O pior junho em 13 anos, em termos de queimadas na Amazônia, foi o de 2020, informou o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Segundo os dados divulgados ontem (1º de julho), foram registrados 2.248 focos de incêndio na região. É um aumento de 19,6% em comparação a junho de 2019, quando foram registrados 1.880 focos.

De acordo com os números do Inpe, a média histórica para junho na Amazônia, nos últimos 21 anos, é de 2.724 focos de queimadas. Embora o número de junho de 2020 seja 17% menor do que essa média, a região não registrava mais de 2 mil focos desde 2007, quando houve 3.519 focos de incêndio.

O aumento é um revés para a estratégia divulgada pelo governo do presidente Jair Bolsonaro de combate às queimadas na região, após uma onda internacional de críticas provocada pelos incêndios de agosto do ano passado. Bolsonaro, vale lembrar, defende a exploração dos recursos naturais da Amazônia, inclusive aqueles localizados em terras indígenas.

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Falta de prioridade

Em fevereiro deste ano, o controle das ações sobre desmatamento na Amazônia foi transferido do Ministério do Meio Ambiente para o Conselho Nacional da Amazônia, sob o comando do vice-presidente Hamilton Mourão. Isso, porém, não significou medidas concretas de enfrentamento ao problema. Em vez disso, continuaram a eclodir amostras de que o combate ao desmatamento e às queimadas não é encarado como prioridade pelo governo.

Um exemplo contundente disso está no vídeo da icônica reunião ministerial de 22 de abril. Na ocasião, o ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente, propôs que o governo aproveitasse a preocupação geral com a pandemia para “passar a boiada”, promovendo a desregulamentação e a simplificação do regramento de proteção ambiental em vigor. Outro é a série de obstáculos impostos à atuação de órgãos ambientais que atuam de forma estratégica, com severa diminuição de autonomia, orçamento e pessoal.

Junho é apenas o início da temporada de seca na Amazônia, e os números registrados aumentam o temor sobre o que está vindo a seguir. (O pior mês de 2019 foi agosto, quando foram registrados 30.901 focos de queimadas, recorde desde 2006.) “Com o início da temporada seca e com o fogo batendo à porta, o quadro que vem se desenhando é catastrófico em muitos sentidos. Tanto pela quantidade de árvores que estão sendo tombadas por conta dos incêndios, o que pode levar à morte animais e colocar em risco uma riquíssima biodiversidade, como pelo agravamento da vulnerabilidade das populações da Amazônia à covid-19”, disse Rômulo Batista, da campanha Amazônia do Greenpeace Brasil.

Investimentos ameaçados

No dia 23 de junho, um grupo de 30 investidores internacionais, responsáveis por uma carteira de mais de US$ 4,1 trilhões, enviou uma carta às embaixadas do Brasil nos EUA, no Reino Unido, na Holanda, na França, na Noruega e na Suécia, solicitando reuniões com os embaixadores para discutir as políticas ambientais do Brasil. O grupo, integrado por fundos da Europa, dos EUA e da Ásia, é liderado pela norueguesa Storebrand e conta com o apoio de fundos como o Legal and General Investment Management (LGIM), do Reino Unido, o Sumitomo Mitsui Trust Asset Management, do Japão, e o NN Invesment Partners, da Holanda.

Trata-se da primeira vez que investidores pedem formalmente um diálogo com representantes do governo brasileiro sobre assuntos internos do país. Em 2019, a maioria dos signatários da carta já havia integrado um grupo maior, de 251 investidores, que expressou preocupação com a crise das queimadas na Amazônia. O pedido de conversa pode preceder o desinvestimento no país, que teria impacto para exportações brasileiras e para a geração de empregos num momento difícil para a economia nacional.

“Queremos continuar investindo no Brasil e ajudar a mostrar que o desenvolvimento econômico e a proteção do meio ambiente não precisam ser mutuamente excludentes. Portanto, instamos o governo do Brasil a demonstrar um claro compromisso com a eliminação do desmatamento e a proteção dos direitos dos povos indígenas”, disse a Storebrand em nome do grupo.