Iraniano que inspirou o filme “O terminal”, com Tom Hanks, se viu com status legal indefinido e adotou o aeroporto como sua casa. Ele fez amizade com funcionários, que lhe forneciam comida, livros e cuidados médicos.Um homem que morou durante 18 anos no aeroporto Charles de Gaulle em Paris morreu neste sábado (12/11) após um ataque cardíaco em um dos terminais.

Mehran Karimi Nasseri teria sido a inspiração para o filme O terminal de Steven Spielberg, protagonizado por Tom Hanks.

Ele viveu no terminal 1 do aeroporto parisiense de 1998 a 2006, primeiramente, por estar em uma situação indefinida quanto a sua legalidade e não possuir documentação. Mais tarde, ele teria optado por viver no aeroporto por vontade própria.

Durante anos, ele dormiu em um banco de plástico vermelho e fez amizade compessias que trabalhavam no aeroporto, que permitiam que tomasse banho nas dependências de funcionários.

Uma rede de apoio se formou no aeroporto para lhe fornecer comida, assistência médica, livros e um rádio. Ele passava o tempo escrevendo em seu diário, lendo revistas e observando os viajantes.

O iraniano recebeu o apelido de Lord Alfred e se tornou uma mini-celebridade entre os frequentadores do Charles de Gaulle.

“Um dia, eu vou sair do aeroporto”, afirmou em 1999 durante uma entrevista, na qual estava com uma aparência frágil, cabelos ralos e olhos fundos. “Mas, ainda aguardo por uma passaporte ou visto de trânsito.”

Sem papéis ou documentos

Nasseri nasceu em 1945 em Solemain, uma parte do Irã que estava sob jurisdição do Reino Unido, de pai iraniana e mãe britânica. Ele deixou o país em 1974 para estudar na Inglaterra, mas acabou sendo preso durante um protesto contra o governo do Xá Reza Pahlavi e foi expulso do país sem seu passaporte.

Ele pediu asilo político a várias nações europeias, passando por Alemanha e Holanda, num esforço para encontrar sua mãe. Nasseri, porém, acabou sendo expulso de vários países por não possuir a documentação correta.

O Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (Acnur) na Bélgica lhe concedeu credenciais de refugiado, mas ele disse que perdeu os papéis quando roubaram sua mala em uma estação de trens parisiense.

A polícia francesa o prendeu, mas não podia deportá-lo para nenhum país porque ele não possuía documento oficiais. Assim sendo, ele chegou ao aeroporto internacional de Paris em 1998 e acabou ficando por lá.

Novos entraves burocráticos e regras cada vez mais rígidas na Europa para a imigração o deixaram em uma “terra-de-ninguém” jurídica durante anos. Quando ele finalmente recebeu seus novos documentos, que garantiam sua permanência na França, ele demonstrou surpresa e apreensão em deixar o aeroporto.

De volta ao aeroporto

“Não tenho certeza do que quero fazer, se quero ficar aqui ou sair”, afirmou na época. “Tenho meus papéis, posso ficar aqui. Acho que devo analisar com cuidado todas as opções, antes de tomar uma decisão”.

Ele, no entanto, acabou ficando no aeroporto. Seu advogado disse que ele tinha medo de deixar o local, onde ficou até 2006, quando foi hospitalizado. Depois disso, passou a morar em um abrigo parisiense.

Pessoas com as quais ele manteve amizade no aeroporto relataram que os anos em que ele viveu em um espaço sem janelas afetaram seu estado mental. Um funcionário de empresa aérea o comparou a um presidiário incapaz de viver no mundo exterior.

Além de O Terminal, de 2004, sua vida também inspirou o filme francês Perdido em Trânsito e uma ópera chamada Voo.

A obra de Spielberg lhe rendeu algum dinheiro, mas, segundo uma autoridade local, Nassiri voltou a morar no aeroporto semanas antes de sua morte. Ele morreu de causas naturais no terminal 2F. Com ele, foram encontrados alguns milhares de euros.

rc (AP, AFP)