Uma pesquisa chinesa publicada em março deste ano está causando polêmica por ter inserido genes humanos em cérebros de macacos. Com isso, eles esperavam obter uma melhor compreensão de como os cérebros humanos se desenvolvem. Mas eles também acabaram desencadeando um debate ético sobre pesquisas, que alguns críticos dizem que confundem a linha entre humanos e animais.

Os pesquisadores por trás do estudo, publicado na revista “National Science Review”, dizem que macacos geneticamente modificados podem ajudar a avançar a compreensão do desenvolvimento do cérebro, o que poderia levar a novos tratamentos para distúrbios do desenvolvimento.

Mas uma reportagem da NBC News mostra que críticos da pesquisa – incluindo um cientista que contribuiu para o estudo -, argumentam que os ganhos científicos não justificam a criação de macacos que poderiam acabar com uma inteligência mais humanitária.

O cientista da computação Martin Styner, da Universidade da Carolina do Norte (EUA) disse à NBC News que, do ponto de vista ético, essa pesquisa não deveria ser feita. Ele colaborou com o estudo, mas afirmou que mudou de ideia mais tarde.

A pesquisa surgiu de uma pergunta: como o nosso DNA delineia o modelo dos cérebros dos humanos? Os cientistas, membros do Instituto de Zoologia Kunming da Academia Chinesa de Ciências, queriam entender especificamente o papel de um gene, o MCPH1, no desenvolvimento do cérebro humano.

Bebês com cópias defeituosas desse gene muitas vezes nascem com microcefalia. E como as versões humana e de macaco do gene MCPH1 são ligeiramente diferentes, os cientistas acham que esse gene poderia ser parcialmente responsável pela alta inteligência dos humanos.

No estudo, os cientistas adicionaram a versão humana da MCPH1 a ​​11 embriões de macacos rhesus, que compartilham cerca de 93% de seu DNA com humanos. Os embriões transgênicos foram então implantados no útero de fêmeas de macacos.

Dois embriões foram perdidos por aborto espontâneo. Três foram eutanasiados antes do nascimento, para que os cientistas pudessem examinar seus cérebros. Dos seis macacos que nasceram, um morreu cerca de dois meses depois. Os outros cinco receberam testes de memória e tiveram seus cérebros examinados em uma máquina de ressonância magnética em intervalos regulares.

Os macacos transgênicos se comportavam de maneira muito semelhante às suas contrapartes inalteradas, e seus cérebros eram mais ou menos do mesmo tamanho. Mas suas células cerebrais demoraram mais para se desenvolver do que as dos macacos inalterados. Os pesquisadores interpretaram isso como um sinal de neotonia, a maturação super lenta do cérebro humano que se acredita estar ligada à alta inteligência de nossa espécie.

Eles também superaram os macacos inalterados nos testes de memória e tiveram tempos de reação mais rápidos.

Os resultados levaram alguns a se perguntar se os macacos MCPH1 estavam um passo mais perto de algo como a consciência.

Para Arthur Caplan, bioeticista da Escola de Medicina da Universidade de Nova York, nem todos os experimentos híbridos genéticos animais/humanos são antiéticos, mas “inserir genes humanos em cérebros de macacos é um assunto diferente.” Como Styner, Caplan achava que o estudo corria o risco de criar algo que fosse nem humano, nem macaco.

Mas Megan Dennis, bioquímica e geneticista da Universidade da Califórnia, disse que a inserção de um gene humano provavelmente não é suficiente para criar macacos que pensam como humanos.

“Os macacos Rhesus estão longe o suficiente evolutivamente dos humanos. Algumas adições de genes não criarão um cenário de ‘Planeta dos Macacos'”, disse ela, referindo-se aos temores de que os macacos transgênicos possam ter uma consciência parecida com a dos humanos.

Macacos rhesus modelo útil para o estudo do cérebro humano porque eles se assemelham muito mais aos cérebros humanos do que os de outros animais de pesquisa comuns, como os ratos. E com 25 milhões de anos de evolução separando-os dos humanos, as pesquisas com eles têm menos riscos de serem consideradas antiéticas do que se fossem feitas com chimpanzés e outros grandes símios, que compartilham com os humanos uma percentagem maior de seus genomas.

Nos Estados Unidos, o Instituto Nacional de Saúde (NIH, na sigla em inglês) financia pesquisas envolvendo a introdução de genes humanos em animais. Mas fazer pesquisa é mais barato na China do que nos EUA, tornando o país um foco de pesquisa genética em macacos.

Outro cientista envolvido no novo estudo, Bing Su, do Instituto de Zoologia de Kunming, disse à NBC News que o comitê de ética do instituto aprovou o estudo e que os macacos foram tratados de acordo com os padrões internacionais. Ele acrescentou que, além do ritmo de desenvolvimento do cérebro, os macacos transgênicos não eram muito diferentes de suas contrapartes inalteradas.

“Na teoria e na realidade, não há ‘humanidade’ observada nos macacos transgênicos, uma vez que apenas um gene foi alterado entre dezenas de milhões de diferenças genéticas entre humanos e macacos”, disse.

Quanto às apreensões de seu co-autor, Su disse que Styner nunca expressou nenhuma preocupação a ele pessoalmente, e que quando foi informado que sua pesquisa havia sido publicada, Styner mandou parabéns para a equipe.

Por sua vez, Styner disse que foi depois disso que mudou de ideia sobre a ética do experimento. “Esta é a primeira vez que me arrependo de enviar um e-mail de felicitações”, disse.

A reportagem termina afirmando que os cinco macacos sobreviventes estão com boa saúde.