Muita gente vai torcer o nariz, afirmando tratarse de mais um fenômeno autoral de “auto-ajude-me” – aquele em que só o autor é beneficiado. De certo modo, O Segredo pode ser visto sob a ótica do sucesso financeiro canalizado para aqueles que dele participaram: autores, produtores, diretores e apresentadores. Os números são expressivos: a produção custou cerca de US$ 3 milhões, alcançando um faturamento de mais de US$ 70 milhões em menos de três meses de exibição.

A bilheteria deste documentário de pouco mais de hora e meia de duração, concebido para ser veiculado pela internet e pela televisão e exibido com sucesso nos cinemas, superou longas badalados, como Babel, Borat, Os Infiltrados e 007 Cassino Royale.

Na televisão norte-americana, O Segredo ganhou espaço na pauta de ícones como Larry King e Oprah Winfrey.

O Brasil foi o país pioneiro em seu lançamento, que ocorreu em março. A propaganda correu boca a boca, por meio do que se costuma chamar “marketing viral”, contaminando rapidamente a internet.

A comunidade homônima no Orkut soma, no País, mais de 35 mil pessoas. Considerando- se outras co-relacionadas ao tema – poder da mente, lei da atração, pensamento positivo, etc. -, os números totalizam mais de 183 mil interessados.

Ao filme, seguiu-se o fenômeno editorial: nos Estados Unidos, o livro vendeu 500 mil cópias nos primeiros 45 dias, liderando a lista dos mais vendidos em veículos como o New York Times e o Wall Street Journal. Em dois meses, alcançou a casa dos seis milhões de exemplares. O mesmo interesse está se repetindo com as suas cópias nas locadoras e com a venda dos DVDs, gerando mais receita.

A autora do sucesso, Rhonda Byrne, produtora australiana especializada em programas de variedades para rádio e TV, assimilou e colocou em prática as lições contidas num antigo manual, A Ciência Para Ficar Rico, escrito no início do século passado por Wallace D. Wattles. Vejamos, então, como é possível pegar carona nessa impressionante fórmula do sucesso.

Consta que Rhonda passava por um momento profissional e pessoal difícil. Com a morte do pai, entrou em profunda depressão, tendo ainda de lidar com a angústia da mãe, que dizia não encontrar mais sentido na vida. Seu estado emocional contaminou o trabalho – ela e a sua equipe estavam começando a produzir uma nova série de televisão e o seu desânimo acarretou danos financeiros e desgastes nos relacionamentos profissionais.

Prestes a falir, o seu mundo parecia ruir sem qualquer perspectiva de salvação. Nesse momento desesperador, recebeu de sua filha uma cópia do livro de Wattles juntamente com a profecia acolhedora de que “tudo daria certo”. Apesar de um tanto incrédula no início, a produtora pôs-se a investigar as origens daqueles ensinamentos, concluindo que, ao longo da história, várias personalidades os conheciam e praticavam. Encontrando respostas para suas dúvidas, foi tomada de “um desejo ardente de partilhar o segredo com o mundo”, passando a procurar pessoas que o conhecessem.

A autora conta que, como resultado inicial da prática, tornou-se uma espécie de ímã, atraindo para si, numa reação em cadeia, mestres no assunto. Para tanto, empreendeu viagem aos Estados Unidos, onde manteve contato com nada menos que 55 especialistas – a maioria ligados a temas de autoajuda -, 24 dos quais figuram como coautores do livro. Em apenas sete semanas, conseguiu produzir 120 horas de gravação. Ao final de oito meses, o filme foi lançado, tornando-se grande sucesso de bilheteria.

No livro, Rhonda relata ter recebido “milhares de cartas de pessoas do mundo inteiro, de todas as idades, raças e nacionalidades, expressando gratidão pela alegria de O Segredo”. Ela também afirma não existir uma única coisa que não se possa fazer com esse conhecimento. “Não importa quem você é ou onde está, O Segredo pode lhe dar o que você quiser”, enfatiza.

Premida pela necessidade e pela tensão resultantes das perdas vivenciadas, Rhonda realizou uma pesquisa a jato, tornando questionáveis afirmações quanto ao caráter esotérico de O Segredo, possivelmente guardado a sete chaves por líderes anônimos que, segundo a autora, “desejariam manter o poder, e não compartilhá-lo”.

“NÃO IMPORTA QUEM VOCÊ É, OU ONDE ESTÁ, O SEGREDO PODE LHE DAR O QUE VOCÊ QUISER”

Do mesmo modo, é arriscado afirmar que poetas, escritores, músicos, pintores, filósofos e físicos de todos os tempos – mestres da estirpe de Blake, Hugo, Beethoven, Da Vinci, Platão, Pitágoras, Bacon, Newton, Einstein – acreditavam na tal Lei da Atração, imortalizando-a em suas obras.

Assim como não se sustenta a corelação estabelecida entre O Segredo e os ensinamentos transmitidos pelas mais variadas civilizações e religiões: para fundamentar sua tese, a autora limitou- se a recortar pequenos trechos e aforismos que, descontextualizados, são insuficientes para comprovar as suas entusiásticas afirmações.

