Há oito anos, uma empresa paraestatal brasileira se preparava para concretizar a compra de uma concorrente. Negócios desse tipo precisam da aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão vinculado ao Ministério da Justiça que zela pela livre concorrência e combate a formação de monopólios. No processo, a empresa precisava apresentar uma série de documentos para avaliação, e estava sujeita a multas, caso descumprisse a exigência. Um dos comprovantes requisitados não foi encontrado a tempo e a corporação foi autuada em cerca de US$1 milhão. O documento só foi achado seis meses depois, e o prejuízo financeiro foi inevitável.

Casos como esse são frequentes e evidenciam a falta de cuidado que boa parte das organizações e das pessoas tem com a gestão de seus dados, um patrimônio muitas vezes com grande valor estratégico. “Já testemunhei presidente de empresa e toda a diretoria passarem um fim de semana inteiro revirando arquivos para encontrar uma guia do Imposto de Renda”, conta Paulo Carneiro, presidente da P3 Image, companhia especializada em gestão de documentos. O excesso de informação dos tempos modernos produz descarte em escala crescente. Mas o éter virtual onde acabam as informações desprezadas ainda pode gerar valor.

Diariamente, produzimos e lidamos com milhares de arquivos, documentos e informações com diferentes finalidades. Dentro de uma empresa, por exemplo, há setores diversos (recursos humanos, jurídico, tributário, financeiro, etc) com produção independente de dados e necessidades específicas. Para se ter uma ideia, a cada dois dias são produzidos no mundo 5 bilhões de gigabytes de dados úteis. Nas organizações, arquivos ativos crescem na proporção de 25% ao ano. “Isso significa que, se uma empresa tem mil caixas com documentos importantes este ano, no seguinte ela vai ter 1.250”, diz Carneiro. Em 2014, 5 bilhões de gigabytes serão produzidos não a cada dois dias, mas a cada dez minutos.

Na era pré-digital, o caminho percorrido pela informação era mais óbvio, mas não necessariamente menos acidentado. Tudo era registrado em papel, alocado em caixas e levado a um depósito. No mundo ideal, era feita uma triagem desses documentos, que eram separados por categoria e armazenados em locais específicos. No mundo real, grandes corporações perdem um documento a cada 12 segundos e gestores gastam em média quatro semanas por ano procurando informações.

Em caso de perda de material, o custo pode ser alto. Pesquisas feitas nos EUA pela Universidade de Berkeley, Califórnia, estimam que o valor médio pago para recriar um documento é de R$ 350. Suponha que o documento em questão seja um contrato. Está embutido nesse cálculo o valor que se gastará com deslocamento para novas reuniões e para autenticar assinaturas em um cartório, por exemplo – além do constrangimento de contar ao cliente que se perdeu o contrato e convencêlo a assinar outro. Fora o risco de ter de pagar multas milionárias como as descritas no primeiro parágrafo.

 

Armazenamento

Se por um lado a era digital pulverizou as plataformas de armazenamento de informações (e-mails, planilhas de excel, power point, documentos de Word, o bom e velho papel, etc), por outro trouxe novas soluções. Há procedimentos, normas técnicas e softwares para facilitar o gerenciamento de dados importantes. “Hoje existem softwares extremamente sofisticados para a organização que permitem que você tenha a informação necessária para tomada de decisões rapidamente”, explica Luiz Santoyo, presidente do conselho da Associação Brasileira das Empresas de Gerenciamento de Documentos (ABGD).

Para que essa eficiência seja alcançada, contudo, é preciso articular a informação. “Os softwares existem, mas nem sempre são utilizados da forma adequada. As informações muitas vezes acabam ficando presas em ilhas, quando precisam ser integradas”, explica Luciano Vieira de Araújo, professor de sistemas de informação da USP, especialista em inteligência de negócios.

Independentemente da tecnologia, as causas comuns no extravio de dados acabam sendo de ordem prática: a falta de triagem e de regras de arquivamento – ou seu descumprimento. Um bom processo de gerenciamento de dados passa pela análise do documento, na qual se verifica se ele é dispensável ou útil; sua indexação, momento em que se identifica e cataloga de acordo com a característica; e, finalmente, o armazenamento. Se o destino da informação vai ser o lixo, o buraco negro dos arquivos perdidos ou o ícone mais próximo da área de trabalho do seu computador, vai depender muito do bom cumprimento desse procedimento.

 

Poder da informação

A máxima de que informação é poder é cada vez mais válida. O volume abundante de informações disponíveis na internet e a condição de cruzar os mais diversos dados podem levar a conclusões valiosas. “Muitas empresas têm usado essas análises para antecipar tendências de mercado, identificar pendências internas e até mesmo descobrir fraudes”, explica Araújo.

Quando navegamos na internet, deixamos “pegadas” digitais. Os sites que visitamos, os comentários que fazemos em redes sociais, os vídeos e fotos que compartilhamos, as compras que fazemos – e até aquelas que não concluímos –, tudo, somado aos dados que informamos voluntariamente em cadastros, compõe um arquivo gigantesco de informações que permitem traçar perfis precisos – o chamado Big Data. “O potencial de utilização do Big Data é absurdo. Imagina tudo que tem disponível sobre uma pessoa em redes sociais, como Twitter, Facebook e Flicker”, diz Araújo.

Mas, para se chegar a análises mais profundas, tirar proveito delas e criar estratégias bem-sucedidas, não basta organização, é preciso desenvolver tecnologia de informática, softwares e algoritmos.

“Na área de business intelligence, trabalhamos com o conceito de ciclo da informação: a coleta do dado, sua análise e a produção de conhecimento”, resume Araújo. Um exemplo são os sites de e-commerce, como o submarino. com. Baseada em um banco de dados de seus clientes, que inclui o histórico de navegação no site, a empresa faz ofertas personalizadas de produtos e propagandas direcionadas.

“Hoje, já existem algoritmos capazes de determinar se em uma simples postagem de foto em uma rede social a pessoa estava feliz, com raiva, triste ou neutra”, explica Araújo. No futuro, o desenvolvimento deles poderá converter informação descartada em valor.