A água é essencial para a vida na Terra e em outros planetas, e os cientistas encontraram ampla evidência de água no início da história de Marte. Mas Marte não tem água líquida em sua superfície hoje. Uma nova pesquisa da Universidade Washington em St. Louis (EUA) sugere uma razão fundamental: Marte pode ser pequeno demais para reter grandes quantidades de água.

Estudos de sensoriamento remoto e análises de meteoritos marcianos que datam da década de 1980 afirmam que Marte já foi rico em água, em comparação com a Terra. A espaçonave orbital Viking, da Nasa – e, mais recentemente, os rovers Curiosity e Perseverance no solo –, enviaram imagens dramáticas de paisagens marcianas marcadas por vales de rios e canais de inundação.

Apesar dessa evidência, nenhuma água líquida permanece na superfície. Os pesquisadores propuseram muitas explicações possíveis, incluindo um enfraquecimento do campo magnético de Marte que poderia ter resultado na perda de uma espessa atmosfera.

Destino decidido bem cedo

Mas um estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) sugere uma razão mais fundamental pela qual Marte de hoje parece tão drasticamente diferente da aparência “Blue Marble(a icônica foto de nosso planeta por inteiro, tirada em 1972 pela missão Apollo 17) da Terra.

“O destino de Marte foi decidido desde o início”, disse Kun Wang, professor assistente de ciências terrestres e planetárias em Artes e Ciências na Universidade Washington, autor sênior do estudo. “É provável que haja um limite nas exigências de tamanho dos planetas rochosos para reter água suficiente para permitir a habitabilidade e as placas tectônicas, com massa excedendo a de Marte.”

Para o novo estudo, Wang e seus colaboradores usaram isótopos estáveis ​​do elemento potássio (K) a fim de estimar a presença, distribuição e abundância de elementos voláteis em diferentes corpos planetários.

O potássio é um elemento moderadamente volátil, mas os cientistas decidiram usá-lo como uma espécie de marcador para elementos e compostos mais voláteis, como a água. Esse é um método relativamente novo que diverge das tentativas anteriores de usar as proporções de potássio para tório obtidas por sensoriamento remoto e análise química a fim de determinar a quantidade de elementos voláteis que Marte já teve. Em pesquisas anteriores, membros do grupo de pesquisa usaram um método marcador de potássio para estudar a formação da Lua.

Correlação definida

Wang e sua equipe mediram as composições de isótopos de potássio de 20 meteoritos marcianos previamente confirmados, selecionados para serem representativos da composição de silicato na massa do Planeta Vermelho.

Usando essa abordagem, os pesquisadores determinaram que Marte perdeu mais potássio e outros elementos voláteis do que a Terra durante sua formação, mas reteve mais desses elementos do que a Lua e o asteroide Vesta, dois corpos muito menores e mais secos do que a Terra e Marte.

Os pesquisadores descobriram uma correlação bem definida entre o tamanho do corpo e a composição isotópica do potássio.

“A razão para abundâncias muito menores de elementos voláteis e seus compostos em planetas diferenciados do que em meteoritos primitivos indiferenciados tem sido uma questão de longa data”, disse Katharina Lodders, professora pesquisadora de ciências terrestres e planetárias da Universidade Washington e coautora do estudo. “A descoberta da correlação das composições isotópicas de potássio com a gravidade do planeta é uma nova descoberta com importantes implicações quantitativas para quando e como os planetas diferenciados receberam e perderam seus elementos voláteis.”

Implicações para a busca de vida

Meteoritos marcianos são as únicas amostras disponíveis para estudarmos a composição química da massa de Marte”, disse Wang. “Esses meteoritos marcianos têm idades variando de várias centenas de milhões a 4 bilhões de anos e registraram a história da evolução volátil de Marte. Medindo os isótopos de elementos moderadamente voláteis, como o potássio, podemos inferir o grau de esgotamento volátil da massa de planetas e fazer comparações entre diferentes corpos do Sistema Solar.”

Wang prosseguiu: “É indiscutível que costumava haver água líquida na superfície de Marte, mas a quantidade de água no total que o planeta já teve é ​​difícil de quantificar apenas por sensoriamento remoto e estudos de rover. (…) Existem muitos modelos por aí para o conteúdo de água na massa de Marte. Em alguns deles, o início de Marte era ainda mais úmido do que a Terra. Não acreditamos que tenha sido esse o caso”.

As descobertas têm implicações para a busca de vida em outros planetas além de Marte, observaram os pesquisadores.

Estar muito perto do Sol (ou, para exoplanetas, estar muito perto de sua estrela) pode afetar a quantidade de elementos voláteis que um corpo planetário pode reter. Essa medida de distância da estrela é frequentemente fatorada em índices de “zonas habitáveis” ao redor das estrelas.

Tamanho e massa como base

“Este estudo enfatiza que há uma faixa de tamanho muito limitada para os planetas terem apenas o suficiente, mas não muita água para desenvolver um ambiente de superfície habitável”, disse Klaus Mezger, do Centro para Espaço e Habitabilidade da Universidade de Berna (Suíça), outro coautor do estudo. “Esses resultados irão guiar os astrônomos em sua busca por exoplanetas habitáveis ​​em outros sistemas solares.”

Wang agora pensa que, para planetas que estão dentro de zonas habitáveis, o tamanho do planeta provavelmente deveria ser mais enfatizado e rotineiramente considerado ao se pensar se um exoplaneta poderia suportar vida.

“O tamanho de um exoplaneta é um dos parâmetros mais fáceis de determinar”, disse Wang. “Com base no tamanho e na massa, agora sabemos se um exoplaneta é um candidato à vida, porque um fator determinante de primeira ordem para a retenção de elementos voláteis é o tamanho.”