O artista e arquiteto brasileiro Luca Benites, que mora em Barcelona, na Espanha, chocou o mundo da arte contemporânea ao incinerar toda a sua produção artística, desenvolvida ao longo de quase 20 anos de trabalho, em 2017.

Ele queimou suas 298 obras, entre quadros e esculturas, que se transformaram em dez litros de cinzas após sete horas de fogo em um terreno na Áustria

A medida radical, registrada em livro e documentário, foi realizada em meio a um “processo pessoal e espiritual” de autoconhecimento e renovação, e deu origem ao projeto “Fogo”. Nele, Luca desenvolve esculturas semelhantes a gotas e ampulhetas com cinzas de suas próprias obras e propõe reflexões em relação à passagem do tempo.

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A performance artística divide opiniões, mas se encaixou perfeitamente bem em um cenário de pandemia como o que estamos vivenciando, em que a concepção do tempo se transforma diariamente. A frase utilizada pelo artista repetidamente durante a realização do projeto, inclusive, se encaixa perfeitamente neste novo cenário: “Estamos realmente vivendo ou sobrevivendo?”

Para Luca, a queima representou uma depuração em sua vida profissional, que foi levado para o âmbito pessoal, também. Suas inspirações, anteriormente ligadas mais à arquitetura e à configuração das cidades, abriram espaço para um entendimento mais amplo.

“Depois de queimar todo meu trabalho de anos, comecei a questionar como meu tempo era gasto. Tenho essa inquietação há muito tempo. É lamentável que tenha ocorrido uma pandemia mundial para que as pessoas conseguissem enxergar isso”, comenta o artista.

“Documentar, acumular, queimar, destruir e reorganizar. Situações que nos levam a novas considerações e nos aproximam de nossa única certeza. Essa certeza de que um dia o mesmo caminho marcará um ponto final nesta jornada que é viver”, descreve ele, em fragmento de “Fogo”.

Em 2020, em uma viagem ao Deserto do Atacama, o artista finalizou este projeto ao se encontrar com o vazio físico e real. “Agora, meu processo de criação tem sido mais lento que antes, porém, mais preciso. Ainda estou com vários projetos, mas minha concepção de tempo é diferente do tempo normal, do tempo cronológico. O conteúdo do trabalho tem que ser tão ou mais importante que a peça em si; ambos se complementam, hoje eu entendo isso. Minha obra vai refletir o meu momento presente, sempre. O ‘Fogo’ me liberou dessas correntes. Me sinto mais capacitado e livre para questionar outras coisas e seguir esse eterno processo de autoconhecimento expressado por meio da arte. Eu sinto que tenho o pleno controle do meu tempo e é o que todas as pessoas deveriam ter. Esse projeto veio me iluminar e iluminar outras pessoas”, finaliza.

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Com mais de 70 exposições internacionais, Luca tem seu trabalho em coleções do MAC – Niterói, do Parque de Esculturas ALMA (Quinta Pedras de Rio), em Portugal, do Parque de Esculturas da Fundação Pablo Atchugarry e do Centro Cultural KAVLIN, ambos em Punta del Este, do Museu de Arte Contemporânea de Sorocaba, do Centro de Arte Contemporânea Piramidón, em Barcelona, entre outros.

E uma das conquistas mais importantes da carreira do artista foi ter se tornado, recenemente, o mais jovem expositor da renomada Dan Galeria (São Paulo, Londres e Portugal), galeria com quase 60 anos de história e com enorme trajetória dentro do mercado de arte mundial. “É uma oportunidade única estar ao lado de nomes como Tony Cragg, Anish Kapoor, Jong Oh, Denise Milan e vários artistas que fazem parte das minhas referências. Sem dúvida, é quase um sonho, uma coisa que eu esperava algum dia alcançar, mas não pensava que seria tão cedo”, comenta.

O novo projeto NEXUS, uma grande instalação que conta com 99 esculturas, deverá ser inaugurado no espaço expositivo da DAN Galeria, na capital paulista, em 2021.