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No mapa, a Península do Yucatán é um apêndice a destoar do istmo que liga as Américas do Norte e do Sul. Esse território basicamente mexicano (com áreas menores no sul pertencentes a Belize e Guatemala), isolado e distante da capital do país, passou muito tempo esquecido pelo poder central, até que grandes empreendimentos turísticos realizados a partir dos anos 1970 na sua parte nordeste, onde está Cancún, impulsionaram-no decisivamente para o desenvolvimento econômico. Mas o Yucatán está muito longe de ser apenas sol, praias e um mar paradisíaco.

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Em seu portfólio de atrações destacam-se preciosidades arqueológicas da civilização maia e cidades em que o patrimônio colonial espanhol conserva todo seu esplendor. Diferentemente do México central, cortado por cadeias montanhosas que seguem pelo istmo, esse território de cerca de 145 mil km2 (pouco menor que o Ceará) é praticamente todo plano e não tem rios – a água potável vem de piscinas naturais formadas pela água da chuva, conhecidas como cenotes (veja abaixo em “Piscinas sagradas”).

O relevo sem obstáculos relevantes facilitou a vinda dos maias, cujos primeiros vestígios apareceram na península por volta de 1500 a.C. Entre os anos 700 e 1000, esse povo mesoamericano construiu ali alguns de seus núcleos mais importantes, como Chichén Itzá e Uxmal. Os espanhóis chegaram no início do século 16 e, aproveitando-se de conflitos internos entre as cidades maias, tomaram conta das terras. Os antigos donos foram relegados a uma condição de semi-escravidão, quadro que persistiu após a independência mexicana e motivou revoltas em 1847 e nos anos 1920 e 1930.

O Yucatán tinha pouca importância econômica para o México, sobretudo sua porção oriental, ocupada pelo então território de Quintana Roo. Sem recursos minerais ou terras férteis, a península era ocupada sobretudo por fazendas de criação de gado, plantações de milho, agave e chicle (a árvore da goma de mascar). Nos anos 1970, porém, o estado de Campeche, no lado oeste da península (ocupada, além dele e de Quintana Roo, pelo estado de Yucatán, no norte), foi sacudido pela descoberta de petróleo.

Já em Quintana Roo, promovido a estado em 1974, ocorreu uma mudança tão ou mais importante do que a de Campeche: com investimentos públicos e privados, começou-se a construir em Cancún grandes resorts, aproveitando-se das condições especiais de seu litoral – praias de areia clara, águas mornas de cor turquesa e a quinta maior barreira de corais do mundo. O sucesso internacional dos empreendimentos também atraiu atenção para locais próximos, como Cozumel, Isla Mujeres e Playa del Carmen, e projetou para o mundo o trecho costeiro entre Cancún e o sítio arqueológico de Tulum, conhecido como Riviera Maya.

A herança espanhola

A explosão do turismo a partir de Cancún – Quintana Roo é atual­mente o estado que mais arrecada com esse setor da economia em todo o México – acabou por viabilizar também a visitação mais intensiva aos centros ar­queológicos na península e a outras atrações. Estradas de boa qualidade cortam o Yucatán, facilitando o trânsito por todos esses lugares. O principal exemplo urbano da colonização espanhola é Mérida, capital do estado de Yucatán, situada no noroeste da península. Fundada em 1542 onde antes ficava o núcleo maia de Ichcaanzihó, é a cidade grande do México com maior presença de índios (cerca de 60% da população).

Capital Americana da Cultura de 2000 e 2017, Mérida possui um importante patrimônio histórico, mostrado na arquitetura e no urbanismo, e uma intensa vida cultural, manifesta em diversos museus, universidades, teatros, galerias de arte e restaurantes que servem uma conceituada culinária regional. Outra bela amostra da herança espanhola é Campeche, capital do estado homônimo. A cidade foi fundada em 1540 às margens da Baía de Campeche, no local onde havia o núcleo maia de Can Pech. Patrimônio Cultural da Humanidade desde 1999, graças à ótima preservação e qualidade da sua arquitetura, Campeche é uma das poucas cidades amuralhadas das Américas (e a única no México).

Em suas ruas há mais de mil edifícios de valor histórico, como a catedral e os sistemas de fortificação contra invasores. Mas a maior riqueza do Yucatán são seus mais de 20 sítios arqueo­lógicos de importância, exemplos marcantes da sofisticada cultura maia que dominou aquelas terras no passado. O mais conhecido é Chichén Itzá, situado a cerca de 120 km a leste de Mérida, que foi fundado por volta de 600 d.C. Sítio do Patrimônio Mundial da Unesco e eleita em 2007 uma das novas Sete Maravilhas do Mundo, a cidade, de 15 km2, exibe uma variedade de estilos arquitetônicos também presente no México central, um aspecto atribuído à diversidade populacional que deve tê-la caracterizado.

