Vídeo também foi excluído do Instagram. É a primeira vez que empresa suprime live do presidente. Declaração mentirosa com o objetivo de alimentar paranoia contra os imunizantes provocou repúdio de médicos e políticosO Facebook apagou na noite de domingo (24/10) a última live semanal do presidente Jair Bolsonaro, transmitida na quinta-feira. O vídeo também foi excluído do Instagram, que também pertence à empresa.

Em nota, o Facebook afirmou que as políticas da plataforma “não permitem alegações de que as vacinas de covid-19 matam ou podem causar danos graves às pessoas.”

O motivo da exclusão foram declarações de Bolsonaro que associaram falsamente as vacinas contra covid-19 ao risco de desenvolver Aids.

Esta foi a primeira vez que o Facebook excluiu uma live semanal de Bolsonaro.

Até o último fim de semana, a empresa só havia se limitado a apagar, em março de 2020, um vídeo em que Bolsonaro aparecia afirmando falsamente que a cloroquina era uma “cura” contra a covid-19. YouTube e Twitter também já excluíram ao longo da pandemia vídeos em que o presidente aparecia fazendo declarações falsas.

No entanto, a live da última quinta ainda permanecia no YouTube na manhã desta segunda-feira.

Mentira sobre Aids

No vídeo da última quinta-feira, Bolsonaro leu um texto afirmando que vacinados com as duas doses contra a covid-19 estariam desenvolvendo a “síndrome da imunodeficiência adquirida” – o nome oficial da Aids – “mais rápido do que o previsto” e que tal conclusão era supostamente apoiada em “relatórios oficiais do governo do Reino Unido”.

No entanto, não há estudos do governo do Reino Unido que mencionam tal risco. Entidades médicas e cientistas imediatamente desmentiram o presidente em redes sociais.

A notícia falsa citada por Bolsonaro foi publicada originalmente pelos sites Stylo Urbano e Coletividade Evolutiva, este último um site antivacinas que já veiculou fake news ao longo da pandemia. Os dois sites se basearam numa página em inglês conhecida por espalhar teorias conspiratórias.

O site Aos Fatos apontou que os textos divulgados pelos sites inseriram de maneira fraudulenta uma tabela que não existia em documentos oficiais das autoridades sanitárias do Reino Unido.

Bolsonaro parece ter se dado conta na live sobre o potencial de sanções das redes sociais e se limitou a ler apenas o título e recomendar aos espectadores a procurarem ler o material. “Não vou ler porque posso ter problemas com minha live”.

Não é a primeira vez que Bolsonaro menciona estudos inexistentes para embasar sua agenda negacionista. Em fevereiro, ele mencionou um “estudo de uma universidade alemã” para afirmar que o uso de máscaras são “prejudiciais a crianças”. No entanto, como a DW Brasil revelou, o tal “estudo” não passava de uma mera enquete online altamente distorcida. Da mesma forma, a notícia havia sido divulgada inicialmente por ativistas negacionistas antes de chegar ao presidente.

Bolsonaro tem feito declarações contra vacinas desde o ano passado. Num dos casos mais notórios, ele comemorou publicamente uma suspensão temporária de testes sobre a eficácia da Coronavac. Ele também continua se recusando a tomar qualquer vacina contra a covid-19. É o único líder de um país do G20 que ainda não o fez.

Repúdio

A Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) foi uma dos grupos que desmentiu a fala de Bolsonaro que associaram a vacina à Aids. Em nota, a entidade repudiou “toda e qualquer notícia falsa que circule e faça menção a esta associação inexistente”. A nota foi endossada pela Associação Médica Brasileira (AMB).

No Twitter, a epidemiologista Denise Garrett, do Instituto de Vacinas Sabin (EUA), reiterou que nenhuma das vacinas para Covid-19 aprovadas pela Food and Drug Administration (FDA) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) causam HIV. Ela também chamou Bolsonaro de “Inescrupuloso”, “mentiroso” e “criminoso”.

A microbiologista Natalia Pasternak também usou o Twitter para afirmar que nenhuma vacina faz com que as pessoas desenvolvam Aids.

Já o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) pediu à CPI da Pandemia que envie ao Supremo Tribunal Federal (STF) um requerimento com uma compilação das mentiras divulgadas por Bolsonaro na live semanal. O senador deseja é que o documento seja anexado no inquérito das fake news que tramita no Tribunal.

Já o relator da CPI da Pandemia, senador Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou que Bolsonaro faz “terrorismo de estado. “Isso não é apenas fake news, é mais do que uma simples mentira – isso é terrorismo de Estado. A Justiça precisa frear essa loucura”, escreveu o senador no Twitter.

Na semana passada, o relatório da CPI da Pandemia imputou nove crimes a Bolsonaro, inclusive o de “incitação ao crime” por espalhar sistematicamente notícias falsas e incitar o desrespeito às medidas contra a pandemia. O relatório também apontou que Bolsonaro comanda uma rede de fake news com a participação de seus filhos e blogueiros bolsonaristas.