No movimento do capitalismo consciente não basta ser o melhor do mundo, mas sim o melhor para o mundo. Conheça os vencedores brasileiros. 

Nem maquiagem nem marketing verde. Vinte empresas comprometidas com a sustentabilidade e orgulhosas do que fazem pelo meio ambiente, pela comunidade, por suas equipes e pela atuação transparente foram distinguidas com o primeiro prêmio ISTOÉ PLANETA Empresas Mais Conscientes, no fim de outubro, em São Paulo. A premiação, oferecida pela Editora Três, recebeu as inscrições de mais de 150 organizações identificadas com os pressupostos do capitalismo consciente, movimento surgido nos Estados Unidos em 2007, animado pelo economista indiano Raj Sisodia (veja os ideais do grupona página seguinte). Para selecionar os vencedores, em parceria com a agência Report Comunicação, foi aplicada a avaliação do Sistema B, organização global que certifica as empresas que, além do lucro, oferecem benefícios à sociedade. 

Diferentemente do que se imagina, nem todas as companhias vencedoras nasceram com ideais sustentáveis. A começar pela grande homenageada da noite, a Unilever, que não só recebeu o título de Empresa Mais Consciente do Brasil como ficou em primeiro lugar entre as companhias de grande porte nas categorias Geral e Modelo de Negócio de Impacto. Fundada no fim do século XIX, no Reino Unido, e presente no Brasil desde 1929, a companhia assumiu um compromisso intensivo com sustentabilidade em 2009.

A grande mudança aconteceu com a definição de uma meta mundial pelo presidente Paul Polman: dobrar de tamanho reduzindo o impacto da atividade sobre o ambiente. Desde então, a Unilever tem repensado suas matérias- primas (agora recicláveis), os fornecedores (devidamente certificados em sustentabilidade) e a composição dos produtos (mais saudáveis e gastando menos energia e água na fabricação). “O consumo é inerente ao ser humano. Todo mundo precisa de sabão, roupa e comida para a sobrevivência. Portanto, o consumo pode ser parte da solução se as escolhas forem conscientes”, argumenta Ligia Camargo, gerente de sustentabilidade. 

Empresas grandes

Entre as grandes empresas, a operadora telefônica Algar Telecom, que atua no Centro-Oeste, ficou em primeiro lugar na categoria Governança, por tratar a transparência como um valor elevado. A companhia mantém sob atualização constante um painel com os 50 principais indicadores dos projetos gerenciados de Minas Gerais, disponível online para os diretores. Um comitê formado por 15 pessoas eleitas pelos funcionários tem acesso à contabilidade da organização. Além de transparência, a Algar oferece estímulos extras às equipes: remuneração variável a cada seis meses baseada no desempenho individual dos funcionários e bônus anual. 

Na área de Recursos Humanos, as iniciativas do Banco do Brasil levaram a estatal ao topo do ranking. A Universidade Corporativa da instituição, criada em 2002, já oferece 260 cursos. São 50 mil funcionários matriculados em cursos presenciais e 33 mil, em cursos a distância. A título de comparação, a Universidade de São Paulo (USP) tem 90 mil estudantes. Recentemente, o banco expandiu ainda
mais a ação: criou o UniBB Família, aberto aos filhos dos funcionários, com curso preparatório para o Enem e testes vocacionais.

Já a BRF, dona das marcas de alimentos Sadia e Perdigão, ganhou o primeiro lugar na categoria Meio Ambiente pela excelência elétrica, hídrica e social. A empresa obtém 97% da energia que consome de fontes renováveis, principalmente de biomassa, graças a programas implantados na década de 1990. Na gestão da água, dos 63 milhões de metros cúbicos captados pela empresa em 2013, 90% foram devolvidos tratados à natureza e 16 bilhões de litros foram reutilizados. A política de reúso foi uma das ideias propostas pelos funcionários, incentivados a sugerir soluções ambiental e socialmente sustentáveis. No ano passado, a BRF investiu R$ 52 milhões para implementar projetos piloto que apoiam o desenvolvimento consciente da empresa e das regiões onde está instalada.

No campo da atuação social, foi a empresa de pagamentos eletrônicos Cielo que ganhou o prêmio na categoria Comunidade. Ao levar produtos e meios de pagamento para 99% dos municípios brasileiros, a organização promoveu a inclusão financeira de pessoas com baixo poder aquisitivo. E permitiu que pequenos negócios substituíssem dinheiro e cheque por cartão e segurança. Paralelamente, a Cielo investe em 11 projetos sociais, a maioria dos quais é referência nas suas áreas de atuação.

