Grande parte da frágil crosta superior de Vênus é quebrada em fragmentos que se acotovelam e se movem – e a lenta agitação do manto venusiano sob a superfície pode ser a responsável. Meus colegas e eu chegamos a essa descoberta usando dados de radar de décadas para explorar como a superfície de Vênus interage com o interior do planeta. Nós a descrevemos em um novo estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences em 21 de junho de 2021.

Cientistas planetários como eu sabem há muito tempo que Vênus tem uma infinidade de formas de relevo tectônicas. Algumas dessas formações são faixas de terra longas e finas, onde a crosta foi pressionada para formar cristas ou separada para formar depressões e sulcos. Em muitas dessas faixas, há evidências de que pedaços da crosta também se moveram de um lado para o outro.

Escala menor

Nosso novo estudo mostra, pela primeira vez, que essas faixas de cristas e vales muitas vezes marcam os limites de áreas planas e baixas que apresentam relativamente pouca deformação e são blocos individuais da crosta de Vênus que se deslocaram, giraram e deslizaram uns pelos outros ao longo do tempo – e podem ter feito isso no passado recente. É um pouco como as placas tectônicas da Terra, mas em uma escala menor, e o fenômeno mais se assemelha ao gelo que flutua sobre o oceano.

A crosta de Vênus é fraturada em grandes pedaços que se comportam mais como pedaços de gelo flutuando no oceano. Crédito: Endlisnis/Wikimedia Commons, CC BY
Onde pedaços de gelo colidem, o gelo é empurrado para cima para criar cristas muito parecidas com o que os pesquisadores acham que acontece em Vênus. Crédito: Ben Holt e Susan Digby/Wikimedia Commons

Os pesquisadores levantaram a hipótese de que – assim como o manto da Terra – o manto de Vênus gira com as correntes enquanto é aquecido de baixo para cima. Meus colegas e eu modelamos o movimento lento, mas poderoso, do manto de Vênus e mostramos que ele é suficientemente forte para fragmentar a crosta superior em todos os lugares em que encontramos esses blocos de planície.

Por que isso importa

Uma grande questão sobre Vênus é se o planeta tem vulcões ativos e falhas tectônicas hoje. Ele tem essencialmente o mesmo tamanho, composição e idade da Terra. Então, por que não estaria geologicamente vivo?

Mas nenhuma missão a Vênus ainda mostrou de forma conclusiva que o planeta está ativo. Há evidências tentadoras, mas inconclusivas, de que erupções vulcânicas ocorreram lá no passado geologicamente recente – e talvez até estejam em andamento. O caso da atividade tectônica – o ranger, quebrar e dobrar a crosta do planeta – é ainda menos sólido.

Mas nenhuma missão a Vênus ainda mostrou de forma conclusiva que o planeta está ativo. Há evidências tentadoras, mas inconclusivas, de que erupções vulcânicas ocorreram lá no passado geologicamente recente – e talvez até estejam em andamento. O caso da atividade tectônica – o processo de ranger, quebrar e dobrar a crosta do planeta – é ainda menos sólido.

Mostrar que o motor geológico de Vênus ainda está funcionando teria enormes implicações para a compreensão da composição do manto do planeta, onde e como o vulcanismo pode estar ocorrendo hoje e como a própria crosta é formada, destruída e substituída. Como nosso estudo sugere que parte desse empurrão da crosta é geologicamente recente, podemos ter dado um grande passo à frente para entender se Vênus realmente está ativo hoje.

O que ainda não se sabe

Não está claro como esses fragmentos da crosta estão espalhados. Meus colegas e eu encontramos 58 até agora, mas essa é quase certamente uma estimativa baixa.

Também não sabemos quando esses blocos de crosta se formaram pela primeira vez, nem há quanto tempo eles se movem em Vênus. Determinar quando a fragmentação da crosta e os empurrões ocorreram é fundamental – especialmente se os cientistas planetários quiserem entender esse fenômeno em relação à suspeita de atividade vulcânica recente do planeta. Descobrir isso nos daria informações vitais sobre como as características da superfície do planeta refletem a turbulência geológica interna.

O maior bloco de planícies que a equipe encontrou – a forma vermelha escura no centro desta imagem de radar – tem o tamanho do Alasca (pouco mais de 1,7 milhão de quilômetros quadrados) e está rodeado por cristas e deformações que aparecem como cores mais claras. Crédito: Paul K. Byrne/Nasa/USGS, CC BY-ND
Próximo passo

Este estudo inicial permitiu que meus colegas e eu fizéssemos nosso melhor palpite sobre como as vastas planícies de Vênus foram deformadas, mas precisamos de imagens de radar de resolução muito mais alta e dados topográficos para desenvolver este trabalho. Felizmente, é exatamente isso que os cientistas obterão nos próximos anos, com a Nasa e a Agência Espacial Europeia (ESA) anunciando recentemente novas missões com destino a Vênus no final desta década. Valerá a pena esperar para entender melhor o enigmático vizinho da Terra.

* Paul K. Byrne é professor associado de Ciências Planetárias da Universidade Estadual da Carolina do Norte (EUA).

** Este artigo foi republicado do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original aqui.