Durante todo final do inverno e início da primavera, enormes tempestades de poeira percorriam as paisagens nuas e congeladas da Europa durante os períodos mais frios da última idade do gelo. Tais paleotempestades poucas vezes encontram comparação no clima moderno. Elas frequentemente cobriam a Europa Ocidental com algumas das camadas mais espessas de poeira da era do gelo encontradas em qualquer lugar da Terra.

Essa conclusão está baseada em uma série de novas estimativas das taxas de sedimentação e acumulação de camadas de solo europeu obtidas pelo pesquisador sênior Denis-Didier Rousseau, da Escola Normal Superior de Paris (França), e colegas. O trabalho, publicado na revista “Quaternary Science Reviews”, faz parte do projeto TiPES sobre pontos de inflexão no sistema terrestre, coordenado pela Universidade de Copenhague (Dinamarca).

Pistas no loess

No estudo, Denis-Didier Rousseau e colegas reinterpretaram camadas de loess de Nussloch (Alemanha). Loess é um tipo de terra do tamanho de um silte fino encontrado em todo o mundo. Consiste principalmente em sedimentos eólicos. Esses materiais são transportados pelo vento de áreas secas sem vegetação, como desertos de qualquer tipo, morenas (amontoados de pedras que as geleiras, ao descer, vão acumulando dos lados e na sua parte inferior) ou leitos de rios secos.

Dentro dos sedimentos eólicos, camadas mais escuras de paleossolo se alternam dentro das camadas de loess. Cada camada de loess representa uma mudança nas condições climáticas. Em Nussloch, os paleossolos resultam de períodos de clima mais ameno, chamados de interstadiais durante a idade do gelo. As camadas eólicas foram depositadas durante os períodos frios e consistem principalmente de poeira e lodo dos leitos secos do rio Reno.

Tradicionalmente, na paleoclimatologia, presume-se que os paleossolos interstadiais se desenvolveram no topo da camada subjacente, por acumulação quando a mudança para um clima relativamente ameno permitiu que uma biologia mais rica florescesse na região.

Dados revistos

Rousseau e seus colegas estudaram a sedimentação do loess de Nussloch com luminescência e carbono-14. A amostragem cuidadosa e a datação precisa obtida mostraram agora que a presunção anterior não se sustentava. Em vez disso, na Europa, os paleossolos se desenvolveram na camada subjacente, não no topo da poeira.

“Na Europa, os paleossolos estão sendo embutidos nos depósitos eólicos. E quando está considerando isso, você tem de levar em conta a espessura do paleossolo ao avaliar a deposição de poeira. Então, encontramos taxas de acumulação e sedimentação eólica que são muito mais precisas do que eram anteriormente”, diz Rousseau.

A partir disso, foi possível construir novos modelos de idade e recalcular taxas de sedimentação e balanço de massa para camadas de loess europeias em uma variedade de amostras da Bretanha, do norte da França a leste até a Ucrânia, em uma linha quase longitudinal.

Região mais empoeirada da Terra

Os resultados mostram que, durante o Último Máximo Glacial (entre 23 mil e 19 mil anos atrás), a Europa Ocidental era mais empoeirada do que a China, que se presumia ser a região mais empoeirada da Terra nos períodos mais frios das eras glaciais.

As novas estimativas do acúmulo de poeira da era do gelo na Europa se encaixam em uma série de simulações de modelos climáticos. O resultado, portanto, tem o potencial de auxiliar na compreensão dos períodos abruptos de aquecimento e resfriamento durante as eras glaciais. Esses períodos, chamados de eventos Dansgaard/Oeschger, trazem as marcas dos pontos de inflexão do clima.

História em quadrinhos em inglês que resume a tese defendida pelos pesquisadores. Crédito: TiPES/HP