Empresas médias

Entre as empresas de médio porte, a incorporadora imobiliária NewInc arrebatou três prêmios: primeiro lugar no seu ranking e também nas categorias Meio Ambiente e Comunidade. A empresa de Goiânia, especializada na classe C, vem construindo edifícios mais habitáveis e sustentáveis. A NewInc aposta em energia solar para aquecer a água e coleta, trata e reúsa esse recurso para utilização em lavagem, irrigação, descargas e lavajatos instalados na garagem. Nos canteiros de obra, os resíduos que iriam para as caçambas são processados para virar blocos de concreto e bloquetes para piso. A cada R$ 25 mil economizados com a reciclagem, a NewInc coloca outros R$ 25 mil na construção da casa de um funcionário, que usará os blocos reciclados. Em 2,5 anos de atuação foram doadas nove casas. Os trabalhadores interessados recebem ainda cursos profissionalizantes e têm à disposição um tipo de lan house, aberta às suas famílias, onde recebem aulas de informática. Em 14 anos, oito ex-serventes se tornaram engenheiros.

Quando o assunto é educação, a Geekie parece imbatível, vencedora das categorias Governança e Modelo de Negócios de Impacto, entre as empresas de porte médio. Os softwares da empresa buscam dar mais interesse e autonomia ao aprendizado dos alunos. Ao identificar as deficiências de cada usuário, o programa sugere exercícios e mede o desempenho durante as atividades. Os conteúdos para enensino fundamental, médio e superior da Geekie são usados por 650 escolas particulares, atualmente. Entre os jovens da rede pública, 2 milhões se prepararam para o Enem 2013 com a ajuda de um sistema gratuito da empresa especialmente desenvolvido para eles, obtendo desempenho 30% melhor que a média. Este ano, esperase que o número de estudantes usuários salte para 3,7 milhões.

Na categoria “Recursos Humanos”, o site carioca de viagem Hotel Urbano foi o grande destaque graças ao seu sólido plano de carreira, ao crédito de R$ 60 por funcionário para usar no site, quando quiser, e a uma nova “área de descompressão” na sede da Barra da Tijuca: um espaço de 2 mil metros quadrados com sinuca, mesa de pingue- pongue, videogame e cafeteria. A política de recursos humanos afeta diretamente a retenção de talentos e a performance da equipe, que em três anos passou de cinco para 650 funcionários. 

Empresas pequenas

Entre as empresas de menor porte, os prêmios ficaram bem pulverizados. A vencedora no Ranking Geral, a empresa de cosméticos e aromatizantes Feiti ços Aromáticos, surgiu do desejo de Raquel Cruz de empreender no próprio bairro de Itaquera, por não aguentar mais a rotina de banco e as três horas de deslocamento até o emprego. A companhia, na zona leste de São Paulo, região mais pobre da capital paulista, contrata preferentemente funcionários moradores da área. Sua fórmula se baseia em matérias-primas amigáveis ao corpo e ao ambiente, o que já lhe abriu portas para o mercado externo, como Chile e Colômbia. 

Na área do Meio Ambiente, o destaque ficou para a gaúcha Biotechnos, também alquimista do mundo dos negócios. A empresa recolhe óleo de cozinha em companhias e escolas e transforma o resíduo poluente em biocombustível. A Biotechnos já tem 18 plantas, número que pode dobrar em 2015, segundo a presidente Márcia Werle.

Já o prêmio da categoria Modelo de Negócios de Impacto ficou para a paulista Avante, que sobe morros para vender serviços financeiros. A proposta criada pelo fundador, Bernardo Bonjean, agente do
mercado financeiro, é encontrar a melhor opção do mercado para cada morador da favela, com base em uma análise de perfil e necessidades. O potencial do negócio é gigantesco: 12 milhões de pessoas vivem em favelas no Brasil e apenas 53% delas dispõem de serviços bancários. 

Outra empresa do ramo financeiro, o Grupo Gaia, criado pelo ex-bancário João Pacífico, conquistou a categoria Recursos Humanos. Com seis braços de atuação diversificados, a empresa de Piracicaba (SP) prega a felicidade e o bom convívio entre os funcionários. Além disso, oferece um estímulo: após dois anos de casa é possível se tornar sócio da empresa. 

Também em São Paulo, a Conexão Cultural ganhou o título na categoria Comunidade por levar diversão e arte gratuitas a espaços públicos e desocupados de São Paulo. A companhia fundada pelas amigas Paola Santiago, Manuela Colombo e Raíssa Couto, criou uma rede de artistas e chefs de cozinha para promover eventos bancados por patrocínios, leis de incentivo e aprovação de editais, sempre reutilizando e reciclando seus resíduos.

Sob o lema “boas práticas corporativas acima de tudo”, a empresa de auditoria Moura Martins, que atua em Goiás, Distrito Federal, Tocantins e Triângulo Mineiro, ganhou na categoria Governança por reduzir o uso de papel, não trabalhar com sonegadores de impostos, cultivar a transparência e estimular a denúncia de práticas questionáveis por um canal que oferece anonimato. Eles não temem denúncias.