As regras de contato e de isolamento durante a pandemia de covid-19 causaram em muitas pessoas mudanças de humor, irritabilidade e depressão. Uma epidemiologista explica como lidar com esses sintomas

Para a epidemiologista Elise Paus, de Londres, buscar ajuda contra a depressão nas mídias sociais é positivo, mas elas não são o instrumento adequado quando se quer evitar encarar os problemas psicológicos decorrentes do isolamento causado pelas restrições sociais durante a pandemia.

Em entrevista à Deutsche Welle, ela diz esperar que o momento sirva de oportunidade a legisladores e à população em geral a darem mais atenção à saúde mental.

Ao enumerar os clássicos sinais de abalo da saúde mental, ela assinala como é importante que familiares, colegas de trabalho e amigos reconheçam os sintomas que identificam a depressão, ou que podem levar a ela, e assim possam prestar ajuda. Por fim, ela revela seus segredos para enfrentar a pressão da pandemia sobre as pessoas.

Deutsche Welle: Algumas pessoas com depressão buscaram as mídias sociais como ferramenta para se automedicarem. Você considera essa uma boa alternativa?

Elise Paul: Isso certamente depende do uso que as pessoas fazem das mídias sociais. Se elas as estão usando para revelar dificuldades e buscar apoio, pode ser uma coisa positiva, mas se elas as usam para evitar lidar com seus problemas, então pode ser negativo.

Também descobrimos que a procura exagerada por notícias e a busca de informações sobre a covid-19 estava relacionada a declínios na saúde mental, portanto, realmente depende de como você está usando as mídias sociais.

Até que ponto os terapeutas estão realmente preparados para lidar com os problemas adicionais que seus pacientes estão enfrentando por causa da pandemia?

É difícil dizer. Como epidemiologista, não posso falar em nome dos terapeutas, mas diria que eles também são seres humanos. Mesmo que todos nós tenhamos sido impactados de maneiras diferentes, passamos todos juntos pela pandemia no último ano e meio e haverá uma necessidade maior de terapia.

Espero que esta seja uma oportunidade para que os governos, os formuladores de políticas e até mesmo a população em geral deem mais atenção à saúde mental e orientem mais recursos para essa direção.

Muitas pessoas estão obviamente sentindo o peso da pandemia. Isso não pode ser comparado a uma verdadeira depressão clínica, séria e grave. Pessoas mal-humoradas estão apenas passando por uma má fase ou existe o perigo de que elas realmente caiam em depressão?

É importante considerar como as mudanças de humor e a irritabilidade afetam a vida de uma pessoa. Se esses sintomas estão tornando realmente difícil realizar atividades, coisas que você precisa fazer, se isso está impactando em seu trabalho, seu relacionamento com familiares e amigos, então é importante buscar ajuda.

Quer você sinta ou não que está atingindo algum limiar clínico, é importante considerar como isso está impactando na sua vida.

Como se pode diferenciar, mesmo quando se está diante de alguém desconhecido, e dizer: “Ok, esta pessoa está realmente em perigo, ela não está apenas tendo um dia ruim, mas está realmente doente”?

Um número excessivo de dias de afastamento do trabalho são certamente um sinal. Outro sinal que amigos ou familiares podem notar são comportamentos de fuga. Algumas pessoas tendem a se isolar e mostram alguns dos sintomas clássicos da depressão, como dormir demais, energia reduzida, letargia.

Outras pessoas podem ficar irritáveis, agressivas, raivosas. Portanto, é importante reconhecer que as manifestações se diferenciam de pessoa a pessoa.

Você disse que hoje em dia há uma maior consciência sobre a doença mental. Isso poderia realmente ser um lado positivo da pandemia?

Eu acho que é definitivamente uma coisa boa, espero que isso venha a ser resultado desta pandemia. É simplesmente inédito que tenhamos ficado isolados das coisas que gostamos. Temos a oportunidade de pensar sobre a diferença entre assistir a um concerto ao vivo ou vê-lo online. Como é estar em uma sala com cinco de seus amigos em vez de passear em um dia de chuva com um de seus amigos.

Ou seja, tivemos realmente a oportunidade de refletir e, como pesquisadores, de estudar o que é necessário para manter a saúde mental no dia a dia, independente de termos ou não caído em depressão.

Como você lida com a pressão da pandemia?

Da melhor maneira que posso. Tento fazer todos os dias coisas que mantêm meu corpo e minha mente capazes de lidar com ela. Bebo muita água, tento ir para a cama todas as noites na mesma hora e acordar de manhã sempre no mesmo horário e me alimento de forma saudável. Eu controlo a ingestão de cafeína e álcool, faço exercícios todos os dias e também medito todos os dias.

Tenho aplicativos de meditação em meu celular. Mesmo que sejam apenas cinco minutos pela manhã, isso realmente me ajuda a interiorizar uma voz calma e reconfortante.

Elise Paus é epidemiologista com foco em estatística, ciência comportamental e saúde no Instituto de Epidemiologia e Saúde da University College London (UCL).