempenho nos quatro quesitos da primeira etapa, e também nos indicadores de segurança e de inovação, a Natura se manteve no segundo lugar pelo segundo ano consecutivo. “Com uma abordagem transversal na organização, a busca da sustentabilidade é um componente relevante desde o planejamento estratégico, passando pela definição de indicadores e metas, embasando ações de educação para colaboradores e outros públicos de relacionamento, além de estar atrelado às análises de desempenho e de remuneração da liderança”, salienta a diretora de sustentabilidade, Denise Alves.

Enquanto a maior fabricante de cosméticos do país busca obter matéria-prima de forma sustentável, a poderosa Vale constituiu-se com um extrativismo mineral distante da preservação ambiental. Mas a partir das críticas que recebeu e da expansão global crescente por mercados exigentes, passou a apostar na reabilitação de áreas e no reflorestamento, em projetos sociais comunitários, em reúso de água e em tecnologias diferenciadas, como o processamento do minério de ferro à umidade natural.

“A Vale promove a gestão responsável das questões econômicas, ambientais e sociais, de forma integrada”, afirma Vania Somavilla, diretora de RH, Saúde, Segurança, Sustentabilidade e Energia. “Queremos que nossos negócios, em particular as operações de mineração, produzam riquezas locais, regionais e globais, e também deixem um legado positivo ao longo do ciclo de vida dos empreendimentos. Para tanto, realizamos ações empresariais voluntárias e em parceria com governos, instituições públicas, outras empresas e a sociedade civil.”

O grupo varejista Pão de Açúcar, por sua vez, encara a sua rede como um agente de transformação e de engajamento social. “Estamos na ponta das relações de consumo, conectando clientes, produtos e serviços. Queremos fazer isso sob bases sustentáveis. É do nosso interesse trazer a discussão sobre sustentabilidade para o dia a dia do consumidor, oferecendo meios para que ele comece a mudar de atitude”, diz José Roberto Tambasco, presidente de varejo alimentar do Grupo.

O Banco do Brasil também aposta no potencial de 120 mil funcionários espalhados pelo país. “Temos vasta influência em famílias, círculos sociais, clubes, sindicatos e comunidades. Somos um exército que pode se engajar com o tema da sustentabilidade e da cidadania”, diz Robson Rocha, vice-presidente de pessoas e desenvolvimento sustentável. Dez anos atrás, o setor de sustentabilidade não existia no banco. Hoje, atravessa todas as áreas.

A preocupação com a “pegada ecológica” das agências já registrou, em média, 20% de redução no consumo de energia, revela Rodrigo Nogueira, gerente-geral de desenvolvimento sustentável. Além disso, o Banco do Brasil restringiu a concessão de crédito a empresas envolvidas com desmatamento ou emprego de mão de obra análoga à escrava, investe na preservação de água e mantém mais de 100 parcerias com cooperativas de catadores de lixo, oferecendo inclusão financeira e microcrédito a esse público.

Já a Cemig possui tradição em política ambiental em Minas Gerais, uma vez que promove alagamentos para a implantação de hidrelétricas há 50 anos. Em 1976, a estatal já contava com uma gerência de meio ambiente encarregada de desenvolver a criação de peixes em reservatórios. Ricardo Prata Camargos, gerente de responsabilidade social e ambiental, afirma que a companhia já nasceu com a diretriz, embora o termo sustentabilidade tenha entrado em pauta apenas em 1998.

O executivo atribui a boa performance da Cemig e o lugar conquistado no Global 100 ao seu relatório anual integrado, que reúne em um só os relatórios de sustentabilidade e do Pacto Global do ano, auditado por uma terceira parte. A estatal também realiza Inventário de Gases de Efeito Estufa e faz relatório de riscos e oportunidades em mudanças climáticas. “Sendo mais sustentável, a empresa será mais rentável. A boa postura diminui o risco para o investidor, porque para ser sustentável a empresa precisa ser gerida com ética, responsabilidade social e ambiental”, ressalta.

Maquiagem verde
Independentemente da boa performance das empresas brasileiras no Global 100, é grande o ceticismo com os rankings de sustentabilidade. Nos últimos anos, a moda de elencar “melhores e piores” de toda espécie virou mania. Além disso, sabe-se que o anunciado engajamento social e ambiental nem sempre cumpre o que promete. Enquanto alguns executivos realmente se dedicam, estudam o tema e implementam mudanças, muitas empresas usam os relatórios para alardear publicidade e marketing. Todas falam mais do que fazem.

“Tenho visto muitos relatórios de maquiagem verde, mas as cinco empresas brasileiras listadas no ranking estão trabalhando a sério. A posição que alcançaram decorre de um grande trabalho interno em cada uma delas”, afirma Gláucia Térreo, diretora para o Brasil da organização não governamental Global Reporting Initiative (GRI).

Mais do que promover relatórios, a GRI estabelece princípios e indicadores aos quais as organizações podem recorrer para medir e comunicar seu desempenho econômico, ambiental e social. Seus parâmetros são adotados em outros rankings nacionais e internacionais, assim como os indicadores do Dow Jones Sustainability Index orientam investidores sobre 350 empresas com ações na bolsa de Nova York. As brasileiras Natura, Cemig, Vale e Banco do Brasil integram o Dow Jones. Fundos que se baseiam em empresas do índice DJSI já movimentam US$ 6 bilhões em investimentos.

Seguindo a tendência mundial, em 2005 a BM&FBovespa criou o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), que analisa o desempenho corporativo em eficiência econômica, equilíbrio ambiental, justiça social e governança corporativa. Embora possuam metodologias diferentes, tanto o Dow Jones quanto o ISE avaliam empresas a partir de questionários respondidos pelas próprias e da análise de informações publicadas na mídia.

Já o ranking Global 100 não trabalha com questionários. Ao não se restringir a empresas autodeclaradas sustentáveis, o levantamento traz resultados inusitados, como uma companhia siderúrgica em primeiro lugar. Mas basta um olhar mais atento para entender a classificação.

Atualmente, de 30% a 80% da matéria-prima consumida pela campeã Umicore provém de reciclagem. Além disso, a empresa belga desenvolve tecnologias próprias para reaproveitar metais altamente tóxicos, como o lítio. Está realmente na vanguarda do setor siderúrgico.

“Vejo essa movimentação com muito otimismo. As empresas estão de fato entendendo que o tema sustentabilidade interfere positivamente na geração de receita”, ressalta Gláucia Térreo, da GRI.