A ameaça de extinção da espécie elevou a pressão internacional, e o maior importador desse material no mundo, a China, anunciou em fevereiro que não vai comprá-lo por um ano. É suficiente?

 

O maior animal terrestre do planeta sofre uma das mais terríveis ameaças à sua existência. Do alto de seus 3,3 metros de altura e mais de 5,5 toneladas, o elefante africano tem sido alvo de uma intensa caça ilegal, que vitimou mais de 100 mil animais nos últimos três anos, reduzindo a população mundial para cerca de 700 mil indivíduos. Ironicamente, o gigante é procurado por causa de uma parte ínfima de seu corpo: suas presas, de apenas 80 quilos em média, cobiçadas por caçadores que desejam extrair o marfim de que são compostas. O problema é tão grande que ambientalistas e organizações protetoras de animais alertam que, caso algo não seja feito em breve, a espécie corre o risco de encarar a extinção. 

Para evitar a enorme pressão internacional, o governo da China, o maior mercado de marfim do mundo, anunciou em fevereiro o banimento das importações do material por um ano. Já no ano passado, os chineses organizaram a primeira destruição pública de presas, triturando 6,83 toneladas confiscadas.

Mas a atitude do país asiático, destino de 70% do marfim comercializado no planeta, pode ainda não ser suficiente. Para especialistas, a medida não afetará a circulação interna e o valor do material deve continuar como um dos maiores da história. Apenas nos últimos 25 anos, o quilo do marfim na China passou de US$ 5 para mais de US$ 2.100, e o preço se tornou um dos principais motivos da caça ilegal. Além disso, a proibição não deve ter efeito real, já que não havia qualquer compra legal programada para 2015.

Demanda enorme

O marfim – chamado de dentes sangrentos por fabricantes chineses – movimenta tanto a China que se tornou um campo de investimento, com leilões acontecendo regularmente e compradores revendendo seus lotes logo depois de arrebatá-los por valores exponencialmente maiores. Em 2011, US$ 94 milhões foram comercializados em leilões, o dobro do valor de 2010. O interesse é tamanho que o número de lojas que oferecem desde pequenas estátuas de Buda a grandes obras entalhadas em marfim quadruplicou em menos de dez anos – e isso contando apenas os objetos que atendem às especificações do governo.

Segundo estimativas da Convenção de Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Flora e Fauna Selvagem (Cites, na sigla em inglês), o país asiático é o maior importador de presas ilegais do mundo. Tanto que 38% das apreensões de todos os carregamentos ilegais do mundo em 2012 aconteceram na China.

Para o chefe de operações da ONG Save The Elephants, Frank Pope, a proibição governamental tem um valor simbólico, mas ainda não é suficiente para solucionar o problema. “A China tem nas mãos o futuro dos elefantes da África, e o anúncio feito sugere que os líderes da nação estão levando essa responsabilidade a sério”, afirma. “Mas nós acreditamos que o país só acabará com a matança quando fechar seu mercado interno, enviando a mensagem mais forte possível de que [o comércio de] marfim não é mais aceitável.”

Embora seja signatária de um pacto global de 1981 que propõe o banimento do comércio internacional de marfim, a China não coibia com rigor essa atividade. O interesse da elite chinesa pelas presas de elefantes (e também das de mamutes, consideradas de menos valor) se intensificou ainda mais em 2008, quando a Cites permitiu que o país comprasse 68 toneladas de reservas africanas, com a expectativa de que o dinheiro fosse utilizado em medidas destinadas à preservação dos animais. A invasão do material no mercado local, no entanto, serviu apenas para camuflar o contrabando, já que é muito difícil determinar a origem de cada lote.

“Houve um intenso debate se algo assim podia acontecer antes da grande venda de 2008, mas a Cites avaliou a situação e concluiu que a China tinha os controles apropriados para assegurar a legalidade do comércio”, afirma o professor George Wittemyer, da Universidade do Estado do Colorado (EUA), autor principal de um artigo que mostra como o marfim motivou a queda na população de elefantes africanos. “Infelizmente, eles estavam incorretos”, conclui.

A China não deve ser o único país a tentar melhorar o controle do comércio de marfim. O texto de Wittemyer aponta que o aumento da caça ilegal está relacionado à subida dos preços também em outros países, principalmente na África, onde os incentivos para matar um elefante ameaçam superar a capacidade para protegê-los.

No Quênia, lar de uma das maiores populações da espécie no mundo, um guarda de reserva precisaria acumular um ano e meio de seu salário para conseguir o equivalente ao valor do marfim de uma única presa. Além disso, sua profissão implica correr risco de vida, já que cerca de 100 oficiais morrem todos os anos por ficarem entre os caçadores e os seus objetivos.

A situação é ruim, mas começa a dar sinais de que há esperança. Recentemente, o presidente do Quênia, Uhuru Kenyatta, realizou a queima da quantidade recorde de 15 toneladas de marfim da reserva nacional, anunciando planos para destruir todo o estoque do país. Mais do que luz e calor, o fogo emitiu uma forte afirmação a todo o país e o mundo: a de que o marfim não deve ter valor comercial em lugar algum.