Barato e abundante, o carvão nunca deixou de ser usado como fonte de energia. Ao contrário: a demanda mundial por esse combustível fóssil, importantíssimo na produção de aço e de eletricidade, mais que dobrou nos últimos 35 anos. Calcula-se que as reservas mundiais sejam suficientes para 150 anos de consumo. Mas o carvão é, de longe, a fonte que mais emite dióxido de carbono (CO2), pelas substâncias que o compõem e o controle pouco eficiente das centrais que o usam. Só em 2005, o carvão emitiu mais toneladas de CO2 que o petróleo: cerca de 10,980 bilhões, ante 10,716 bilhões. E forneceu apenas 25,3% de energia primária mundial, ante 35% da gerada pelo petróleo.

A Agência Internacional de Energia (AIE) prevê que o consumo mundial de carvão poderá aumentar 70% até 2030, mantidas as políticas energéticas atuais. O cenário não é nada promissor, sob o ponto de vista ambiental. O carvão queimado pelas usinas libera dióxido de enxofre (principal causa da chuva ácida), óxidos de nitrogênio (origem de chuva ácida e poluição) e CO2 (produz o efeito estufa, principal suspeito do aquecimento global). Para os pessimistas, não é possível resolver o problema em pouco tempo. Os otimistas, por seu lado, acreditam poder limitar o impacto da queima do carvão sobre o meio ambiente e o clima, embora saibam que os procedimentos necessários para isso não estarão prontos antes de uma década, no mínimo. Há muitas questões a considerar.

Hoje, Austrália, Estados Unidos, Índia e China continuam a usar carvão, assim como a Europa – em 2007, um estudo da Worlwide Fund for Nature (WWF) apontou que as 30 centrais europeias mais poluentes em CO2 usam esse combustível. Mesmo o fato de uma central a carvão na Europa não ser rentável atualmente, pelas taxas aplicadas sobre o CO2 e pela construção ser mais cara que a de uma central nuclear, pode não bastar para impedir sua realização. Somente na União Europeia prevê-se a construção de quatro grandes centrais (1.000 megawatts) por ano, durante 30 anos. A partir de 2020, porém, elas deverão obedecer a severas regras antipoluição.

Nos EUA, o carvão é o principal combustível na produção de eletricidade. Até 2030, seu consumo deverá aumentar 60%. Se a política energética de George W. Bush não for mudada, o carvão poderá fornecer 55% da eletricidade do país, ante 50% hoje. Até 2015 está prevista a construção de apenas uma central nuclear, ante 170 centrais a carvão. Destas, apenas 33% serão “limpas”.

Ao que tudo indica, o uso do carvão por usinas elétricas deve continuar por várias décadas.

Os sinais mais alarmantes vêm da Ásia. Entre eletrificar e emitir menos CO2, países em desenvolvimento, como China e Índia, fizeram sua escolha. A China usa atualmente mais carvão que EUA, Europa e Japão juntos. Seu consumo dobrou entre 2000 e 2006, e hoje, sozinha, ela responde pelo uso de mais de 38% do carvão empregado no mundo. Só em 2006 os chineses construíram 100 gigawatts de centrais térmicas a carvão – média de 2 GW por semana, o equivalente a duas ou três centrais. É pouco provável que sejam instaladas rapidamente unidades de captação de CO2 nas novas centrais – o que poderia reduzir as emissões de 80% a 90% por unidade elétrica, mas diminuiria o rendimento total de 8% a 13%. Quanto às velhas centrais, da China ou de qualquer outro lugar, é impossível equipá-las no sentido de controlar a emissão de CO2.

Atualmente, a China responde pelo uso de mais de 38% do carvão consumido no mundo

Aparentemente, o uso de carvão por usinas elétricas ainda é inevitável por várias décadas. Uma das principais ideias para reduzir a quantidade de gases-estufa no ar é armazenar o CO2 sob a terra. Mas ainda não se sabe onde e quando estocá-lo seguramente por longo tempo, nem quanto isso custaria. Também se pergunta que tipo de empresa se responsabilizará por enterrar milhões de toneladas de CO2 por centenas ou milhares de anos, respondendo por eventuais vazamentos e pela contaminação do ar e de lençóis freáticos.

Até 2050, será preciso reduzir pesadamente as emissões mundiais de gasesestufa. Caso contrário, a temperatura terrestre subiria em média 2 graus Celsius, com dramáticas consequências.

As mais novas propostas

>>Otimizar a produção

As centrais precisam aumentar sua eficiência para produzir mais quilowatts com menos carvão e aumentar o rendimento, pois apenas 30% da energia produzida é aproveitada. O tipo de carvão usado também é importante na conquista de pontos percentuais extras, bem como o aperfeiçoamento de turbinas e caldeiras. A meta de 50% de aproveitamento ou mais está prevista para 2020.

ONDE – Países em desenvolvimento.

CUSTO – As centrais supercríticas não são mais caras que as críticas.

PRÓS E CONTRAS – O rendimento melhora; não há cuidado com a captação de CO2.

QUANDO – Em andamento, com perspectiva de melhora até 2020.

