Evita, como era conhecida, foi uma figura controversa na Argentina: uma santa guerreira da justiça social para alguns, uma manipuladora interesseira para outros. Globalmente, ela continua sendo um ícone da cultura pop.A menção a Eva Perón entre seus conterrâneos provavelmente será respondida com divergências sobre o legado da ex-primeira-dama da Argentina, que morreu há exatos 70 anos.

Mas entre gerações mais velhas na Europa ou nos Estados Unidos, é mais provável que ela evoque lembranças da dramática Don't cry for me Argentina, canção que ficou no topo das paradas após o musical de sucesso Evita, de Andrew Lloyd Webber e Tim Rice, de 1978.

O musical foi baseado na biografia de Perón, alçada de menina pobre à primeira-dama, com sua vida cheia de histórias que parecia predestinada a ser contada em livros, filmes e teatro.

Nascida em 7 de maio de 1919 em uma família pobre, Maria Eva Duarte – apelidada de Evita – deixou sua vila rural de Los Toldos para perseguir a carreira de atriz em Buenos Aires. Foi na capital argentina que a aspirante a atriz conheceu o futuro presidente Juan Domingo Perón – e sua vida mudou para sempre.

Os dois se casaram logo depois, e no ano seguinte, em 1946, ele foi eleito presidente da Argentina. Eva se tornou primeira-dama com apenas 27 anos de idade.

Figura controversa

Nos seis anos seguintes, Evita defendeu direitos trabalhistas e o sufrágio feminino. Além de comandar os ministérios do Trabalho e da Saúde, ela também fundou e dirigiu a Fundação Eva Perón e o primeiro partido político feminino de grande porte da Argentina, o Partido Peronista Feminino.

Um relatório do Serviço Especial de Transmissão da Austrália em homenagem ao 100º aniversário dela, em 2019, descreveu Eva Perón como tendo sido “odiada e amada com intensidade em parcelas iguais”.

“Alguns a viam como uma santa, uma benfeitora, uma revolucionária, uma mulher determinada a levar justiça social a todos os cantos do país”, dizia o relatório. “Outros a julgavam como ambiciosa, aventureira, ressentida, egoísta e falsa, cheia de ódio e hipócrita.”

Perón morreu de câncer uterino em 26 de julho de 1952. Ela tinha apenas 33 anos.

Imortalizados em produções

Perón é uma entre várias personalidades cult da vida real cujas histórias continuam a ser imortalizadas através da música e da dança, tanto no palco quanto na tela.

Nos anos 1940 e 1950, a prodigiosa dupla de escritores de teatro americano composta pelo compositor Richard Rodgers e o roteirista, letrista e dramaturgo Oscar Hammerstein II produziu uma série de musicais de sucesso para a Broadway.

Duas de suas produções, The king and I e The sound of music, são baseadas nas vidas e reminiscências de Anna Leonowens e Maria von Trapp, respectivamente.

Coincidentemente, ambas eram governantas: a inglesa Leonowens cuidou dos filhos do rei tailandês Mongkut no início da década de 1860; e Von Trapp, que originalmente planejava se tornar freira, acabou se casando com o viúvo capitão austríaco Georg von Trapp, de cujos sete filhos ela cuidava.

Enquanto algumas liberdades criativas foram tomadas em ambas as histórias, os musicais ostentavam canções de sucesso que são populares até hoje.

Pulando décadas para frente, alguns musicais recentes também se concentraram na diversidade e na inclusão.

A adaptação da Broadway de 2013 do musical King boots – cuja música e letra são de autoria da lenda pop dos anos 1980 Cyndi Lauper – é baseada na história real de Steve Pateman.

Inspirado pela drag queen Lola, o protagonista cria uma marca de calçados de fetiche para homens, chamada “Divine Footwear”, a fim de tentar salvar o negócio de sua família, uma fábrica de sapatos em Northamptonshire.

O musical foi um sucesso, também por dar visibilidade a pessoas LGBTQ e aos preconceitos que elas enfrentam.

Por sua vez, o premiado musical de rap Hamilton (2013), de Lin-Manuel Miranda, conta a história do pai fundador dos Estados Unidos e primeiro secretário do Tesouro, Alexander Hamilton, cujo rosto estampa a nota de dez dólares.

Ao escalar atores não brancos para interpretar os pais fundadores, Miranda descreveu o musical como sendo sobre “a América de antes, contada pela América de agora”.

Já Evita continua agradando o público até os dias de hoje, com produções sendo encenadas em vários países europeus, incluindo a Alemanha. A peça também inspirou um filme homônimo, de 1996, dirigido por Alan Parker e com Madonna no papel de Eva Perón.