Milhares de migrantes aguardam na Bósnia e Herzegovina a oportunidade de buscar um futuro melhor na UE. A sobrevivência de muitos depende da dedicação de alguns voluntários que atuam sem registro.Jasmina Hušidić não se detém com bagatelas: ela freia, salta do carro, cumprimenta rapidamente e já sumiu dentro do supermercado. É compreensível, pois ela não tem muito tempo, neste dia de fevereiro cinzento e chuvoso na cidade de Velika Kladuša.

Antes que fique totalmente escuro no extremo-noroeste da Bósnia e Herzegovina, ela ainda quer distribuir arroz, óleo, um pouco de carne e também sapatos e agasalhos entre os migrantes e refugiados que vivem nos bosques ou prédios abandonados em torno de sua cidade natal. Já faz um ano que ela repete esse ritual, noite após noite, quando sai do trabalho numa repartição governamental bósnia.

Desde que a Hungria e outros países ergueram cercas em suas fronteiras, milhares de migrantes tentam entrar na União Europeia pela Bósnia. Embora nenhum deles pretenda permanecer, ela tenta cuidar para que se sintam bem-vindos, conta Hušidić após as compras, enquanto embala em sacolas plásticas alguns pares de botas de inverno e jeans doados.

“Minhas duas filhas estão na universidade, uma na Áustria, a outra na Alemanha. Se elas têm a chance de uma vida melhor, então por que não os outros, também?”

Solidariedade ilegal

A primeira parada da mulher de 49 anos naquela noite é uma fábrica dilapidada, conhecida como “Chaminé”, pois ostenta uma que pode ser vista de todas as partes. “Pode me ajudar?”, pede a um rapaz que vem em sua direção, e lhe entrega algumas sacolas.

Juntos, ambos caminham até a entrada, por um misto de lama e garrafas plásticas amassadas. No primeiro andar da ruína industrial, alguns algerianos montaram sua barraca. Um deles mostra a foto da filha pequena no celular. Daria. “Que gracinha”, elogia Jasmina Hušidić, e fica ainda uns minutos conversando. Aí já está na hora de seguir adiante.

“Às vezes é tudo bem pesado, mesmo”, comenta ela a caminho do automóvel. Com frequência, sente-se mal por não poder fazer mais, motivo por que, juntamente com outros bósnios, está fundando um grupo de assistência. Até agora ela tem trabalhado em conexão com uma ONG austríaca, que lhe fornece roupas, sapatos e donativos em dinheiro vindos da Áustria e da Alemanha.

Hušidić e seus companheiros esperam obter em breve o registro necessário: sem ele, o tipo de ajuda que prestam é ilegal. Até agora ela mesma não teve problemas, talvez por seu irmão trabalhar na polícia. Para outros, porém, a coisa é bem diferente. “Fazemos tudo discretamente, não desafiamos ninguém. É melhor, nesta situação.”

Ela se refere ao fato de que nem toda a população local recebe os refugiados de braços abertos: “Tem gente que me dá vergonha, o que fizeram por aqui. Aconteceram muitas coisas ruins.” Uma outra voluntária conta que alguém a denunciou. Como ainda não sabe o que vai acontecer, prefere permanecer anônima.

Sonho de uma vida na União Europeia

Em Bihać, uma hora ao sul de Velika Kladuša, o comissário de polícia do Cantão de Una-Sana, Nermin Kljajić, afirma que quem se mantiver dentro da lei não tem nada a temer ali. No entanto, “se descobrimos que cidadãos estrangeiros estão trabalhando sem permissão, eles são deportados”.

Representantes de organizações humanitárias de outros países europeus confirmam que as autoridades locais aumentaram a pressão, dificultando a prestação de assistência fora dos abrigos de refugiados oficiais. Eles também criticam a dificuldade de obter um registro oficial para prestação de assistência.

A essa altura, Jasmina Hušidić chegou à última estação da noite, um acampamento improvisado na floresta, em que moram vários homens de Bangladesh. Alguns se aglomeram em volta de uma pequena fogueira. Mesmo com a chegada em breve da primavera, as noites ainda são geladas.

As autoridades bósnias não veem com bons olhos acampamentos como este. Do ponto de vista do comissário Kljajić, eles colocam em perigo a segurança da população local: “Precisamos cuidar para que os mantimentos só sejam distribuídos nos abrigos oficiais”, insiste.

Porém a voluntária de Velika Kladuša não quer abandonar à própria sorte itinerantes como estes aqui da floresta. O bengalês Jahanjir Alom Sumon, de 22 anos, afirma que ele e os demais só estão relativamente bem graças a voluntários como Jasmina Hušidić: “Alguns nos trazem comida, outros, roupa, outros, sapatos.”

Na verdade, porém, todos ali só querem poder seguir o mais rápido possível para a UE: primeiro para a Croácia, depois para a Itália, em seguida talvez para a França ou a Alemanha. Hušidić torce para que um dia se cumpra esse sonho de um futuro melhor. Enquanto eles estiverem aqui, contudo, ela vai continuar vindo, noite após noite.