Como não precisava do corpo inteiro para desenvolver um experimento que fazia em seu laboratório, Josef Mengele pediu e recebeu apenas a cabeça de um garoto de 12 anos. Com naturalidade, como se estivesse fatiando um tender, passou a dissecá-la.

Essa é apenas uma das atrocidades reveladas no recém-lançado “Mengele – Unmasking the Angel of Death” (Mengele – Desmascarando o Anjo da Morte, ainda inédito em português.

Autor da obra, o historiador americano David Marwell foi chefe de pesquisa do Departamento de Investigações Especiais da Justiça dos EUA, contratado para fazer uma pesquisa global para encontrar Mengele na década de 1980.

“Isso apenas reforçou minha noção dele como um monstro grotescamente sádico”, escreve Marwell no novo livro.

Obcecado por anomalias

Josef Mengele era a personificação do mal. Rondando o campo de concentração de Auschwitz-Birkenau na década de 1940, ele se apossava de vítimas indefesas e era obcecado por anomalias. E realizava as experiências mais sádicas com esses prisioneiros.

Conhecido como o Anjo da Morte e o criminoso de guerra mais notório de todos os tempos, Mengele era um monstro médico e pretendia destruir os inimigos da raça ariana – principalmente os judeus – e criar a comunidade alemã ideal.

As vítimas dos experimentos médicos de Mengele foram escolhidas com base em diferentes cores dos olhos, anomalias de crescimento, gigantismo, nanismo, gêmeos e ciganos.

“Mengele emergiu como a personificação não apenas do próprio Holocausto, mas também do fracasso da justiça no início da guerra, que permitiu que tantos assassinos e cúmplices nazistas escapassem da lei”, acrescenta Marwell.

Esperma de gêmeo

Com 732 pares de gêmeos para experimentar, Mengele uma vez engravidou uma gêmea com o esperma de outro gêmeo para ver se ela produziria gêmeos.

Em uma dessas experiências, ao notar que havia apenas um bebê, um sobrevivente afirmou que o médico arrancou o feto do útero da mãe, jogou a criança no forno e foi embora.

Mengele colocou pares de gêmeos em pequenas gaiolas de madeira e injetou-os diariamente nas costas com bactérias que causavam infecção na boca ou nos órgãos genitais, levando a furúnculos gangrenados.

Ele aplicou grampos dolorosos nos membros das crianças para induzir gangrena, injetou corante nos olhos, aplicou injeções na coluna vertebral e nas torneiras espinhais sem anestesia.

Castração sem anestesia

Tifo e tuberculose foram inseminados a um gêmeo, mas não ao outro. Se um morresse, o outro seria morto com uma injeção de clorofórmio no coração para estudar e comparar os efeitos da doença.Mengele operava sem anestesia em procedimentos como remoção de órgãos, castração ou amputação.

Ele injetou prisioneiros no coração com clorofórmio ou fenol, que instantaneamente causa coagulação do sangue.As vítimas foram propositalmente mortas apenas para medições e exames após a morte.

Órgãos, olhos, amostras de sangue e tecidos foram enviados a um laboratório para estudos adicionais e para serem dissecados.

Difícil de acreditar

Mengele obteve um PhD em antropologia pela Universidade de Munique antes de ingressar no Instituto de Biologia Hereditária e Higiene Racial e trabalhar com um geneticista alemão.

A maioria das experiências distorcidas de Mengele foi quase exclusivamente realizada em busca de sua própria especialização pseudo-científica, em vez de ser conduzida por razões científicas práticas.

A chegada a Auschwitz permitiu a Mengele seguir seu trabalho sem controle para “proteger e melhorar a raça alemã”, tudo parte da retórica nazista para criar uma nova ordem racial e salvaguardar o sangue alemão.

Com milhares e milhares de vítimas indefesas, Auschwitz era o laboratório ideal para Mengele – e suas ações provaram ser o pesadelo mais sombrio da história moderna.

O autor do livro recém-lançado acha difícil acreditar em testemunhos sobre alguns dos experimentos atribuídos a Mengele: criar um gêmeo siamês “costurando” dois gêmeos ou transformando meninos em meninas ou meninas em meninos ou até conectando o trato urinário de uma criança de 7 anos menina ao seu próprio cólon – como relatado por outros autores.

A fuga do monstro

Perdida a guerra, Mengele desapareceu. Investigações mostram que ele se refugiou em uma fazenda na Alemanha. A jovem mulher com quem se casara e dera à luz um filho declarou publicamente o marido como morto.

Vivendo na floresta, Mengele ficou em contato com sua família. Ele precisava da ajuda financeira deles para deixar a Alemanha. A rota preferida era através de um porto italiano. Mengele chegou até lá com documentos falsos.

Com o nome de Helmut Gregor, ajudado por um grupo nazista do sul do Tirol e dinheiro recebido de seu pai para pagar um guia, Mengele estava destinado a viajar para a Argentina.

A viagem foi confirmada com a emissão de um passaporte da Cruz Vermelha em 1949. Em 1960, oficiais de justiça alemães apresentaram um pedido de extradição à Argentina, Mengele já não estava mais lá, mas, sim, no Paraguai.

Em 1985, Alemanha, Israel e Estados Unidos formaram um esforço cooperativo para encontrar Mengele. Todos já haviam tentado encontrá-lo por conta própria. Dependendo da pista ou do informante, o médico nazista poderia estar na Etiópia, Argentina, Egito, Peru, Chile, Brasil e Equador.

O Anjo da Morte foi finalmente localizado em junho de 1985 – morto. Ele morrera durante um banho de mar em 1979, e seu corpo foi enterrado em São Paulo.

O autor do novo livro estava lá quando exumaram o corpo e segurou os ossos do monstro nazista nas mãos.