Também não há novidade no conteúdo apresentado em O Segredo: vários dos autores citados por Rhonda como fontes de inspiração já divulgaram suas idéias mundo afora, ocupando as listas dos mais vendidos, inclusive no Brasil, entre os quais destacamos Robert Anthony (Além do Pensamento Positivo), Catherine Ponder (Leis Dinâmicas da Prosperidade), Stephen Covey (Os Sete Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes) e Eckhart Tolle (O Poder do Agora).

A que se deve, então, tamanho sucesso? Além da boa estratégia de marketing, ao formato. Ele caiu no gosto popular, embora haja quem o considere longo demais. O documentário, permeado por testemunhos de famosos gurus norte-americanos da auto-ajuda, impressiona e atrai o leigo, pois não lhe faltam assertividade e exemplos de êxito financeiro para encher os olhos do espectador, ávido por tornar-se, ele também, um ímã capaz de atrair facilmente o sucesso e a prosperidade.

Mas o mérito maior reside na revitalização e popularização de temas, como a Lei da Atração, as práticas de visualização criativa e as leis da prosperidade, todos eles relacionados à corrente pragmática conhecida como mentalismo – o poder da mente inconsciente -, que teve o seu auge nos Estados Unidos, entre o fim do século 19 e início do século 20. Quando aplicados corretamente, tais princípios se traduzem em resultados. E isso sim valida a teoria atualizada por Rhonda com a ajuda de seus “mestres” colaboradores.

A Lei da Atração

O Segredo pode ser resumido no domínio da chamada Lei da Atração, segundo a qual “semelhante atrai semelhante”. Em poucas palavras, a autora afirma que “os pensamentos são magnéticos e têm uma freqüência. Quando você pensa, os pensamentos são emitidos no universo e magneticamente atraem todas as coisas semelhantes que estão na mesma freqüência. Tudo o que é emitido volta para a fonte – você”.

O princípio pode parecer esotérico, mas a materialidade (energia) do pensamento vem sendo pesquisada pela física quântica em moldes científicos. Já segundo a Programação Neurolingüística (PNL), uma teoria norte-americana que estuda os efeitos da linguagem sobre os “programas” instalados no cérebro humano, a Lei da Atração poderia ser explicada por meio de um mecanismo chamado Eliminação.

De acordo com esse procedimento, a mente concentrada tende a focar a atenção numa direção unívoca, eliminando em grande parte o que não se relaciona à informação principal. Por exemplo, uma mulher grávida fazendo compras em um supermercado tende a “enxergar” todas as outras grávidas que estejam no local, pois sua atenção (consciente e/ou inconsciente) está focada no fenômeno da gravidez.

Caso reencontre a mesma grávida várias vezes em corredores diferentes ou na fila do caixa, sua mente pode até contabilizá-la como “mais uma” grávida a cada vez, pois o foco é a barriga, e não a pessoa como um todo. Assim, ela pode enxergar uma dúzia de grávidas num ambiente onde existam apenas duas ou três além dela própria.

COMO APREGOAVA ÉMILE COUÉ, O PULO DO GATO É TRANSFORMAR A SUGESTÃO EM AUTOSUGESTÃO

A PNL afirma ainda que informações e emoções semelhantes tendem a ser encadeadas pela mente como as contas de um colar – uma experiência traz à tona outra de mesma natureza. Isso também se relaciona com a Lei da Atração. Quando alguém pensa numa experiência frustrante, um relacionamento mal-sucedido, por exemplo, tende a lembrar de vários outros fracassos amorosos, “eliminando” momentaneamente da lembrança todas as vezes em que foi bemsucedido no amor, repetindo os mesmos procedimentos que o impediram de ser feliz e atraindo o mesmo tipo de parceiro inadequado.

Fundamental para a Lei da Atração funcionar é acreditar nela. Como apregoava Émile Coué (1857-1926), o “pulo do gato” é transformar a sugestão em auto-sugestão: “Podem sugerir alguma coisa a alguém. Se o inconsciente dele não aceitar essa sugestão e não a digerir, transformando-a em auto-sugestão, ela não produzirá efeito algum”. Faz todo sentido, considerando que é o seu cérebro que vai entrar em ação.

Assim sendo, embora os ensinamentos iniciais do mentalismo estivessem voltados à produção de riquezas materiais, a estratégia mental desenvolvida para que tais resultados fossem alcançados passou a ser empregada para outras áreas da vida como a recuperação/manutenção da saúde ou a busca de relacionamentos perfeitos, bastando, para tanto, que o indivíduo seja capaz de dominar seu sistema de crenças. Tal abordagem tem sido constante nos manuais da atualidade.

O que há para se ler

Pense e Enriqueça, Napolleon Hill; Alegria e Triunfo, Lourenço Prado; O Domínio de Si Mesmo pela Auto-Sugestão Consciente, Émile Coué; A Visualização Criativa, Melita Denning e Osborn Phillips; O Poder do Subconsciente, Joseph Murphy; O Subconsciente – Fonte de Energia, Erhard Freitag; O Poder da Vida Positiva, Norman Vincent Peale; e o recém-lançado A Lei da Atração – o Segredo Colocado em Prática, Michael J. Losier. Para quem se interessar, uma cópia eletrônica de Ciência Para ficar Rico, de Wallace D. Wattles, pode ser baixada gratuitamente através do link http://www.meio.ws/pdf/cpfr.pdf

Regina Maria Azevedo é mestre em Ciências da Comunicação, especialista em PNL. Contatos: reginama@uol.com.