A quantidade de metano na atmosfera da Terra continua a aumentar, e em ritmo acelerado. Essa é a conclusão de dois novos estudos publicados em 14 de julho nos periódicos “Earth System Science Data” e “Environmental Research Letters” por pesquisadores do Global Carbon Project, uma iniciativa liderada pelo cientista Rob Jackson, da Universidade Stanford (EUA).

Gás incolor e inodoro, o metano é 28 vezes mais poderoso que o dióxido de carbono (CO2). Ele retém o calor por um período de 100 anos.

Os pesquisadores sintetizaram todos os dados conhecidos sobre metano a partir de inventários de emissões, medições atmosféricas e modelos para montar um “orçamento de metano” global que detalha quais processos adicionam o gás à atmosfera e quais o removem. Eles descobriram que as emissões globais desse gás de efeito estufa totalizaram 576 milhões de toneladas por ano na década de 2008 a 2017. É um aumento de 9% em comparação com a década anterior.

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Trata-se de 50 milhões de toneladas adicionais por ano, desde o início dos anos 2000, quando as concentrações de metano na atmosfera eram relativamente estáveis. Em termos de potencial de aquecimento, acrescentar esse metano à atmosfera desde 2000 equivale a pôr mais 350 milhões de carros nas estradas do mundo. Ou a dobrar as emissões totais da Alemanha ou da França.

Atividades humanas

O rápido crescimento se baseia no aumento da concentração atmosférica do gás que vem ocorrendo há mais de um século. (As emissões se estabilizaram brevemente entre 2000 e 2006.) As concentrações de metano agora excedem 1.875 partes por bilhão. Isso equivale a cerca de 2,5 vezes do que havia na atmosfera na década de 1850. Os cientistas climáticos estimam que o gás responda por cerca de 25% do aquecimento global ocorrido desde então.

“O aumento foi impulsionado principalmente pelas atividades humanas – especialmente agricultura e combustíveis fósseis”, explicou Benjamin Poulter, cientista da Nasa e coordenador das estimativas de emissões de metano em áreas úmidas para o Global Carbon Project. “As atividades específicas que vinculamos aos maiores aumentos foram a criação de gado, a mineração de carvão, a eliminação de resíduos em aterros e a produção de gás e petróleo.”

Durante os anos estudados, as áreas úmidas contribuíram com 30% das emissões globais de metano. As atividades de petróleo, gás e carvão foram responsáveis ​​por 20%. A agricultura, incluindo a fermentação entérica e o gerenciamento de esterco, representou 24% das emissões, e os aterros sanitários, 11%. Sessenta e quatro por cento das emissões vieram de regiões tropicais da América do Sul, Ásia e África. As regiões temperadas representaram 32%, e o Ártico contribuiu com 4%.

Queimadas amazônicas

“Importante salientar nestes dois estudos que as atividades agropecuárias são responsáveis por 66% das emissões de metano, e aumentaram 11% nos últimos 15 anos”, destacou o físico da USP Paulo Artaxo. Segundo ele, a emissão de metano por mudanças no uso da terra pode ser ainda maior, já que algumas fontes importantes nesse tema não puderam ser contabilizadas pelo novo levantamento. “Faltam ainda estudos sobre a quantificação das emissões por queimadas na Amazônia. A gente sabe que pode ser grande, mas ainda não existem artigos científicos que embasem uma estimativa de emissões de metano por queima de biomassa.”

“As emissões de metano provenientes de bovinos e outros ruminantes são quase tão grandes quanto as da indústria de combustíveis fósseis”, disse Rob Jackson, professor de Ciência dos Sistemas Terrestres na Escola de Ciências da Terra, Energia e Ciências Ambientais de Stanford. “As pessoas brincam sobre arrotos de vacas sem perceber o tamanho do problema.”

As emissões de carbono despencaram com a interrupção de setores da indústria e de transporte causada pela pandemia de covid-19. No entanto, é pouco provável que o resultado se repita com o metano. “Não há chance de as emissões de metano caírem tanto quanto as emissões de dióxido de carbono por causa do vírus. Ainda estamos aquecendo nossas casas e edifícios com combustível fóssil, e a agricultura continua crescendo”, disse Jackson.

Lago de água doce em Fairbanks (Alasca) visitado pelos pesquisadores do ABoVE em 2016. O lago mostrou sinais de degelo do permafrost abaixo da superfície, incluindo “árvores bêbadas” que tombavam à medida que o solo se deslocava em torno de suas raízes. Crédito: Nasa/ABoVE
Preocupação no Ártico

Ecossistemas de alta latitude são particularmente vulneráveis ​​às mudanças climáticas. Grandes quantidades de carbono são armazenadas em solos congelados (permafrost) e na vegetação florestal do Ártico. À medida que derrete, o solo alagado torna-se um ambiente ideal para a produção de metano. “No entanto, ainda precisamos detectar emissões anormais de metano em regiões de latitude mais alta”, disse Benjamin Poulter, “apesar do degelo do permafrost e da temperatura recorde do ar ano após ano”.

Há evidências de que quantidades significativas de carbono do degelo do permafrost podem estar entrando nos rios como carbono dissolvido, em vez de serem liberadas para a atmosfera como metano. Além disso, o aquecimento em alta latitude pode estar secando os ecossistemas do Ártico. Isso faz com que o carbono deixe o solo como dióxido de carbono em vez de metano.

O Estudo de Vulnerabilidade no Ecossistema Boreal Ártico da Nasa (ABoVE, na sigla em inglês) é um grande esforço para saber mais sobre como as mudanças climáticas estão afetando as emissões de metano no Ártico. Por exemplo, os pesquisadores do ABoVE recentemente fizeram observações aéreas hiperespectrais no ar que confirmaram a existência de milhões de fontes de metano em torno de pequenos lagos e lagoas no Alasca e no oeste do Canadá.