O número de mortes de grávidas com covid-19 no Brasil tem preocupado os especialistas. Segundo números de meados de julho, divulgados pelo Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe), cerca de 200 mulheres morreram nos últimos meses na gestação ou no pós-parto depois de serem diagnosticadas com covid-19, e pelo menos 1.860 casos da doença foram notificados nesse grupo de mulheres.

“Apesar da demora em serem apontadas como grupo de risco, nós já esperávamos que gestantes e puérperas tivessem uma resposta mais grave ao vírus”, conta ao Jornal da USP no Ar Rossana Francisco, professora associada do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Medicina (FM) da USP e chefe da Divisão de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital Universitário (HU). “Tínhamos uma referência do H1N1, quando houve um pico de mortalidade materna, mostrando que as gestantes eram, sim, sensíveis ao vírus. Outra questão é o fato de gestantes terem um risco maior para tromboembolismo, e a covid se associa a essas situações de trombose.”

A professora explica que houve uma operação, feita em três dias, que levou todo o atendimento de gestantes de alto e baixo risco, mas que não contraíram covid-19, para o HU, a fim de que o Hospital das Clínicas (HC) permanecesse como referência municipal e para a Grande São Paulo no atendimento de pacientes infectadas com covid-19. “Desde quando o HC se organizou para ser um hospital de atendimento exclusivo para covid-19, optamos por permanecer no hospital com uma área exclusiva para gestantes e puérperas – mesmo não sendo ainda consideradas grupo de risco”, afirma.

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Sistema fragilizado

Ela chama atenção para o fato de que essa escolha foi feita porque, em geral, a morte materna depende do acesso ao serviço de saúde e à tecnologia, um atendimento especializado. “O nosso sistema de saúde já é normalmente fragilizado: temos uma razão de morte materna três vezes maior que o máximo considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo dados do Ministério da Saúde, já temos 236 mortes, sendo 135 gestantes. Por isso, a necessidade de se ter um atendimento especializado, com acesso à tecnologia, UTI e respiração mecânica.”

Rossana finaliza ressaltando a importância de se continuar com o pré-natal. “Esse medo de sair de casa tem de ser usado ao nosso favor: tomem todos os cuidados, mas não deixem de acompanhar suas consultas de pré-natal”, afirma. Ela ainda aconselha que, caso uma gestante sinta qualquer sintoma relacionado ao coronavírus, procure o sistema de saúde para avaliação. “Precisamos, com calma, enfrentar essa situação para reduzir ao máximo a perda dessas mulheres, o que realmente impacta toda a nossa sociedade”, completa.

Ouça a íntegra da entrevista aqui.