Ingrediente tradicional da culinária brasileira, o amendoim é a semente comestível da planta Arachis hypogaea, erva nativa da América do Sul, de caule pequeno e flores amareladas, que depois de fecundadas inclinam-se e penetram no solo, onde o fruto se desenvolve. Daí a origem da palavra amendoim, que vem do tupi mandu’wi e significa “enterrado”.

A semente foi transplantada para outros países, e atualmente seus maiores produtores são a China, a Índia, a Nigéria e os Estados Unidos. O Brasil ocupa o 11º lugar no ranking mundial. Nos EUA, boa parte da produção é destinada à fabricação da popular pasta ou manteiga de amendoim, consumida em sanduíches como substituta da manteiga ou margarina.

No século passado, o amendoim era prescrito como dieta alimentar a enfermos, pois tem propriedades nutritivas incontestáveis. Além de conter proteínas, fibras e vários tipos de vitaminas e minerais, é rico em substâncias antioxidantes (polifenóis) capazes de retardar o envelhecimento, cuja atuação no organismo reduz o mau colesterol (LDL), responsável pelo entupimento das artérias (aterosclerose). Recentes pesquisas do Ministério da Agricultura norte-americano provam que o amendoim é tão rico em antioxidantes quanto o vinho tinto e o morango.

Outra virtude da semente é ter uma dose elevada de vitaminas do complexo B e do aminoácido arginina, que melhoram a circulação do sangue, além de apresentar grande quantidade de vitamina E, matériaprima dos hormônios sexuais. Vem daí a fama de afrodisíaco.

O óleo extraído do amendoim contém basicamente gorduras insaturadas (cerca de 80%). O vegetal, aliás, é o único dotado de um ácido graxo essencial à nutrição humana, o ácido araquidônico, fundamental para o desenvolvimento de fetos e bebês. Também apresenta outros componentes benéficos, como os ácidos linoleico e ]linolênico. No Brasil, quase todo o amendoim cultivado atualmente é de uma espécie cujo óleo não se decompõe quando o produto fica estocado. As novas variedades denominadas alto oleico têm em sua composição ácidos graxos insaturados que, segundo os especialistas, são melhores que os do azeite de oliva.

 

Imagem restabelecida

Com tantas qualidades, o produto deveria ser mais consumido pelos brasileiros do que já é. Nas últimas décadas, porém, o alimento passou a ser olhado com desconfiança e foi até mesmo retirado da merenda escolar. A causa é a suscetibilidade ao fungo Aspergillus flavus, que produz as aflatoxinas, substâncias causadoras de cirrose, câncer hepático e distúrbios nervosos. O fungo se desenvolve em épocas chuvosas ou quando o amendoim é armazenado em locais úmidos, sob processamento inadequado.

As aflatoxinas também são encontradas no milho, sorgo, cevada, arroz, castanha-do-pará, castanha de caju, nozes, pistache, avelãs e cereaisem geral. Os limites admissíveis dessas substâncias no amendoim são estabelecidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em legislação específica, que determina a retirada do Um trabalho pioneiro de distribuição de suplemento alimentar à base de amendoim, leite em pó e açúcar para crianças com desnutrição severa em países da África Subsaariana foi um dos destaques da Quinta Conferência Internacional da Comunidade Científica de Amendoim, realizada na Embrapa, em Brasília, em junho. Amendoim contra a fome Na região ao sul do deserto do Saara vive uma das populações mais pobres do continente. Cerca de 25% das crianças morrem antes de completar 5 anos de idade. A eficiência no tratamento com a dieta da pasta com amendoim pode ser verificada em menos de dois meses. A palestra “Amendoim Contra a Fome” foi apresentada pelo diretor- executivo do American Peanut Council, Howard Valentine. Ele falou sobre o trabalho pioneiro de distribuição do produto Plumpy’nut na África. Trata-se de um suplemento alimentar idealizado pelo nutricionista francês Andre mercado dos produtos com níveis inadequados e prejudiciais à saúde.

Graças a esses cuidados, a presença de amendoim afetado pelas aflatoxinas caiu de 50% para 10% no país. Myrna Sabino, pesquisadora do Instituto Adolfo Lutz, de São Paulo, diz que o crescente interesse sobre as micotoxinas produzidas por fungos surgiu após um acidente ocorrido em 1960, com a morte de 100 mil aves na Inglaterra, por conta da ingestão de torta de amendoim (um tipo de ração) contaminada, em parte oriunda do Brasil.

A contaminação pode ocorrer antes e depois da colheita, durante o armazenamento e o transporte de alimentos. Por isso, é necessário o controle em todas as etapas da produção e da industrialização. Quanto à castanhado- pará, Myrna explica que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) implantou projetos para evitar a contaminação e hoje existe um grande controle. A seu ver, os níveis de aflatoxinas na castanha não são elevados e por isso o caso não é tão preocupante. Além disso, a legislação brasileira estabeleceu limites para a presença da substância nesse alimento.

