Cidade onde coronavírus foi descoberto e que foi a primeira no mundo a viver confinamento não registra novo caso desde maio. Cidadãos dizem que experiência traumática os tornou mais prudentes.Há um ano, um alerta enviado para smartphones em Wuhan às 2h anunciava o primeiro lockdown contra o coronavírus do mundo, levando, da noite para o dia, o movimentado centro industrial e de transporte da China central a viver uma virtual paralisação. O confinamento duraria 76 dias.

No início da manhã deste sábado (23/01), no entanto, os moradores da cidade onde o vírus foi detectado pela primeira vez corriam e praticavam tai chi em um parque envolto em nevoeiro ao lado do poderoso rio Yangtze.

A vida voltou em grande parte ao normal nesta cidade de 11 milhões de habitantes, mesmo enquanto o resto do mundo luta contra a propagação de variantes mais contagiosas do vírus. Esforços para vacinar pessoas contra a covid-19 têm sido frustrados pela desordem e suprimentos limitados em diversos lugares. A pandemia já matou mais de 2 milhões de pessoas em todo o mundo.

O trânsito corria tranquilo em Wuhan, em sinais das barreiras que um ano atrás isolaram bairros, impediram o movimento ao redor da cidade e confinou pessoas a seus conjuntos habitacionais e até mesmo apartamentos.

Wuhan foi responsável pela maior parte das 4.635 mortes na China por covid-19, um número que permaneceu praticamente estático por meses. A cidade está praticamente livre de novos surtos desde que o bloqueio foi suspenso em 8 de abril, mas persistem dúvidas sobre onde o vírus foi originado e se Wuhan e as autoridades chinesas agiram rápido o suficiente e com transparência suficiente para permitir que o mundo se preparasse para uma doença que infectou mais de 98 milhões.

“Cidade heróica”

Wuhan foi elogiada por seu sacrifício a serviço da nação, transformando-se em uma espécie de Stalingrado na guerra da China contra o vírus, celebrada em livros, documentários, programas de TV e elogios de autoridades, incluindo chefe de Estado e líder do Partido Comunista, Xi Jinping.

“Achamos que Wuhan é uma cidade heróica. Afinal, ela parou sua economia para ajudar a China a lidar com a pandemia. Este é um ato nobre'', diz Chen Jiali, 24, cidadão de Wuhan que trabalha em uma companhia de vendas pela internet.

“Eu me sinto completamente seguro. A situação está sob controle e já não tenho medo”, diz Li Wenfu, de 50 anos, com rosto coberto por uma máscara negra.

Ameaça continua

Embora Wuhan não tenha registrado novos casos desde maio, a ameaça do vírus continua. Nas últimas semanas, várias regiões chinesas decretaram confinamentos parciais. Pequim começou a examinar dois milhões de habitantes após alguns casos de covid-19, alguns da variante inglesa.

A China anunciou neste sábado mais 107 casos, elevando o seu total desde o início da pandemia para 88.911. Destes, a província norte de Heilongjiang respondeu pelo maior número, 56. Pequim e o centro financeiro Xangai relataram três novos casos em meio a testes em massa e confinamento de hospitais e conjuntos residenciais por causa de surtos recentes.

As autoridades estão preocupadas com o potencial de uma nova onda em torno feriado do Ano Novo Lunar do próximo mês e aconselham que as pessoas não viajem e evitem encontros, tanto quanto possível. Escolas estão fechadas para os feriados uma semana antes do previsto e muitas já mudaram para sistema de aulas online.

Trauma trouxe consciência

O uso da máscara permanece virtualmente universal em ambientes internos e de transporte público. Aplicativos de celular são usados ​​para rastrear os movimentos das pessoas e assegurar que elas estão livres de vírus e não estiveram em áreas onde casos suspeitos foram reportados.

Desde o fim do bloqueio, Wuhan foi amplamente poupada de outros surtos, algo que residentes da cidade, como o professor de química Yao Dongyu, de 24 anos, atribui ao aumento da consciência resultante da traumática experiência do ano passado. “Naquela época, as pessoas estavam muito nervosas, mas o governo nos deu um grande apoio. Foi uma garantia muito poderosa, então passamos isso juntos”, diz. “Desde que as pessoas de Wuhan enfrentaram a pandemia, elas atentaram mais para precauções pessoais do que as pessoas em outras regiões.”

A China tem defendido obstinadamente suas ações nos primeiros dias do surto, dizendo que ajudou a ganhar tempo para o resto do mundo enquanto lança teorias de que o vírus foi trazido para a cidade de fora da China, possivelmente de um laboratório nos EUA.

Após meses de negociações, a China finalmente deu permissão na semana passada para a Organização Mundial da Saúde enviar uma equipe de especialistas internacionais para começar a investigar as origens do vírus. Eles estão atualmente em quarentena por duas semanas.

Um painel de especialistas formado pela OMS criticou a China e outros países esta semana por não se moverem para conter o surto inicial antes, levando Pequim a admitir que poderia ter feito melhor.

Lockdown em Hong Kong

Enquanto isso, em Hong Kong, um lockdown bloqueia milhares de residentes neste sábado em uma ação sem precedentes para conter um agravamento do surto na cidade.

Hong Kong tem se esforçado para conter uma nova onda de coronavírus desde novembro. Mais de 4.300 casos foram registrados nos últimos dois meses, representando quase 40% do total da cidade.

As autoridades disseram em um comunicado que uma área residencial de classe baixa que compreende 16 prédios no distrito de Yau Tsim Mong será isolada até que todos os residentes tenham sido testados.

MD/afp/ap