Questões ambientais parecem ter ganhado mais relevância entre os brasileiros nos últimos anos. Uma pesquisa conduzida pelas consultorias Opinion Box, Mundo do Mar­keting e Dia Comunicação, divulgada em fevereiro, mostra que mais da metade dos consumidores (54%) dá preferência a empresas ambientalmente responsáveis. De acordo com o estudo, 56% procuram usar embalagens menos nocivas ao meio ambiente e 57% costumam ler os rótulos dos produtos para verificar o que estão consumindo.

Por outro lado, ainda é alarmante o número de empresas que praticam no país o greenwashing, ou maquiagem verde, a prática de vender como ecológicos produtos não tão “verdes” quanto a publicidade os pinta. Estudo conduzido pela consultoria Market Analysis, especializada no assunto, analisou, no fim de 2014, os apelos ambientais em rótulos de produtos cosméticos, de higiene pes­soal e de limpeza.

Entre os itens rotulados como sustentáveis, apenas 5% exibiam certificados de entidades credenciadas. Os outros 95% traziam informações de pouca credibilidade: selos próprios e dados de difícil comprovação. O número de produtos “verdes” dessas categorias aumentou quatro vezes nos últimos quatro anos. Também existe um volume maior de marcas cometendo algum pecado de greenwashing (conheça os sete pecados do greenwashing no quadro “Os sete pecados da maquiagem verde”). A proporção de maquiagem verde no mercado brasileiro, no entanto, tem diminuído nos últimos anos.

Perna curta

Em 2010, nove em cada dez apelos em produtos dessas categorias (92%) cometia alguma transgressão. Em 2014, o índice caiu para 61%. A conclusão da consultoria é que se antes quase tudo era green­washing, hoje em dia as marcas têm tomado mais cuidado. A escalada de conscientização e a facilidade de compartilhar informações na internet tendem a deixar as marcas que mentem para os consumidores mais expostas.

“Greenwashing não tem fôlego. A partir do momento em que você fere a confiança do consumidor, dependendo da gravidade do caso, você pode até se extinguir”, afirma Kami Said, diretor de operações de sustentabilidade da HP no Brasil. Casos como o do banco britânico HSBC, que teve operações de evasão de divisas e de lavagem de dinheiro sujo na Suíça reveladas, reforçam essa impressão. O escândalo colocou em apuros uma das instituições financeiras mais respeitadas do mundo em termos de responsabilidade socioambiental. É difícil prever as consequências do episódio, mas a perda de credibilidade pode ter resultados catastróficos para um banco.

 


Anúncio da Patagonia: estratégia ousada e bem-sucedida

Na opinião de Fabián Echegaray, diretor-geral da Market Analysis, esse ligeiro avanço é resultado da pressão de setores organizados da sociedade civil. “Ao longo dos últimos cinco anos, institutos de defesa do consumidor e organizações vinculadas ao setor corporativo (como o Ethos e o Akatu) ajudaram a amadurecer em algumas empresas o entendimento de que se alinhar a valores de sustentabilidade não é apenas interessante financeiramente, mas pode ter um valor político”, diz ele.

Talvez o melhor exemplo dessa percepção venha da experiência da fabricante de roupas esportivas Patagonia. Essa empresa norte-americana tem como mote combater o consumismo e vende roupas que duram mais, produzidas com matéria-prima certificada. Em uma estratégia de marketing ousada, em plena Black Friday (tradicional dia de promoções no comércio dos EUA) de 2011, anunciou um dos seus produto da seguinte forma: “Não compre essa jaqueta”. Desde então, a empresa vem aumentando seu faturamento.

Certificação

No Brasil, um dos maiores desafios das empresas que buscam certificações ambientais é mostrar ao consumidor o que elas significam. A sanha de atender a uma demanda por produtos sustentáveis criou uma si­tuação na qual é difícil separar o que é green­washing do que não é. “Foram criados diversos chavões, muitas vezes empregados de maneira incorreta. Todo esse ‘marketing verde’ esvaziou a importância dessa informação”, reflete Tatiana Trevisan, gerente de sustentabilidade da rede de supermercados Walmart. De acordo com ela, esses conceitos não ficam claros para o consumidor.

O melhor caminho, na opinião de Tatiana, é trabalhar com dados mais técnicos. “Mas ainda não existe uma padronização capaz de mensurar de forma mais ampla todos os valores de sustentabilidade. Não é como comparar calorias e nutrientes”, observa. Para chegar a índices mais precisos, é necessário analisar toda a cadeia produtiva de um produto, o que já é feito por alguns selos confiáveis (conheça mais sobre eles no quadro “Selos verdes”).

O problema é traduzir para o consumidor essa informação. “Existe um baixo grau de disseminação e de esclarecimento do que cada selo representa. O próprio símbolo de reciclagem pode ter diversos significados, mas faltam campanhas para ajudar a esclarecer isso”, afirma Echegaray. As entidades de defesa do consumidor lamentam a falta de legislação específica a respeito da maquiagem verde em nosso país. Existem critérios técnicos estabelecidos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e normas éticas para apelos de sustentabilidade estipuladas pelo Conselho Nacional de Autorregula­mentação Publicitária (Conar). Todos eles são insuficientes, de acordo com o Proteste e o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec).

O destino da maioria dos casos de maquiagem verde acaba sendo o Conar, que não tem poder de autuação. Quando uma propaganda é considerada abusiva, o conselho recomenda que a marca retire a campanha de circulação, mas isso nem sempre acontece. “Deveria existir uma fiscalização mais efetiva que obrigasse a marca a provar essa qualidade quando declarada”, propõe Maria Inês Dolci, do instituto Proteste. Enquanto isso não acontece, o consumidor precisa estar constantemente atento para não comprar gato por lebre.