Outro esforço para melhorar a imagem do amendoim e tornar o seu consumo seguro está sendo feito pela Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab), que implantou o Programa Pró-Amendoim em 2001. No ano seguinte, foi criado o Selo Amendoim de Qualidade Abicab, uma garantia visível ao consumidor de que os produtos nos quais o selo está presente atendem às determinações da legislação.

As empresas participantes desse programa se comprometem a implantar boas práticas de fabricação e análises de risco. Em fevereiro passado, a Anvisa estabeleceu novos limites máximos tolerados para aflatoxinas e, por isso, a indústria está controlando a presença das substâncias não somente no amendoim, mas também em produtos feitos com outros alimentos sujeitos à contaminação.

 

Masaharu Nagato, engenheiro de alimentos da Nagato & Pignocchi Consultores Associados e consultor do Programa Pró-Amendoim, afirma que a melhora na qualidade do produto deve-se a uma soma de fatores entre os quais o investimento das empresas e o consenso na adoção de um comportamento ético industrial. Um sinal de sucesso é o fato de o DG-Sanco, o órgão normatizador de alimentos da União Europeia, ter passado a considerar, em 2010, o amendoim brasileiro como produto de risco normal quanto à contaminação por aflatoxinas.

Amendoim contra a fome

Um trabalho pioneiro de distribuição de suplemento alimentar à base de amendoim, leite em pó e açúcar para crianças com desnutrição severa em países da África Subsaariana foi um dos destaques da Quinta Conferência Internacional da Comunidade Científica de Amendoim, realizada na Embrapa, em Brasília, em junho.

Na região ao sul do deserto do Saara vive uma das populações mais pobres do continente. Cerca de 25% das crianças morrem antes de completar 5 anos de idade. A eficiência no tratamento com a dieta da pasta com amendoim pode ser verificada em menos de dois meses.

A palestra “Amendoim Contra a Fome” foi apresentada pelo diretor- executivo do American Peanut Council, Howard Valentine. Ele falou sobre o trabalho pioneiro de distribuição do produto Plumpy’nut na África. Trata-se de um suplemento alimentar idealizado pelo nutricionista francês Andre Briend que, por não necessitar de cozimento ou refrigeração, é uma boa alternativa para locais em situação precária. Além disso, é embalado de forma a facilitar o transporte e o uso pelas mães.

Quanto à possibilidade de alergia associada à ingestão de amendoim, a pediatra britânica Susan Shepherd, que trabalha no grupo Médicos Sem Fronteiras na Nigéria, considera que os casos de alergias alimentares são muito raros em países não industrializados. Uma vantagem dos suplementos à base de amendoim terapêutico é seu baixo custo: US$ 20 para o fornecimento de um mês por criança. Em forma de pasta, os alimentos chegam a ter vida útil de dois anos.

Prós e contras

A controvérsia, entretanto, persiste. O médico e nutrólogo Silvio Lagana de Andrade, por exemplo, é radicalmente contra a ingestão de amendoim. Ele se baseia em estudos norte-americanos para defender a tese de que a semente pode causar alergia em pessoas suscetíveis, bem como intolerância alimentar. Andrade explica que a intolerância é mais sutil e difícil de ser detectada porque os sintomas – enxaquecas, má digestão, dores articulares e outros – não são imediatos e se confundem com os produzidos por outros fatores. Nas crianças intolerantes, segundo o médico, pode ocorrer hiperatividade e falta de concentração.

Masaharu Nagato rebate, afirmando que a alergia ao amendoim depende de diversos fatores como a quantidade consumida, o processamento do alimento e a dieta materna e a da criança, entre outros. Este ano, o professor Alceu Afonso Jordão Jr., da Divisão de Nutrição do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP), reviu e estudou 100 trabalhos cientificamente confiáveis, nacionais e internacionais, com pesquisas sobre as propriedades antioxidantes do amendoim. Sua conclusão é de que se trata de alimento com excelentes propriedades benéficas à saúde humana.

As flores amarelas do amendoim penetram o solo e, bem cuidadas, viram uma semente de alto valor nutricional

 

A nutricionista Vanderli Marchiori também é favorável ao consumo, porém dentro de um plano dietético saudável e em quantidades adequadas, limitadas a um máximo de 40 gramas diárias. “Trata-se de um alimento que apresenta alto valor nutricional, atuando na prevenção de várias doenças, inclusive o câncer. Além disso, reduz o risco de problemas cardiovasculares e ajuda a combater a obesidade, reduzindo a gordura abdominal e o apetite”, explica. O consumo pode ser feito por crianças a partir de 3 anos de idade e é indicado para maiores de 60 anos, pois, por ser um excelente antioxidante, reduz a degeneração das células, inclusive as cerebrais.

O amendoim tornou-se um alimento seguro graças ao trabalho de entidades como a Anvisa e a Abicab, afirma a nutricionista. Por isso, ela recomenda, como garantia, apenas o consumo de produtos que levem o selo de qualidade. O selo está presente, hoje, até nas embalagens do amendoim cru vendido em porções fracionadas nos supermercados.