Você se lembra de onde estava quando ouviu pela primeira vez que dois aviões haviam colidido com as Torres Gêmeas de Nova York? Ou de onde beijou alguém pela primeira vez? Nossos cérebros estão conectados para reter informações relacionadas ao contexto em que ocorreram eventos altamente significativos. Esse mecanismo também é subjacente à dependência de drogas, e é a razão pela qual sair para um ambiente ou com pessoas associadas a lembranças do uso de drogas geralmente leva à recaída.

Como nosso cérebro cria essa forte associação, no entanto, é menos claro. Agora, uma nova pesquisa liderada pelo professor Ami Citri e pela aluna de doutorado Anna Terem, do Centro de Ciências do Cérebro Edmond e Lily Safra e do Instituto de Ciências da Vida Alexander Silberman, da Universidade Hebraica de Jerusalém (Israel), mostra que uma região cerebral relativamente obscura, conhecida como claustro, desempenha um papel significativo ao fazer essas conexões. Eles publicaram suas descobertas na revista “Current Biology”.

As descobertas dos pesquisadores se encaixam na ideia de “saliência de incentivo”, o processo que determina a conveniência de um estímulo neutro. Por exemplo, uma fachada de loja de doces se torna muito atraente para as crianças depois de repetidas associações com os deleites gratificantes que existem nela. Com o tempo, as crianças inconscientemente aprendem a “querer” ver o estímulo da loja, que é separado do “gosto” da recompensa real por doces.

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Preferência clara

Olhando mais de perto como o contexto se associa à cocaína, os pesquisadores encontraram um grupo de neurônios dentro do claustro que se iluminaram durante o uso de cocaína. Além disso, esses neurônios são fundamentais na formação de uma saliência de incentivo que vincula o contexto ao prazer da cocaína.

Para determinar quando e como o claustro participa da saliência de incentivo, Citri e sua equipe empregaram um teste de preferência condicionada de lugar (CPP, na sigla em inglês) em um grupo de camundongos de laboratório. Durante esse teste, os animais aprenderam a associar a recompensa ao contexto.

Os pesquisadores administraram cocaína aos camundongos e os colocaram em uma área com piso diferenciado (áspero) e padrões de parede (pontos), aqueles que um camundongo notaria, quando a droga entrou em ação. Depois de algumas vezes, quando colocados em uma aposento onde podiam optar por sair em uma região semelhante àquela associada com cocaína (pisos e paredes ásperas) ou em uma área neutra (piso liso e paredes listradas), os camundongos se reuniam rapidamente na área onde a droga fizera efeito.

Para testarem o envolvimento do claustro em como um contexto se associa a uma dada recompensa, Citri e sua equipe inibiram esses neurônios claustrais. Em seguida, observaram as mudanças no comportamento dos camundongos. Eles descobriram que a inibição desses neurônios também inibia as respostas comportamentais dos animais à cocaína. Isso significa que os camundongos não preferiam mais ficar no ambiente associado à cocaína. Por outro lado, a ativação desses neurônios – mesmo na ausência de cocaína – fez os camundongos desenvolverem preferência por esse contexto.

Memória codificada

A equipe também descobriu que a atividade do claustro não era necessária para recuperar a memória da cocaína. Como os camundongos foram colocados em um contexto associado à cocaína várias vezes para apreciar a droga, a memória desse contexto foi codificada. Com isso, a inibição do claustro não teve efeito sobre sua preferência pelo contexto associado à cocaína.

“Essas descobertas aumentaram nossa confiança de que o claustro é realmente essencial para a saliência de incentivo, aumentando a conscientização do camundongo para o contexto em que ele experimentou os efeitos da droga”, afirmou Citri.

À medida que o número de mortes causadas por overdose de drogas aumenta de ano para ano, o novo estudo tem implicações abrangentes no sentido de uma melhor compreensão da natureza do vício e da importância de eliminar as pistas contextuais antes que elas se desenvolvam.

“Ao reconhecer que o claustro desempenha um papel fundamental na criação de uma associação de contexto para recompensa, ele se torna uma estrutura de interesse para o campo do vício. Esperamos que esse conhecimento leve ao desenvolvimento de novas ferramentas de diagnóstico para identificar populações suscetíveis ao vício, bem como novas abordagens terapêuticas”, concluiu Terem.