Enquanto dão seus últimos suspiros de vida, as estrelas moribundas gentilmente jogam suas cinzas no cosmos através das magníficas nebulosas planetárias. Essas cinzas, espalhadas por ventos estelares, são enriquecidas com muitos elementos químicos diferentes, incluindo carbono. Um estudo internacional publicado na revista “Nature Astronomy” mostra que os suspiros finais dessas estrelas moribundas, chamadas anãs brancas, lançam luz sobre a origem do carbono na Via Láctea.

“As descobertas colocam novas e rigorosas restrições sobre como e quando o carbono foi produzido pelas estrelas da nossa galáxia, terminando na matéria-prima da qual o Sol e seu sistema planetário foram formados 4,6 bilhões de anos atrás”, disse Jeffrey Cummings, cientista pesquisador associado do Departamento de Física e Astronomia da Universidade Johns Hopkins (EUA) e um dos autores do artigo.

A origem do carbono – um elemento essencial à vida na Terra – na Via Láctea ainda é debatida entre os astrofísicos. Alguns são a favor de estrelas de baixa massa cujos envoltórios ricos em carbono foram levados para longe por ventos estelares e se tornaram anãs brancas. Outros colocam o principal local da síntese de carbono nos ventos de estrelas massivas que posteriormente explodiram como supernovas.

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Relação crescente

Usando dados do Observatório Keck, perto do cume do vulcão Mauna Kea, no Havaí, coletados entre agosto e setembro de 2018, os pesquisadores analisaram anãs brancas pertencentes aos aglomerados estelares abertos da Via Láctea. Esses aglomerados são grupos de até alguns milhares de estrelas mantidos juntos por atração gravitacional mútua.

A partir dessa análise, a equipe de pesquisa mediu as massas das anãs brancas e, usando a teoria da evolução estelar, também calculou suas massas ao nascer.

A conexão entre as massas de nascimento e as massas finais de anãs brancas é chamada de relação de massa inicial-final, um diagnóstico fundamental em astrofísica que contém todo o ciclo de vida das estrelas. Pesquisas anteriores sempre encontraram uma relação linear crescente: quanto mais maciça a estrela no nascimento, mais maciça a anã branca chegava à sua morte.

Mas quando Cummings e seus colegas calcularam a relação de massa inicial-final, ficaram chocados ao descobrir que as anãs brancas desse grupo de aglomerados abertos tinham massas maiores do que os astrofísicos acreditavam anteriormente. Segundo eles, essa descoberta quebrou a tendência linear que outros estudos sempre encontraram. Em outras palavras, as estrelas nascidas há cerca de um bilhão de anos na Via Láctea não produziram anãs brancas com cerca de 0,60-0,65 massa solar, como se pensava, mas morreram deixando para trás restos mais maciços de 0,7 a 0,75 massa solar.

Assinatura do carbono

Os pesquisadores dizem que essa diferença explica como o carbono de estrelas de baixa massa chegou à Via Láctea. Nas últimas fases de suas vidas, estrelas duas vezes mais massivas que o nosso Sol produziram novos átomos de carbono em seus interiores quentes, transportaram-nos para a superfície e finalmente os espalharam pelo ambiente interestelar circundante através de ventos estelares suaves. Os modelos estelares da equipe de pesquisa indicam que a remoção do manto externo rico em carbono ocorreu devagar o suficiente para permitir que os núcleos centrais dessas estrelas, as futuras anãs brancas, crescessem consideravelmente em massa.

A equipe calculou que as estrelas deveriam ter pelo menos 1,5 massa solar para espalhar suas cinzas ricas em carbono após a morte.

As descobertas, de acordo com Paola Marigo, professora de física e astronomia da Universidade de Pádua (Itália) e primeira autora do estudo, ajudam os cientistas a entender as propriedades das galáxias no universo. Ao combinarem as teorias da cosmologia e da evolução estelar, os pesquisadores esperam que estrelas brilhantes e ricas em carbono próximas à sua morte, como as progenitoras das anãs brancas analisadas nesse estudo, estejam atualmente contribuindo para a luz emitida por galáxias muito distantes. Essa luz, que carrega a assinatura do carbono recém-produzido, é rotineiramente coletada pelos grandes telescópios do espaço e da Terra para sondar a evolução das estruturas cósmicas. Portanto, esse novo entendimento de como o carbono é sintetizado nas estrelas também significa ter um intérprete mais confiável da luz do universo distante.