Os júris dos tribunais superiores podem detectar quando alguém está mentindo, mesmo quando está usando uma máscara facial, de acordo com uma nova análise de pesquisa da Universidade de Portsmouth (Reino Unido). O trabalho foi abordado em artigo publicado na revista Journal of Applied Research e Memory and Cognition.

As máscaras não apenas não prejudicam a capacidade dos jurados de decidir se uma testemunha é confiável, mas também tornam mais fácil discernir as mentiras da verdade.

O professor Aldert Vrij e a drª Maria Hartwig, respectivamente do Departamento de Psicologia e do Colégio de Justiça Criminal da Universidade de Portsmouth, exploraram como os desvios dos procedimentos judiciais normais, incluindo mandados de máscara e tribunais virtuais, impactaram a capacidade de detecção de mentiras e tomada de decisão dos júris.

Capacidade melhorada

O professor Vrij, um dos maiores especialistas mundiais em detecção de mentiras, cujo trabalho é usado por forças policiais e outras pessoas em todo o mundo, disse: “Em alguns aspectos, oferecemos boas notícias. Não parece que as medidas para conter a propagação do vírus da covid-19 terão um impacto negativo nos júris. Desde que os jurados possam ouvir claramente o réu e seu discurso não seja abafado pela máscara, não há motivo para preocupação”.

Ele prosseguiu: “De outras maneiras, chamamos a atenção para aspectos fundamentalmente problemáticos da detecção de mentiras – em particular, o fato de que o comportamento não verbal não é útil. Isso pode sugerir que o futuro está na exploração de como traduzir protocolos de interrogatório e entrevista com base científica para o tribunal, a fim de obter resultados de detecção de mentiras mais precisos dos jurados”.

O artigo revisou centenas de estudos sobre mentiras, concluindo que as máscaras não impedem a tomada de decisão do júri. Os pesquisadores descobriram que as expressões faciais e outras formas de comportamento não verbal são um indicador não confiável de mentira, e mascarar essas ações na verdade melhora a capacidade do júri de diferenciar entre verdade e mentira.

Margem do acaso

O professor Vrij analisou uma coleção de estudos que explorou o quão bem os observadores foram capazes de detectar mentiras usando comportamentos não verbais. Ele descobriu que apenas metade das mentiras contadas foi corretamente identificada. É um resultado dentro da margem do acaso, em vez da precisão de detecção de mentiras.

Os pesquisadores perceberam que, embora alguns comportamentos como atitude e expressão facial possam ser percebidos como mais suspeitos do que outros, os mentirosos sabem disso e podem facilmente mascarar mentiras usando comportamentos e gestos que os fazem parecer genuínos.

Apenas um estudo explorou diretamente o papel das coberturas faciais em processos judiciais. Esses pesquisadores concluíram que privar um júri de comportamentos não verbais era benéfico. O estudo examinou como os niqabs islâmicos afetam a capacidade de detectar fraudes, e descobriu que os observadores eram muito mais capazes de identificar uma mentira quando os alvos, ou rés, usavam niqabs do que quando não estavam. Ao tirar a distração dos comportamentos não verbais, os observadores tiveram de confiar no conteúdo da fala, que acabou sendo melhor para detectar mentiras.

Ausência de preocupação

Mandatos para usar máscara não são a única precaução tomada para evitar a disseminação de covid-19 no tribunal, com alguns processos sendo mantidos virtualmente. A partir de uma variedade de estudos que questionaram como a mentira poderia ser detectada pessoalmente ou por meio de gravação, os pesquisadores concluíram que não há evidências que sugiram que tribunais virtuais sejam um motivo de preocupação. A precisão da detecção de mentira permanece em níveis semelhantes ao vivo ou virtualmente.

O professor Vrij e a drª Hartwig puderam usar a pesquisa existente para concluir que as precauções contra a covid-19 não afetariam negativamente os processos judiciais. No entanto, eles também puderam identificar lacunas na pesquisa e colocar questões que precisam ser abordadas, à medida que o sistema judicial continua a navegar através da pandemia.

“Com apenas um estudo existente sobre como as coberturas faciais impactam a detecção de mentiras, está claro que mais pesquisas precisam ser feitas para abordar questões e preocupações sobre como a pandemia está afetando o sistema de justiça”, afirmou Vrij.