Por mais de 40 anos, cientistas levantaram a hipótese da existência de aglomerados de enzimas, ou metabolons, para facilitar vários processos dentro das células. Usando uma nova tecnologia de imagem combinada com espectrometria de massa, pesquisadores da Universidade Estadual da Pensilvânia (Penn State, nos EUA), pela primeira vez, observaram diretamente metabolons funcionais envolvidos na geração de purinas, os metabólitos (produtos do metabolismo de uma determinada molécula ou substância) celulares mais abundantes. Os resultados, publicados na revista “Science”, podem levar ao desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas capazes de interromper a progressão do câncer.

“Nosso estudo sugere que as enzimas não estão localizadas aleatoriamente nas células, mas ocorrem em aglomerados discretos, ou metabolons, que realizam vias metabólicas específicas”, disse o professor Stephen Benkovic, autor correspondente do estudo. “Não apenas encontramos provas de que os metabolons existem, mas também descobrimos que esse metabolon ocorre próximo às mitocôndrias [tipo de organela celular] nas células cancerígenas.”

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No estudo, a equipe procurou um tipo específico de metabolon, chamado purinossoma, que se pensava realizar “biossíntese de purina a partir do início”, o processo pelo qual novas purinas – blocos de construção de DNA e RNA – são sintetizadas. Os pesquisadores investigaram esses purinossomas nas células HeLa, uma linha de células do câncer do colo do útero comumente usada em pesquisas científicas.

Ação em sinergia

“Mostramos que a via biossintética de purina a partir do início [DNPB, na sigla em inglês] é realizada por purinossomas que consistem em pelo menos nove enzimas agindo em sinergia para aumentar sua atividade geral em pelo menos sete vezes”, disse a professora assistente Vidhi Pareek.

Os pesquisadores identificaram os purinossomas, que tinham menos de um micrômetro de diâmetro, usando um novo sistema de imagem desenvolvido por Nicholas Winograd, professor de química da universidade, e colegas. “A técnica utiliza espectrometria de massa de íons secundários de feixe de íons de cluster de gás [GCIB-SIMS, na sigla em inglês] para detectar biomoléculas intactas com alta sensibilidade e permitir imagens químicas in situ em células específicas”, disse a professora assistente Hua Tian. “Isso foi vital para o estudo, pois estamos lidando com uma concentração muito baixa de moléculas em células cancerígenas individuais.”

Nicholas Winograd, professor de química da Penn State, trabalha há 35 anos para desenvolver novas técnicas, incluindo GCIB-SIMS de alta resolução, que podem fornecer informações químicas subcelulares.

“Agora, no final da minha carreira, enfim estou vendo essa abordagem de imagens revelar a presença de purinossomas e, talvez, a seguir, observar que uma droga contra o câncer realmente se transforma em um purinossoma onde pode ser mais eficaz”, disse ele.

Opções terapêuticas

É importante ressaltar que a equipe descobriu que a via DNPB ocorre de maneira canalizada e a justaposição de purinossomas nas mitocôndrias facilita a captação de substratos gerados pelas mitocôndrias para utilização na via. A canalização ocorre quando as enzimas estão localizadas próximas umas das outras, para que as moléculas produzidas sejam rapidamente transferidas e processadas ao longo da via enzimática, restringindo o equilíbrio com o citosol (o líquido que preenche o interior do citoplasma, espaço entre a membrana plasmática e outras partes da célula).

“Nosso experimento nos permitiu mostrar que a eficiência da via biossintética de purina a partir do início é aumentada pela canalização e que a proximidade de purinossomas perto das mitocôndrias é consequente para a via”, disse Benkovic. “Essas descobertas abrem as portas para o estudo de uma nova classe de opções terapêuticas contra o câncer; por exemplo, a elaboração de uma molécula capaz de interromper a justaposição de purinossomas com mitocôndrias.”