No filme “Grand Canyon – Ansie­da­de de uma Ge­ração”, que o diretor-roteirista Lawrence Kasdan lançou em 1991, o personagem Simon (vivido por Danny Glover) diz em certo momento para o milionário Mack (Kevin Kline) que, nos momentos mais turbulentos de sua existência na sufocante Los Angeles, lembrar-se de uma visita ao Grand Canyon lhe devolvia a paz e a tranquilidade. A visão daquela paisagem fazia com que ele entendesse que todos os seus problemas eram minúsculos diante daquelas obras de milhões de anos. Isso lhe dava ânimo para retornar e enfrentá-los.

O impacto que essa integrante da lista das Sete Maravilhas Naturais do Mundo causa nos que a visitam encontra uma explicação mais detalhada pela ótica de um dos pais da psicologia transpessoal, o tcheco radicado nos Estados Unidos Stanislav Grof. Para ele, a beleza majestosa do Grand Canyon é um lugar capaz de originar experiências de “emergências espirituais”, definidas como processos complexos e evolutivos que conduzem a um modo de vida mais realizado e maduro. Em meio àquele cenário grandioso, qualquer pessoa pode sentir-se em êxtase e ligada a algo maior do que ela mesma. Entre os seduzidos pelo cânion estava o presidente americano Theodore Roosevelt (1901-1909), um dos principais defensores da preservação do local e visitante contumaz, tanto para caçar como apreciar as deslumbrantes vistas.

Mesmo os turistas com pouco tempo para visitar o local se encantam com as vistas espetaculares (Foto: iStockphotos)

Localizado no noroeste do Arizona, o Grand Canyon é o resultado de uma notável obra de erosão, sobretudo do vento, na árida bacia do rio Colorado, um curso d’água que nasce no estado do mesmo nome e, depois de 2.330 quilômetros, deságua no Golfo da Califórnia, já em território mexicano. O cânion, o maior da Terra, tem 446km de comprimento e 29km de largura, e sua profundidade máxima ultrapassa 1.800 metros. Seu processo de formação, que teria sido iniciado cerca de 70 milhões de anos atrás, expõe momentos da história geológica da Terra ocorridos há 2 bilhões de anos.

Indígenas norte-americanos têm ocupado a área do cânion e suas cavernas desde 2100 antes de Cristo. A tribo pueblo, a propósito, considerava o local um sítio sagrado e realizava peregrinações até lá. Os homens brancos só chegaram ao Grand Canyon em 1540: era um grupo de espanhóis da expedição de Francisco de Coronado, liderado por García López de Cárdenas, que procurava as míticas (e ricas) sete cidades de Cibola.

Viajar no lombo de mulas é uma das maneiras tradicionais de explorar o Grand Canyon (Foto: iStockphotos)

Exploração difícil

As dificuldades para explorar esse território eram tão grandes que uma expedição completa só chegaria ao local em 1869. Nesse ano, o americano John Wesley Powell e outros nove companheiros saíram do estado do Wyoming, ao norte, e desceram pelo rio Colorado até a sua foz – só dois integrantes do grupo completaram a viagem. Duas explorações posteriores, em 1871 e 1872, ajudaram Powell a elaborar o livro “Exploração do Rio Colorado do Oeste e Seus Tributários”, o primeiro documento a revelar – em texto e nas duas ilustrações feitas por Thomas Moran – as riquezas ocultas naquela região.

Os voos a bordo de helicópteros permitem uma visão mais abrangente do cânion (Foto: iStockphotos)

A preservação do lugar foi inicialmente preterida em troca do estabelecimento de empreendimentos econômicos, como a mineração de cobre, prata, platina e amianto. Apenas em 1919 surgiu o Parque Nacional do Grand Canyon, destinado a cuidar da área e das três reservas indígenas ali mantidas. A cada ano, cerca de 6 milhões de pessoas visitam a área, o segundo maior público entre os parques nacionais americanos.

É mais fácil chegar ao parque pelo lado sul, que permanece aberto o ano inteiro (o lado norte fica fechado de meados de outubro a meados de maio), a partir da estrada que sai próxima à cidade de Williams. Paga-se uma pequena taxa para entrar, e a partir daí há um sem-número de atividades a escolher, desde simplesmente apreciar as vistas até sobrevoar a região de helicóptero ou descer as encostas e explorar o interior do cânion, visitando, por exemplo, as reservas indígenas ali existentes ou navegando pelo rio Colorado. Para isso, naturalmente, é necessário programar tudo com antecedência – as acomodações dentro do cânion são limitadas (e quem quer acampar precisa de permissão prévia).

As paredes que cercam o rio Colorado na região chegam a 1.800 metros de altura (Foto: iStockphotos)

Mesmo para os que tiverem pouco tempo e só puderem ficar nas bordas da formação por algumas horas, a visita já vale a pena. Não há como não se encantar, por exemplo, com a deslumbrante mudança de cores nas encostas durante a alvorada ou o pôr do sol. Nesse simples momento, até mesmo o turista mais apressado poderá viver um episódio de emergência espiritual daqueles que Stanislav Grof descreve.