Cem mil pessoas assistiram à cerimônia de consagração transformando o evento numa afirmação expressa da identidade tibetana.

 

No dia 27 de julho, o monastério Denma Gonsar Rimpoche amanheceu cercado por centenas de tendas, com devotos vindos de diversas regiões (foto 1). A sagração do 20o. lama suscitou forte interesse popular, intensificando a religiosidade tibetana. Nesse mesmo dia, o menino Tsering Dorje chegou de avião ao aeroporto de Yushu, protegido por monges e lamas (2). Seguindo a orientação de oráculos, os monges procuraram durante um ano a reencarnação de Denma Gonsar Rimpoche na cidade de Chatreng. Além de sinais divinos, encontraram na testa de Tsering Dorje as marcas do Sol e da Lua, símbolos da sabedoria e da compaixão, respectivamente. Já na estrada para o monastério, os devotos se comprimiam para assistir à chegada de lamas famosos (3) e exibiam medalhas do falecido 19o. Denma Gonsar Rimpoche (4). Na hierarquia das quatro linhagens do budismo tibetano, os principais lamas são o Dalai Lama (atualmente na 14ª encarnação, exilado na Índia) e o Panchen Lama (hoje na 11ª encarnação, residente em Beijing). Os lamas, ou gurus, são os “professores do dharma”, os guias do caminho espiritual do budismo tibetano. 

Após a sagração como 20o lama Denma Gonsar Rimpoche, Tsering Dorje desfilou sob a proteção de lamas e de policiais chineses (5). Para os monges jovens e adultos essa foi a primeira oportunidade para ver o novo mestre (6). Em volta do monastério, milhares celebravam o evento. Muitos giravam a “roda de oração” que contém orações e mantras impressos (7). Cada rotação equivale à recitação de um mantra e permite a acumulação de créditos para evitar sofrimentos em vidas futuras. Mulheres aproveitavam para lavar roupas (8) enquanto nas tendas bebia-se o chá tradicional, feito de leite, sal e manteiga (9). Para todas as famílias, a cerimônia exigiu a exibição das melhores roupas e adornos (10).

 

Batalha das almas

Em 1o. de outubro de 1949, Mao Tsé-tung proclamou a República Popular da China, após quatro anos de revolução. No vizinho Tibete – um país com longa história de influência chinesa –, vigorava um sistema teocrático feudal que convivia com a escravidão. Durante dez anos os tibetanos resistiram às reformas socialistas. Em 1959, o governo chinês invadiu o país. Mais de 87 mil pessoas fugiram para a Índia, entre eles o 140 Dalai Lama. Entretanto, o 100 Panchen Lama ficou no país, resistiu à Revolução Cultural (1966- 1976) e criou as bases para o desenvolvimento da cultura, da língua e da religião tibetanas. Após sua morte em 1989, seguindo suas próprias indicações, os monges do monastério Tashi- Lhumpo encontraram a sua 11a. reencarnacão, o menino de 6 anos, Gedun Choky. Atualmente com 25 anos, o 110 Panchen Lama vive entre Beijing e Tashi-Lhumpo.