O número elevado de imigrantes e de miscigenação nos Estados Unidos fará com que a população branca, em poucos anos, se torne minoria. Essa mudança na configuração nacional tem gerado discussões no país. Primeiro, graças à perda de espaço daqueles chamados “nativos brancos” para imigrantes – sobretudo, mexicanos – e as implicações políticas e sociais causadas por essa transformação, como a recente lei de imigração do Estado do Arizona, que obriga estrangeiros a portar sempre documentos de imigração, mesmo quando moram legalmente no país. O segundo ponto de debate é a diversidade da geração jovem de norte-americanos que, inevitavelmente, abrirá as portas para uma comunidade mais integrada, em uma era pós-racista.

De acordo com o Census Bureau, órgão equivalente ao nosso Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a estimativa é que, por volta de 2050, os brancos sejam minoria nos Estados Unidos. Pode-se dizer que os imigrantes latino-americanos têm se integrado à sociedade norte-americana de um modo pacífico, ao contrário dos imigrantes europeus. Ao mesmo tempo, é previsível que daqui a algumas décadas os norte-americanos invistam em uma nova distinção de grupos. E essa nova configuração que está por vir chama a atenção.

É certo que uma das principais mudanças em relação aos grupos étnicos na América do Norte envolverá a população que habita há mais tempo na região: os brancos nativos. Essa reestruturação da sociedade pode pôr em xeque a noção de identidade nacional. Os norte-americanos terão de considerar que a nação está relacionada a um conjunto de ideias semelhantes, em vez de considerá-la uma homogenia étnica e religiosa.

O impacto social mais evidente dessa mudança demográfica será político. A Califórnia é um exemplo. Nos dez últimos anos, o número de britânicos e descendentes tem caído. Hoje, eles representam menos de 50% da população local. Como resultado disso, notou-se que os brancos começaram a desenvolver uma consciência de grupo que visa a seus interesses políticos. Por exemplo, em 1996, os eleitores brancos californianos votaram a favor da proposição 209, que buscou eliminar a ação afirmativa (medida que oferecia benefícios educacionais e sociais a membros de grupos minoritários por conta de etnia, sexo e religião), porque os eleitores do grupo majoritário se sentiram prejudicados. Na época, a Califórnia também tomava medidas contra a imigração ilegal e o ensino bilíngue nas escolas. É fácil concluir que essas iniciativas foram parte de um processo de defesa contra a transformação étnica do Estado. Essa batalha contra a transformação, porém, assegurou que não houvesse mais nenhuma outra proposição. Tendo em vista o aumento das minorias em relação aos brancos, e sua superação em número, boa parte dos políticos norte-americanos relutou em aprovar qualquer iniciativa benéfica aos outros grupos.

Ainda que os brancos estejam fadados a se tornar minoria da população nacional, a maioria dos Estados provavelmente terá maior número de brancos. É bom lembrar que essa reversão demográfica está ocorrendo no Estado mais populoso do país. Uma consciência política dos brancos é mais provável em regiões em que essa mudança de população está longe de se concretizar. É nessas áreas, em que o status “minoria branca” ainda é um fantasma, que os políticos e demagogos podem empregar a retórica do nacionalismo branco. Mas, ao contrário do que se poderia pensar, não se verá a supremacia branca estufar o peito. Na verdade, a tendência é que haja uma postura mais defensiva, também focada no complexo de vítima, que pode causar tensão no contrato social e enfraquecer a noção coletiva de bem comum.

Durante esses anos, os EUA foram governados pela supremacia branca. Prova desse poder aconteceu entre 1790 e 1952, quando o Congresso incluiu uma declaração no ato de naturalização que diz que o aspirante a cidadão norte-americano deveria ser uma “pessoa branca”.

 

Não é surpresa que, apesar do progresso na integração de imigrantes nos últimos 50 anos, a noção de direito de propriedade é da população branca. Ainda que o atual presidente dos EUA, Barack Obama, descenda de africanos, os cidadãos têm em mente que os brancos representam o país como um todo, e a minoria étnica é apenas a expressão de uma pequena parcela da sociedade.

Em 1991, Arthur M. Schelesinger Jr. escreveu em seu best-seller The Disuniting of America que a base no multiculturalismo ameaça a integridade da nação. Segundo ele, o culto à etnia pode culminar na divisão da identidade norteamericana. Hillary Clinton, em 2008, refletiu essa premissa ao recorrer à ajuda dos “brancos trabalhadores” para derrotar Obama.

NOVOS GRUPOS SE FORMARÃO E SE DEDICARÃO

A DEFENDER SEUS INTERESSES

E DIREITOS DE AMERICANOS EUROPEUS

Nos últimos anos, aumentou o número de acusações de discriminação reversa em casos judiciais. Homens brancos declararam que a promoção de cargo lhes foi negada por conta de sua etnia. Um caso muito polêmico aconteceu ano passado, na cidade de New Haven, em Connecticut. O Corpo de Bombeiros aplicou exames escrito e oral em 118 candidatos a tenente e capitão. O resultado foi que a aprovação dos negros era metade da dos brancos. Para evitar as reivindicações do grupo de negros, foi decidido que a promoção não teria como base os exames, negando o benefício a alguns brancos para que os negros subissem de cargo. Tal medida foi a julgamento, e o Supremo Tribunal do país declarou que a cidade foi injusta com os bombeiros brancos.

Para os próximos anos, não é de se espantar que haja mais processos antidiscriminatórios arquivados e mais revoltas contra a discriminação reversa. Não só a ação afirmativa começará a sofrer grande resistência, como também haverá mais demanda para a entrada de brancos em uma ação afirmativa e em programas governamentais de inclusão. Com a mudança demográfica, novos grupos se formarão e se dedicarão a defender seus interesses e direitos de norte-americanos europeus. Com isso, os candidatos dos dois maiores partidos do país passarão a usar a seu favor esse sentimento dos brancos.

A etnia continuará a definir as características e posições políticas dos EUA, mas a dinâmica desse impasse será diferente. Com a eleição de Obama, os negros começaram a participar mais das decisões políticas, votando mais, fato que demonstra seu otimismo. Ativistas latinos não têm mais lutado contra o poder nos EUA, mas, sim, para se tornar parte dele. Enquanto isso, embora tenham mais acesso à riqueza e à influência política, os brancos estão agindo cada vez mais como uma minoria reprimida.