Ferramentas de pedra usadas por macacos-prego mudaram pelo menos duas vezes nos últimos 3 mil anos, segundo um estudo internacional divulgado na publicação “Nature Ecology & Evolution” e noticiado na revista “Cosmos” e no jornal “Folha de S.Paulo”. A descoberta é baseada em um sítio de macacos-prego no Parque Nacional da Serra da Capivara (PI), no Nordeste.

Diversos primatas modernos são conhecidos por usar ferramentas, mas há poucos sítios arqueológicos que mostram o uso de ferramentas não humanas na pré-história. O exemplo mais antigo, de chimpanzés na Costa do Marfim (África), data de 4 mil anos atrás.

Os atuais macacos-prego (Sapajus libidinosus) da Serra da Capivara usam sobretudo instrumentos de pedra para perfurar castanhas de caju abertas. Em outros locais do parque, esses primatas empregam as ferramentas para separar sementes e frutas, cavar raízes e aranhas, e bater juntos para ameaçar outros animais.

Estudado por biólogos, psicólogos e arqueólogos, o sítio piauiense é único porque os tipos e tamanhos das rochas usadas pelos animais foram mudando com o tempo.

Das mais de 1.500 pedras retiradas da terra durante as escavações, 122 tinham marcas de impacto, superfícies esmagadas, resíduos presos ou outros sinais de que tinham sido usadas ​​como ferramentas.

A datação por radiocarbono do carvão escavado ao lado das pedras indica que o período mais antigo de ocupação ocorreu entre 2.400 e 3.000 anos atrás, o equivalente a cerca de 450 gerações de macacos-prego. As pedras da época mais remota, usadas como martelo, eram rochas mais leves, provavelmente empregadas para processar alimentos menores e menos resistentes do que as castanhas de caju.

Por volta de 600 anos atrás, “bigornas” (pedras sobre as quais se posiciona o alimento a ser processado) foram adicionadas às ferramentas dos animais. Há 250 anos, rochas de baixo peso foram substituídas por outras mais resistentes, provavelmente para abrir alimentos mais duros. Na mais recente mudança, ocorrida no último século, o tamanho das ferramentas voltou a diminuir, assemelhando-se ao das usadas pelos macacos-prego contemporâneos.

“Essa descoberta apresenta o primeiro exemplo de variação no uso de ferramentas em longo prazo fora da linhagem humana”, escrevem Tiago Falótico, do Instituto de Psicologia da USP, Tomos Proffitt, do University College de Londres, Richard Staff, do Centro de Pesquisas Ambientais das Universidades Escocesas (ambas as instituições no Reino Unido), e colegas.

Os pesquisadores ainda desconhecem as razões exatas para essa mudança tecnológica e sugerem duas alternativas para explicá-la. Uma delas é que diferentes grupos de macacos-prego, com diferentes comidas favoritas, ocuparam o local em diferentes épocas. Outra é que um único grupo poderia ter ocupado o sítio de forma mais ou menos contínua, e a mudança de ferramentas pode refletir uma alteração na disponibilidade de diferentes alimentos.