Pesquisadores mostraram que a agregação de beta-amiloide, uma das duas proteínas-chave implicadas na doença de Alzheimer, faz com que as células superaqueçam e “fritem como ovos”.

Os cientistas, da Universidade de Cambridge (Reino Unido), usaram sensores pequenos e sensíveis o suficiente para detectar mudanças de temperatura dentro de células individuais e descobriram que, à medida que o beta-amiloide se dobra e se aglomera, faz com que as células superaqueçam.

Em um experimento usando linhas de células humanas, os pesquisadores notaram que o calor liberado pela agregação de beta-amiloide poderia causar a agregação de outros beta-amiloides saudáveis, causando a formação de mais e mais agregados.

Na mesma série de experimentos, os pesquisadores também mostraram que a agregação de beta-amiloide pode ser interrompida e a temperatura da célula reduzida, com a adição de um composto de droga. Os experimentos também sugerem que o composto tem potencial como terapêutico para a doença de Alzheimer, embora testes extensivos e ensaios clínicos sejam necessários primeiro.

Ferramenta de diagnóstico

Os pesquisadores dizem que seu ensaio pode ser usado como uma ferramenta de diagnóstico para a doença de Alzheimer ou para rastrear potenciais candidatos a medicamentos. Os resultados são relatados na revista Journal of the American Chemical Society.

A doença de Alzheimer afeta cerca de 44 milhões de pessoas em todo o mundo e atualmente não há diagnósticos ou tratamentos eficazes para ela. Na doença, a beta-amiloide e outra proteína chamada tau se acumulam em emaranhados e placas – conhecidas coletivamente como agregados –, fazendo com que as células cerebrais morram e o cérebro encolha. Isso resulta em perda de memória, alterações de personalidade e dificuldade em realizar funções diárias.

É uma doença difícil de estudar, pois se desenvolve ao longo de décadas, e um diagnóstico definitivo só pode ser dado após o exame de amostras de tecido cerebral após a morte. Ainda não se sabe que tipo de mudanças bioquímicas dentro de uma célula levam à agregação de beta-amiloide.

No grupo de pesquisa da professora Gabriele Kaminski Schierle no Departamento de Engenharia Química e Biotecnologia da Universidade de Cambridge, investiga-se a possível ligação entre temperatura e agregação de beta-amiloide em células humanas.

O campo de estudo das mudanças de temperatura dentro de uma célula é conhecido como termogênese intracelular. É uma área nova e desafiadora: os cientistas desenvolveram sensores com os quais as mudanças de temperatura podem ser medidas, mas ninguém nunca tentou usar esses sensores para estudar condições como a doença de Alzheimer.

Liberação de calor

“A termogênese tem sido associada ao estresse celular, o que pode promover mais agregação”, disse Chyi Wei Chung, primeira autora do estudo. “Acreditamos que quando há um desequilíbrio nas células, como quando a concentração de beta-amiloide é um pouco alta demais e começa a se acumular, a temperatura celular aumenta.”

“Superaquecer uma célula é como fritar um ovo – à medida que aquece, as proteínas começam a se aglomerar e se tornar não funcionais”, disse Kaminski Schierle, que liderou a pesquisa.

Os pesquisadores usaram pequenos sensores de temperatura chamados termômetros poliméricos fluorescentes (FTPs) para estudar a ligação entre agregação e temperatura. Eles adicionaram beta-amiloide a linhagens de células humanas para iniciar o processo de agregação e usaram um produto químico chamado FCCP como controle, já que é conhecido por induzir um aumento na temperatura.

Eles descobriram que, à medida que a proteína beta-amiloide começou a formar agregados semelhantes a fios chamados fibrilas, a temperatura média das células começou a aumentar. O aumento da temperatura celular foi significativo em comparação com as células que não tiveram adição de beta-amiloide.

“À medida que as fibrilas começam a se alongar, elas liberam energia na forma de calor”, afirmou Kaminski Schierle. “A agregação de beta-amiloide requer muita energia para começar, mas uma vez que o processo de agregação começa, ele acelera e libera mais calor, permitindo que mais agregados se formem.”

Potencial terapêutico

“Uma vez que os agregados se formam, eles podem sair da célula e ser absorvidos pelas células vizinhas, infectando a proteína beta-amiloide saudável nessas células”, disse Chung. “Ninguém mostrou essa ligação entre temperatura e agregação em células vivas antes.”

Usando uma droga que inibe a agregação de beta-amiloide, os pesquisadores conseguiram identificar as fibrilas como a causa da termogênese. Anteriormente, não se sabia se a agregação de proteínas ou o dano potencial às mitocôndrias – as “baterias” que alimentam as células – era responsável por esse fenômeno.

Os pesquisadores também descobriram que o aumento da temperatura celular pode ser mitigado tratando-os com um inibidor de agregação, destacando seu potencial como terapêutico para a doença de Alzheimer.

Os experimentos de laboratório foram complementados por modelagem computacional descrevendo o que pode acontecer com a beta-amiloide em um ambiente intracelular e por que isso pode levar a um aumento nas temperaturas intracelulares. Os pesquisadores esperam que seu trabalho motive novos estudos incorporando diferentes parâmetros de relevância fisiológica.