Concepção artística do Tlatolophus galorum. Crédito: Luis V. Rey/Cretaceous Research (2021). DOI: 10.1016/j.cretres.2021.104884
Concepção artística do Tlatolophus galorum. Crédito: Luis V. Rey/Cretaceous Research (2021). DOI: 10.1016/j.cretres.2021.104884

Cerca de 72 ou 73 milhões de anos atrás, um dinossauro herbívoro colossal morreu no atual norte do México no que deve ter sido um corpo d’água com abundância de sedimentos. Rapidamente coberto pela terra, seu corpo ficou preservado ao longo do tempo, até paleontólogos do Instituto Nacional de Antropologia e História (Inah), instituição do Ministério da Cultura mexicano, e da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam) conseguirem recuperá-lo e estudá-lo. Em 2021, eles constataram que os restos pertencem a uma nova espécie: Tlatolophus galorum.

O achado, publicado na revista Cretaceous Research, deriva de um projeto multidisciplinar, com a participação do Ministério da Cultura, através do Inah, que em 2013 anunciou a recuperação com sucesso da cauda articulada de um dinossauro em um sítio no município de General Cepeda, estado de Coahuila.

Embora a prioridade inicial fosse resgatar o esqueleto com rapidez, mas com rigor, visto que algumas vértebras se projetavam da superfície e ficavam expostas à chuva e à erosão, as pistas foram dadas, observaram Felisa Aguilar Arellano, pesquisadora do Inah Coahuila Center, e o dr. Ángel Alejandro Ramírez Velasco, do Instituto de Geologia da Unam.

Peças encaixadas

“Embora tivéssemos perdido a esperança de encontrar o topo do espécime, assim que recuperamos a cauda, ​​continuamos a cavar sob onde ela estava localizada. A surpresa foi que começamos a encontrar ossos como o fêmur, a escápula e outros elementos”, afirmou Ramírez Velasco.

O pesquisador, coautor do artigo junto com Felisa Aguilar, René Hernández Rivera, José Luis Gudiño Maussán, Marisol Lara Rodríguez e Jesús Alvarado Ortega, observou que entre esses ossos apareceu um muito alongado e em forma de gota. “Na época, eu disse que fazia parte da pelve, mas outro participante do projeto, José López Espinoza, comentou que era a cabeça do animal.”

Depois da coleta, limpeza e análise de outros 34 fragmentos ósseos, as peças se encaixaram. Os paleontólogos tinham, com efeito, a crista do dinossauro, com 1,32 metro de comprimento, além de outras partes do crânio: mandíbulas e maxilares, palato e até mesmo o segmento conhecido como neurocrânio, onde ficava o cérebro.

Dadas as excepcionais condições de conservação do crânio (quase 80% da estrutura óssea está preservada), foi possível comparar o espécime com outras espécies de hadrossauros conhecidas na região, como Velafrons coahuilensis.

O exame mostrou que a crista e o nariz eram distintos dos Velafrons e mais semelhantes ao que é visto em outro tipo de hadrossauros: os parassaurolofinos. As diferenças não paravam por aí: a crista do espécime de Coahuila, em forma de gota, era até oposta à crista tubular do Parasaurolophus, a espécie mais conhecida de parassaurolofo, que habitou os atuais territórios do Novo México e Utah (EUA), bem como Alberta (Canadá), e que foi retratado em filmes como Jurassic Park.

Forma de vírgula

“Depois de todas essas descobertas, ficamos convencidos de que estávamos diante de um novo gênero e espécie de dinossauro com crista”, disse Felisa Aguilar.

O nome Tlatolophus galorum é uma homenagem múltipla feita por investigadores do Inah e da Unam. Por outro lado, o gênero Tlatolophus deriva da palavra indígena nahuatl tlahtolli (“palavra” ou “declaração”) e do grego lophus (“crista”).

A composição é adequada não só porque a crista desse animal lembra uma vírgula em sua forma – símbolo utilizado pelos povos mesoamericanos para representar a ação comunicativa e o conhecimento em si mesmo em códices.  Em todos os lambeossaurinos a crista possuía função comunicativa, pois, tendo numerosas passagens internas e conexões com o nariz e a traqueia, funcionaria como uma trombeta integrada.

“Sabemos que eles tinham ouvidos capazes de receber sons de baixa frequência. Então, eles deviam ser dinossauros pacíficos, mas falantes. Alguns paleontólogos teorizam que emitiam sons altos para espantar os carnívoros ou para reprodução, o que sugere que as cristas tinham cores vivas”, explicou Ángel Ramírez.

Quanto ao nome da espécie, galorum, Felisa Aguilar explicou que se trata de uma homenagem a pessoas: ga, por um lado, ao filantropo Jesús Garza Arocha, que era o elo da comunidade com os investigadores do Inah e da Unam; e Lorum homenageia o apoio da família López, que colaborou com os paleontólogos fornecendo hospedagem, alimentação e outras facilidades durante as temporadas de campo.