Em outubro de 2017, astrônomos detectaram um momento histórico nos céus, identificado pela denominação GW170817: a primeira vez em que se flagrou a colisão de duas estrelas de nêutrons, com emissão de ondas gravitacionais e luz eletromagnética. Agora, uma equipe internacional liderada pela Northwestern University (EUA) afirmou em estudo que conseguiu desvendar o que ocorreu em seguida a partir da pós-luminescência do evento.

Os resultados desse último capítulo estão descritos em um artigo que será publicado na revista “The Astrophysical Journal Letters”. Por enquanto, ele está disponível no servidor de pré-impressão arXiv.

LEIA TAMBÉM: Enigma verde na galáxia dos Fogos de Artifício

“Esta é a mais profunda exposição que já tivemos desse evento em luz visível”, afirmou a pesquisadora principal, Wen-fai Fong. “Quanto mais profunda a imagem, mais informações podemos obter.”

Quando colidiram, as estrelas de nêutrons emitiram uma kilonova – luz mil vezes mais brilhante que uma nova (explosão nuclear cataclísmica em uma estrela) clássica. Essa luz resulta da formação de elementos pesados após a fusão. Mas seu brilho dificultava a medição do brilho posterior.

Brilho fraco

“Para vermos o brilho posterior, a kilonova teve de sair do caminho”, disse Fong. “Certamente, cerca de 100 dias após a fusão, a kilonova havia desaparecido e o brilho posterior assumiu o controle. Mas o brilho posterior estava muito fraco, deixando para os telescópios mais sensíveis capturá-lo.”

Os cientistas recorreram então ao Telescópio Espacial Hubble, da Nasa, que detectou a luz visível em dezembro de 2017 e revisitou o local mais 10 vezes durante um ano e meio. No fim de março de 2019, a equipe de Fong obteve ali a imagem final.

Durante mais de sete horas, o Hubble gravou imagens de onde a fusão ocorreu. Depois de 584 dias da ocorrência do evento, a luz visível que emanava da fusão enfim desapareceu.

Na sequência, Fong e sua equipe removeram o brilho da galáxia circundante, a fim de isolar o brilho extremamente fraco do evento. “Para medir com precisão a luz da pós-luminescência, você precisa tirar toda a luz”, disse o segundo autor do estudo, Peter Blanchard, também da Northwestern. “O maior culpado é a contaminação por luz da galáxia, que é extremamente complicada em sua estrutura.”

Luz subtraída

A equipe sobrepôs sua imagem profunda do Hubble em cada uma das 10 imagens de pós-luminescência e depois usou um algoritmo para subtrair minuciosamente toda a luz da imagem do Hubble das imagens anteriores de pós-luminescência.

A série temporal final de imagens resultante mostra o fraco brilho posterior sem contaminação da galáxia de fundo. Completamente alinhada com as previsões do modelo, é a série temporal de imagens mais precisa da pós-luminescência de luz visível do GW170817 produzida até hoje.

“A evolução do brilho combina perfeitamente com nossos modelos teóricos de jatos”, disse Fong. “Também concorda perfeitamente com o que o rádio e os raios X estão nos dizendo.”

Entre outros dados que os cientistas extraíram das imagens está o fato de que a área ao redor da fusão não era densamente povoada por aglomerados de estrelas. “Estudos anteriores sugeriram que pares de nêutrons podem se formar e se fundir no ambiente denso de um aglomerado globular”, afirmou Fong. “Nossas observações mostram que definitivamente não é o caso dessa fusão de estrelas de nêutrons.”