>> Capturar CO2

A mais conhecida técnica para isso usa um solvente líquido que retira o CO2 da fumaça produzida pela queima. Esse líquido é aquecido para recuperar o CO2 quase limpo. O problema é que o aquecimento reduz o rendimento em quase 10% e o custo total (com a estocagem) tornase muito elevado. A central piloto Castor, na Dinamarca, trabalha com um custo extra de cerca de 40 euros por tonelada de CO2 captado, o que a torna menos competitiva no mercado internacional. O objetivo é cortar ao meio esse montante.

ONDE – Europa.

CUSTO – 60 a 80% mais caro do que sem captação.

PRÓS E CONTRAS – Tecnologia que pode ser instalada em novas centrais; custos e rendimento.

QUANDO – Técnica a ser comercializada por volta de 2012-2015.

>> Queimar em oxigênio puro

Nessa tecnologia, o combustível fóssil é queimado em contato com oxigênio puro e não com o ar. Em teoria, ao se aplicar essa técnica, não se encontrará nada na fumaça além de CO2 e vapor d’água. Para separar a água do gás, bastaria uma simples condensação. Mas o processo exige altas temperaturas, apresenta maior desgaste e aumenta o índice de corrosão de materiais (como as turbinas), que deverão ser alterados para dar conta do recado. O alto custo e a baixa de rendimento causados pela necessidade de separar o oxigênio do nitrogênio do ar são os maiores inconvenientes. No entanto, como a captura do CO2 é mais simples, o preço final da energia será menor que a produzida por centrais que façam a captura pós-combustão.

ONDE – Alemanha, Estados Unidos, Austrália.

CUSTO – Mais baixo do que a captação na pós-combustão.

PRÓS E CONTRAS – Captação mais fácil; necessidade de instalação de usina de oxigênio.

QUANDO – Não antes de 2015, por questões comerciais.

>> Queimar em ciclos combinados

Ao clássico ciclo vapor/turbina/condensação soma-se outro ciclo, com o uso de uma segunda turbina, dessa vez a gás. O carvão também é queimado em oxigênio puro, mas a combustão é incompleta, para se obter uma mistura conhecida como gás de síntese, formada por monóxido de carbono e hidrogênio. Esse gás faz girar uma turbina e o calor é recuperado para vaporizar água, que aciona uma turbina a vapor. O procedimento compensa a energia gasta no processo e melhora o rendimento total, estimado em cerca de 60% para 2025.

ONDE – Estados Unidos, Europa, China, Austrália.

CUSTO – Mais econômico que a combustão em oxigênio puro.

PRÓS E CONTRAS – Captação mais fácil e possibilidade de melhores rendimentos; muito cara e complexa para ser construída.

QUANDO – Entre 2015 e 2020 para aplicações comerciais.

>> Refinar o gás

O gás de síntese pode ser usado em reações químicas e na fabricação de inúmeros produtos, como essências, metanol, amoníaco ou hidrogênio. E a usina se torna uma verdadeira refinaria polivalente. A variedade desses produtos amortiza os custos, permite ajustar a produção para atender a demanda e leva a um equilíbrio maior em termos de eficiência energética. Só que, em função desses produtos, não se pode falar em carvão limpo. A produção de hidrogênio é que é limpa, pois permite uma captura quase completa do CO2. Mas a obtenção de outros elementos resulta em emissões ricas em CO2 – segundo o Massachusetts Institute of Technology (MIT), cerca de 150% a mais de CO2 do que uma clássica refinaria de petróleo. Ainda é preciso confirmar o que esse tipo de refinaria promete.

ONDE – África do Sul, China e Austrália.

CUSTO – Ainda impossível de avaliar.

PRÓS E CONTRAS – Permite flexibilidade em função da demanda; muito difícil de realizar.

QUANDO – Já existe para transformar carvão em essência. Para hidrogênio, estima-se que dentro de dez anos.

>> Estocar com segurança

O potencial de armazenamento geológico é enorme, com destaque para os aquíferos salinos. Com rochas encharcadas de água imprópria para consumo, eles apresentam uma capacidade de 10 trilhões de toneladas, o suficiente para absorver as emissões de CO2 dos próximos 100 anos. Esse tipo de estocagem já está em experiência desde 1996 em Sleipner, ao largo da Noruega, e na Argélia a partir de 2004. A experiência de Sleipner é um sucesso: 8 milhões de toneladas de CO2 foram injetadas a uma profundidade de 800 metros. O gás se espalhou sob o teto impermeável do reservatório e não houve vazamento. Pesquisadores acreditam que serão necessários cerca de 7 mil anos para o CO2 se dissolver totalmente na água salgada e se estabilizar.

Outra opção é usar jazidas de petróleo ou de gás natural vazias, que poderã o estocar 1/3 das emissões de gás do próximo século. Armazenar CO2 em jazidas de petróleo ainda em exploração é uma alternativa, com a vantagem de tornar o petróleo menos viscoso e mais fácil de ser extraído, o que pode ser economicamente vantajoso. Mesmo assim, há riscos ambientais, como mudança da composição da água potável, acidificação do solo, emissão de gases. Para a tecnologia tornar-se comercial em 2020, industriais e pesquisadores devem desenvolver desde já projetos simil

ONDE – Europa, Estados Unidos, Canadá e China.

CUSTO – 60 a 80% mais caro que os processos sem captura de CO2.

PRÓS E CONTRAS – Ausência de emissões de CO2; transporte do CO2 e vazamentos possíveis.

QUANDO – Antes de 2020.