A estreia de A Chegada, filme do badalado diretor canadense Dennis Villeneuve estrelado por Amy Adams (candidata a uma indicação ao Oscar de melhor atriz pelo papel), pôs na ordem do dia uma questão básica para um possível contato com uma civilização alienígena: como nos comunicaremos com ela? Do lado do filme – baseado no conto “A História da Sua Vida”, do escritor americano Ted Chiang –, houve cuidados rigorosos para tornar a proposta verossímil.

Os produtores chamaram Morgan Sonderegger, professor de linguística da Universidade McGill, de Montreal (Canadá), para desenvolver a linguagem oral dos extraterrestres, que mistura elementos como cantos de baleias e miados de gatos. Os cerca de cem símbolos circulares do idioma dos ETs mostrados no filme foram elaborados pelo desenhista de produção Patrice Vermette e sua esposa, a artista Martine Bertrand, e receberam contribuições de um escritor de software, Stephen Wolfram, e de seu filho, Christopher, além de outra professora de linguística da McGill, Jessica Coon.

A ajuda de Jessica foi essencial para tornar crível a jornada da linguista Louise Banks, interpretada por Amy. “A forma pela qual um linguista abordaria isso é a mesma pela qual ele buscaria entender a gramática de um idioma humano, que é buscar padrões”, diz Jessica. “O que o filme apresenta de forma exata é tanto a natureza interativa quanto a noção de que você realmente tem de começar de baixo.”

Na foto, os tentáculos de um dos extraterrestres reproduzido no filme
Na foto, os tentáculos de um dos extraterrestres reproduzido no filme

No sentido inverso, aparentemente não há um plano definido se ETs vierem conversar conosco, avalia o astrônomo Seth Shostak, que lidera os esforços para detectar sinais de rádio de civilizações alienígenas no Instituto Seti (abreviatura em inglês de Busca por Inteligência Extraterrestre, projeto científico não governamental que procura vida inteligente no espaço) em Mountain View, na Califórnia. “Existem alguns protocolos, mas acho que essa é uma denominação infeliz, e isso os faz parecer mais importantes do que são”, afirma.

Segundo o escritor e cientista americano Robert Freitas relata no livro Xenology: An Introduction to the Scientific Study of Extraterrestrial Life, Intelligence and Civilization, publicado em 1979, a primeira tentativa de a humanidade adotar um padrão para esse tipo de ocorrência teria ocorrido nos anos 1950: o plano “Sete Fases para Contatar”, descrito num livro de 1967 do ufólogo americano Frank Edwards, delinearia possíveis respostas militares dos Estados Unidos a um contato de extraterrestres.

Protocolos

Não se sabe se o plano de fato existiu. O que é conhecido são os protocolos citados por Shostak, preparados nos anos 1980 para ajudar cientistas americanos e soviéticos a partilhar informações sobre sinais de mensagens alienígenas captadas por radiotelescópios. Na década seguinte, o próprio Shostak comandou um comitê da Academia Internacional de Astronáutica que revisou os chamados “protocolos pós-detecção” para pesquisadores que flagrassem eventuais transmissões extraterrestres.

Para o astrônomo, contudo, esses protocolos são apenas diretrizes para governos e cientistas, e não propõem uma estratégia global para o tema. “Eles dizem: ‘Se você captar um sinal, verifique-o (…), conte a todos (…) e não transmita quaisquer respostas sem consulta internacional’, seja lá o que isso signifique”, diz Shostak. “Mas isso é tudo que os protocolos dizem, e eles não têm força de lei. A ONU tirou uma cópia dos primeiros protocolos e os engavetou em um arquivo em algum lugar (…).”

Se existe algo além disso no caso de um contato alienígena, o astrônomo confessa desconhecer. “Em 1997”, conta Shostak, “captamos um sinal que pareceu muito promissor na maior parte daquele dia. Fiquei esperando que os ‘Homens de Preto’ viessem – não vieram. Fiquei esperando por um telefonema do Pentágono, da Casa­ Branca. Não ligaram. Mas o (jornal) The New York Times ligou.”

E o que se falaria num primeiro contato? “Estive em várias conferências nas quais as pessoas discutem se deveríamos contar (aos ETs) todas as coisas ruins sobre a humanidade, ou apenas as coisas boas”, conta Shostak. “Para mim, isso seria como os aborígines da Austrália vendo o capitão Cook apontar no horizonte com seu navio e dizendo: ‘Vamos fazer algumas conferências para discutir sobre o que vamos falar com esses sujeitos e que língua vamos usar’ – [mas] isso não importa.”