Negociações entre Moscou e potências ocidentais não trazem alívio ao conflito envolvendo Kiev. Especialistas preveem uma escalada promovida por Moscou, que aposta em esticar a corda cada vez mais.A reunião da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) desta quinta-feira (13/01), em Viena, marcou o fim da primeira rodada de negociações entre a Rússia e o Ocidente.

A semana começou com uma reunião bilateral entre Washington e Moscou, em Genebra, seguida de conversas com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan )em Bruxelas. Antes, no fim de 2021, houvera aberturas diplomáticas inesperadas por parte da Rússia.

As agendas giraram em torno da política de segurança na Europa e da potencial adesão à Otan de ex-Estados soviéticos, como Ucrânia e Geórgia. Em 2008, a Otan ofereceu a ambos a perspectiva de ingressar no bloco, sem, no entanto, fixar uma data. A Rússia ameaçou recorrer a “medidas técnico-militares”, nas palavras do presidente Vladimir Putin, se o Ocidente continuar nesse caminho.

Mostrando os músculos

Uma semana de negociações não levou à aproximação das partes, nem reduziu as tensões na crise com Kiev: desde novembro, a Rússia vem reunindo tropas em larga escala nas fronteiras com a Ucrânia. Os EUA e a Otan rejeitaram a exigência de Moscou de ter direito a veto em relação à adesão de novos membros à aliança militar. No entanto, ainda levará alguns dias até Washington enviar a Moscou sua resposta oficial por escrito.

Outras conversas não estão planejadas no momento. O Kremlin anunciou repetidamente que não está interessado em discussões prolongadas e quer resultados rápidos, mas não foi estabelecido um prazo.

De qualquer forma, foi uma semana histórica. Nunca houve tantos encontros, de tantos tipos diferentes, em tão curto espaço de tempo, entre Moscou e o Ocidente. A Rússia também vem aumentando sua aposta retórica, com seus principais diplomatas comparando o conflito atual à crise de Cuba.

No início das negociações, Moscou anunciou novos exercícios militares na fronteira com a Ucrânia. Os EUA reagiram elaborando um projeto de lei que imporia sanções pessoais ao presidente Vladimir Putin. O projeto de lei – apresentado em Washington enquanto as negociações estavam em andamento em Bruxelas – seria, dizem os EUA, aplicado no caso de uma escalada da situação no país vizinho.

Diplomacia russa estridente

Mesmo antes do início das negociações, o tom estridente e grosseiro da diplomacia russa impressionava. O chefe da delegação russa em Genebra, Sergey Ryabkov, exortou a Otan “a fazer as malas e retirar-se para as linhas de 1997”. Naquele ano, a Polônia, República Tcheca e Hungria, ex-Estados do Pacto de Varsóvia, receberam pela primeira vez a perspectiva de adesão à Otan, seguidas por mais países do Leste Europeu nos anos seguintes.

A Rússia pediu a retirada das tropas da Otan e dos sistemas de armas estacionados na área depois de 1997. Mais tarde, fontes próximas aos negociadores russos disseram que Moscou “mastigou” as coisas com Washington, e reclamaram da “mentalidade estreita” dos EUA.

Essa é realmente a linguagem de quem quer conquistar seu adversário? Será um sinal de que Moscou nunca acreditou que as negociações dariam frutos?

“O ultimato que a Rússia deu aos Estados Unidos e ao Ocidente não tinha perspectiva de sucesso desde o início”, comentou o ex-vice-ministro do Exterior da Rússia, Georgiy Kunadze, à DW. A retórica grosseira de Moscou era mais para o público russo. Por outro lado, palavras duras não significam que o tiroteio está para começar, ressalvou.

Rüdiger von Fritsch, o ex-embaixador alemão em Moscou, vê as coisas de forma semelhante. “O que estamos vendo atualmente é uma linguagem forte como parte de uma demonstração muito agressiva. A Rússia está tentando elevar ao máximo a pressão para mudar unilateralmente a ordem de paz europeia e suas regras, acordadas em conjunto, às custas de terceiros.”

Ele não descarta totalmente que a situação se acirre – também à luz das “enormes expectativas na frente doméstica russa”, que são “preocupantes”. Para Von Fritsch, a liderança russa deveria considerar como se livrar dessa situação. Ele não acredita, entretanto, que essas palavras fortes sejam necessariamente seguidas por um conflito militar. “Não precisa ver dessa forma, isso já faz parte da performance toda.”

Kiev quer mais armas do Ocidente

Especialistas em assuntos ucranianos têm uma outra visão da situação, e contam que haverá um aumento da agressão, após o fracasso de fato das negociações entre Moscou e o Ocidente.

“Meu prognóstico é que o próximo passo da Rússia será uma escalada”, diz o analista de política externa Jevhen Mahda, segundo quem Kiev deve estar preparado para o pior. O ex-ministro do Exterior da Ucrânia Volodymyr Ohrysko pediu ao Ocidente que forneça armas adicionais a seu país.

E que sinais Moscou está enviando? Alexander Grushko, chefe da delegação russa nas negociações com a Otan, ofereceu a perspectiva de uma desescalada apenas sob certas condições: implementação completa do Acordo de Minsk, fim do fornecimento de armas e dos programas de treinamento para o exército ucraniano.

Observadores em Kiev acreditam ser bastante improvável que a Ucrânia e o Ocidente aceitem essas demandas. O especialista em política externa Fyodor Lukyanov, que é próximo do Kremlin, descreveu de forma pessimista, no jornal oficial Rossiyskaya Gazeta, como a situação poderá se desenvolver.

Ele descreve as diferenças como “aparentemente irreconciliáveis”: a lacuna de percepção entre a Rússia e o Ocidente é tão grande, que uma “nova e perigosa escalada seria necessária ou poderia ocorrer”, para “forçar” as partes a novas formas de acordo. Para Lukyanov, contudo, não está ainda claro o que exatamente acontecerá.