Assim como a Lua se distancia um pouco mais da Terra a cada ano, outros satélites fazem o mesmo com seus planetas hospedeiros. À medida que uma lua orbita, sua gravidade atrai o planeta, causando uma protuberância temporária no planeta à medida que passa. Com o tempo, a energia criada pelo abaulamento e pelo afundamento se transfere do planeta para a lua, empurrando-a cada vez mais longe. Nossa Lua se afasta 3,8 centímetros da Terra a cada ano.

Os cientistas pensavam conhecer a velocidade com que a lua gigante Titã está se distanciando de Saturno. Recentemente, porém, eles fizeram uma descoberta assombrosa: usando dados da sonda Cassini, da Nasa, eles verificaram que Titã se afasta cem vezes mais rápido de Saturno do que se pensava antes – cerca de 11 centímetros por ano.

Os dados podem ajudar a resolver uma questão antiga. Embora os cientistas saibam que Saturno se formou 4,6 bilhões de anos atrás, nos primeiros dias do Sistema Solar, há mais incerteza sobre quando os anéis do planeta e seu sistema de mais de 80 luas se formaram.

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Atualmente, Titã está a 1,2 milhão de quilômetros de Saturno. A taxa revisada de sua deriva sugere que a lua começou muito mais perto de Saturno, o que significaria que todo o sistema se expandiu mais rapidamente do que se acreditava anteriormente.

Migração explicada

“Este resultado traz uma nova e importante peça do quebra-cabeça para a questão altamente debatida da era do sistema de Saturno e como suas luas se formaram”, disse Valéry Lainey, principal autor do trabalho publicado na revista “Nature Astronomy”. Ele conduziu a pesquisa como cientista no Laboratório de Propulsão a Jato (JPL, na sigla em inglês) da Nasa antes de ingressar no Observatório de Paris da Universidade PSL.

As descobertas sobre a taxa de deriva de Titã também fornecem confirmação importante de uma nova teoria que explica e prevê como os planetas afetam as órbitas de suas luas.

Nos últimos 50 anos, os cientistas aplicaram as mesmas fórmulas para estimar a velocidade com que a lua se afasta de seu planeta, uma taxa que também pode ser usada para determinar a idade da lua. Essas fórmulas e as teorias clássicas nas quais se baseiam foram aplicadas a luas grandes e pequenas em todo o Sistema Solar. As teorias supunham que em sistemas como o de Saturno, com dezenas de luas, as luas exteriores como Titã migraram para fora mais lentamente do que as luas mais próximas porque estão mais afastadas da gravidade do planeta hospedeiro.

Há quatro anos, o astrofísico teórico Jim Fuller, agora do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), publicou uma pesquisa que derrubou essas teorias. A teoria de Fuller previa que as luas externas podem migrar para fora a uma taxa semelhante à das luas internas porque ficam presas em um tipo diferente de padrão de órbita que se liga à oscilação específica de um planeta e as lança para fora.

Mapeamento de estrelas

“As novas medidas sugerem que esse tipo de interação planeta-lua pode ser mais proeminente do que as expectativas anteriores e que ele pode ser aplicado a muitos sistemas, como outros sistemas planetas-luas, exoplanetas – aqueles fora do Sistema Solar – e até sistemas de estrelas binárias, em que as estrelas orbitam umas às outras”, disse Fuller, coautor do novo artigo.

Para alcançarem seus resultados, os autores mapearam estrelas no fundo das imagens da Cassini e rastrearam a posição de Titã. Eles depois compararam suas descobertas com um conjunto de dados independente: os dados científicos de rádio coletados pela Cassini. Durante dez sobrevoos próximos entre 2006 e 2016, a sonda enviou ondas de rádio para a Terra. Os cientistas estudaram como a frequência do sinal foi alterada por suas interações com o ambiente ao redor para estimar como a órbita de Titã evoluiu.

“Usando dois conjuntos de dados completamente diferentes, obtivemos resultados totalmente de acordo e também com a teoria de Jim Fuller, que previa uma migração muito mais rápida de Titã”, disse o coautor Paolo Tortora, da Universidade de Bolonha, na Itália.

Titã na órbita de Saturno: o satélite se afasta do planeta dos anéis muito mais rapidamente do que se imaginava. Crédito: Crédito: Nasa/JPL-Caltech/Space Science Institute