Longyearbyen, a cidade mais setentrional do mundo, localizada a apenas 800 quilômetros do Polo Norte, também é a capital de um aglomerado de ilhas norueguesas chamado Svalbard. O que a cidade vive hoje é um alerta ao mundo de quanto o aquecimento global vai afetar a vida na Terra.

A paisagem de montanhas, fiordes e geleiras de Svalbard – que vive quatro meses na escuridão no inverno e quatro meses de luz do dia no verão – está construída sobre um solo formado de terra, rochas e gelo até então permanentemente congelado, chamado permafrost. Durante milhares de anos, o permafrost forneceu uma base tão dura quanto o concreto. Mas agora está derretendo.

Inger Hanssen-Bauer, pesquisador sênior do Instituto Meteorológico Norueguês e editor de um novo relatório sobre Svalbard, diz que o clima em Longyearbyen provavelmente está aquecendo mais rápido do que em qualquer outra cidade do planeta. Isso é por causa do acelerado aquecimento da região do Ártico – à medida que o aumento da temperatura reduz a cobertura de gelo e neve, menos luz solar é refletida e mais energia solar é absorvida pelas superfícies mais escuras que foram expostas.

Cobertura de gelo do Ártico em 2018 é significativamente menor do que em 1980 (Crédito: Nasa)

 

Segundo Hanssen-Bauer, a temperatura média anual em Longybearbyen em 1900 era de -7,8 °C. Desde então, aumentou 3,7 °C – enquanto a média global de aquecimento foi cerca de 1 °C . No final do século 20, a precipitação anual na cidade era de cerca de 200 milímetros, mas, na última década, chuvas torrenciais chegaram a desaguar 50 milímetros em um único dia.

As casas estão rachando e caindo porque os pilares de madeira afundados no permafrost estão ficando umedecidos e começam a apodrecer, desestabilizando as estruturas. Além de mais avalanches que têm assustado os locais e causado mortes. As novas casas em construção pela Statsbygg, agência governamental norueguesa responsável por imóveis, e dona de 75% dos prédios da cidade, estão sendo apoiadas em longos postes de aço fixados no leito rochoso, abaixo do que ainda resta do permafrost.

Edifício de Longyearbyen com rachaduras causadas pelo derretimento do permafrost (Crédito: Mark Sabatini)

O chamado “cofre do Juízo Final”, o Cofre Global de Sementes de Svalbard, que armazena quase 1 milhão de pacotes de sementes originárias de quase todos os países do mundo está localizado na cidade. O local foi escolhido porque a área não é propensa a vulcões ou terremotos, e o sistema político norueguês também é “extremamente estável”.

Criado para funcionar como um apoio em caso de catástrofes como doenças, pragas, guerra e mudanças climáticas, já precisou passar por reforma para se adaptar e sobreviver à nova realidade do clima. Situado no fundo de uma montanha, precisou ter seu túnel de acesso de 120 metros de comprimento concretado, tubos com refrigeração foram enfiados no solo e uma esteira de congelamento foi colocada no topo do túnel para ajudar o permafrost a permanecer congelado.

Os animais também sofrem com a situação. O bacalhau polar, que costumava nadar nos fiordes, desapareceu junto com o gelo do qual eles dependem. Animais terrestres não podem se mudar e as renas famintas são agora vistas com regularidade. Como o gelo se desconecta da terra mais cedo e por mais tempo, os ursos polares enfrentam escassez de alimentos.

Avalanche que atingiu a cidade de Longyearbyen em 2015 e matou moradores. (Crédito: Governo de Svalbard)

Segundo um novo relatório, prevê-se que a temperatura média em Longyearbyen aumente entre 7 °C e 10 °C e as precipitações subam entre 40% e 65% até ao final do século, dependendo do nível das emissões globais de carbono. Talvez o mais preocupante de tudo é que o derretimento do permafrost pode alimentar ainda mais o aquecimento global, pois ele retinha uma imensa quantidade de CO2.

Kim Holmen, do Instituto Polar Norueguês, diz que a história de Longyearbyen é um “aviso prévio” para outras partes do mundo, em entrevista à CNN. As suposições de que as mudanças climáticas atuais “não são tão sérias” já derreteram por lá, diz ele, acrescentando que o aumento da força e da frequência de eventos extremos “precisa de atenção”.