Principal centro comercial e financeiro da península, Chichén Itzá atingiu seu auge no século 10, quando foi tomada por um rei tolteca (povo predecessor dos astecas), Topiltzin, com o apoio de tropas maias, e entrou em decadência por volta de 1200. Estão ali algumas das construções mais famosas da Mesoamérica, como a pirâmide El Castillo (templo do deus Kukulkán, a Serpente Emplumada), de 30 metros de altura, o templo-observatório El Caracol, o Templo dos Guerreiros e um campo do jogo da bola praticado pelos maias.

Patrimônio mundial

Uxmal, pouco mais de 80 km ao sul de Mérida, também vale uma demorada visita. Também sítio do Patrimônio Mundial da Unesco, ela foi fundada em 500 d.C. e viveu seu apogeu entre 700 e 1000, época em que todos os seus edifícios importantes foram erguidos. A cidade entrou em decadência após o ano 1200 e só voltou a atrair atenção com a independência do México, no século 19. Entre as edificações, destacam-se a Pirâmide do Adivinho, construção com cinco andares e 35 metros de altura, o amplo (mais de 1.200 m2 de área) Palácio do Governador e o Quadrilátero das Monjas, plataforma quadrada de 120 metros de lado em volta da qual havia edificações com vários aposentos que se abriam para o pátio.

Tulum, 131 km ao sul de Cancún, é o maior reduto maia no litoral caribenho e uma das últimas cidades erguidas por esse povo na península. Fundada por volta de 560 d.C. como porto de outra cidade maia, Cobá, ela viveu seu ápice entre 1200 e 1450 e ainda sobreviveu por 70 anos após a chegada dos espanhóis. Tulum tem como diferencial suas muralhas de quatro metros de altura, erguidas em função da instabilidade política entre os diversos clãs maias na época. Tal como em Chichén Itzá, ela apresenta amostras de diferentes estilos arquitetônicos. Sua principal estrutura, com 7,5 metros de altura também leva o nome de El Castillo. Próximas dela estão o Templo dos Afrescos, usado como observatório, e o Templo do Deus Descendente (associado ao planeta Vênus).

A proximidade entre sítios arqueológicos e uma natureza ameaçada por um desenvolvimento sem freios deu origem a um filão turístico característico do Yucatán: o ecoturismo arqueo­lógico. Em parques como Xcaret e Xel-Há, na região de Cancún, pode-se não só nadar com golfinhos, mergulhar na companhia de centenas de peixes tropicais e conhecer por dentro um cenote, mas também ver animais nativos em seu habitat e visitar ruí­nas arqueológicas conservadas. Os próprios administradores dos empreendimentos zelam pela preservação de todos esses detalhes – um cuidado que deveria fazer mais seguidores mundo afora.


Piscinas sagradas

Cenote de Ik Kil, perto de Chichén Itzá (Foto: iStock)

Carente de rios, a Península de Yucatán encontra nos cenotes sua principal opção de água potável. Características de áreas nas quais as rochas calcárias são dissolvidas por processos químicos, essas piscinas naturais – as maiores das quais têm diâmetro superior a dez metros – acumulam água de chuva filtrada lentamente através do solo e têm sido fundamentais para a região ao longo da história. Os grandes núcleos urbanos maias, por exemplo, sempre estavam associados a elas.

Para esse povo, a importância dos cenotes ia além do simples abastecimento: suas águas serviam de portais para a vida pós-morte. Lendas locais falavam de um culto do cenote, que envolvia sacrifícios humanos a Chaac, deus da chuva, e na primeira metade do século 20 arqueólogos encontraram em algumas dessas piscinas artefatos dourados que reforçaram a ideia. A dragagem do Cenote Sagrado de Chichén Itzá, em 1904, revelou esqueletos humanos e objetos sacrificiais no local.


Exterminador de dinossauros

A Cratera de Chicxulub, situada no noroeste do Yucatán, ficou famosa por estar associada ao desaparecimento dos dinossauros, há 65 milhões de anos. Na verdade, apenas a parte menor dela pode ser vista em terra; o resto está sob o mar. O centro fica próximo ao povoado que lhe deu o nome. Com mais de 180 km de diâmetro, Chicxulub é uma das maiores crateras de impacto do mundo, tão grande que só foi descoberta a partir de pesquisas da empresa petrolífera mexicana Pemex realizadas no fim dos anos 1970.

Os estudos da área revelaram que sua estrutura geológica inclui a presença de elementos como quartzo de impacto (diferente do normal), tectito e irídio (metal raro na Terra), todos associados a choques de meteoritos e asteroides contra o solo. Estima-se que o corpo que abriu a cratera – possivelmente parte de um asteroide bem maior que se fragmentou – tinha pelo menos 10 km de diâmetro.